20 anos depois da transferência da administração de Portugal, de Macau, para a soberania da República Popular da China¹, como convive hoje a língua portuguesa com os idiomas mais falados no território: do patoá – também chamado "chinês das amas, língua de Macau ou língua macaísta² – ao mandarim e ao cantonês, além do inglês?
Em Macau, são línguas oficiais o mandarim, que partilha com o restante território chinês, e o português, mas, na realidade, os macaenses falam o cantonês, idioma que é também o de Hong Kong. É o cantonês que prevalece em placas de informação, nos comunicados oficiais e na comunicação social, a par da língua portuguesa. Para contrariar esta situação, o Governo tem fomentado o ensino e a aprendizagem do mandarim, que, pese a sua dissemelhança com o cantonês, a maioria da população julga dominar. Há ainda uma pequena percentagem da macaenses que falam patoá, que é um crioulo outrora usado como linguagem familiar e na comunicação diária entre chineses e macaenses e também pelos escravos africanos e asiáticos. Este crioulo conserva em si vocabulário de origem portuguesa, nomeadamente bicho-mel («abelha»), choncá/choncar («chocar, embater» – derivação híbrida do cantonês ch'ong com o sufixo português -ar) ou almis (o mesmo que almiscarado).
Não obstante os 20 anos de administração chinesa, o português continua a ter importância no território. Se, nos primeiros dez anos, se assistiu a uma diminuição na procura da aprendizagem desta língua, o fenómeno tem-se invertido mais recentemente, pois o ensino do português cresceu não só no ensino superior, onde a procura é mais significativa – em 1999/2000 havia cerca de 300 cursos lecionados em português, e atualmente são cerca de 1500 –, mas também nos ensinos primário e secundário, onde duplicaram as escolas com oferta de português – em 1999/2000 eram cerca de 28, e atualmente são 51. Paralelamente, o número de docentes que lecionam em língua portuguesa também registou crescimento significativo. Além disso, intensificou-se o intercâmbio de estudantes que partem para Portugal, maioritariamente, para aperfeiçoar a língua.
Apesar de a dinâmica de aprendizagem do português ser mais visível no território de Macau, o fenómeno estendeu-se a toda a China, que tem cada vez mais universidades com oferta formativa de língua portuguesa e incentivos para a deslocação de estudantes a Portugal. Esta procura crescente, embora devida à herança cultural de Portugal, prende-se fundamentalmente com fatores profissionais e económicas, dado o português impulsionar a entrada no mercado de trabalho em diversas áreas, nomeadamente nos serviços administrativos da região de Macau.
¹ O acordo entre Portugal e a China para a transferência de Macau foi assinado em 13 de abril de 1987, ficando concretizada no dia 20 de dezembro de 1999.
² in Língua de Macau – o que foi e o que é (livro da autoria da filóloga Graciete Nogueira Batalha (1925-1992), condensando um série de 11 artigos publicados originalmente no jornal "Notícias de Macau", de 25 de Maio a 24 de Agosto de 1958).
Cf. O patoá de Macau, uma língua em risco + Língua portuguesa é hoje mais falada em Macau e irá permanecer após 2049 + Instituto Português do Oriente arranca com 1300 alunos» + A língua falada por 27 vezes mais gente do que o país que a inventou + Língua de Macau: o que foi e o que é + Macau: o que fazer com a herança portuguesa? + 20 anos de Macau chinesa: a cidade apolítica, “o sonho de qualquer ditador” + Lusa Macau 20 anos + Portugueses foram os primeiros lusófonos a instalar-se em Macau + Os primeiros portugueses em Macau + China-Macau + Último governador português de Macau. + "Macau sâm assi" + Em Macau, China vê modelo a ser seguido por Hong Kong + Qual é a língua mais falada em Macau?