1. Em Portugal, por precipitação, descaso ou ignorância, acumulam-se perigosos sinais de descuido no que se escreve no espaço público. O Pelourinho regista duas situações críticas. Primeiro, a de um concurso televisivo, novamente aqui mencionado num texto de Sara Mourato, desta vez, por causa de uma questão ortográfica que não deveria gerar dúvidas: a dos nomes compostos que denotam espécies botânicas e zoológicas, sempre hifenizados. A segunda é abordada num apontamento de Carla Marques e centra-se no cartaz na apresentação pública da candidatura de um político português à Presidência da República: os erros detetados são incompatíveis com um processo eleitoral sério.
2. Há mais de três décadas, na voz de António Variações (1944-1984), ouvia-se na rádio ou na televisão portuguesas um estribilho que ao som de música rock dizia assim : «toma o comprimido, que isso passa». Mas, se a ordem do trepidante criador português fosse «"bebe" o comprimido», estaria ele a cometer um claro erro de impropriedade vocabular? A interrogação vem a propósito de uma das perguntas da presente atualização do Consultório, no qual são igual motivo de dúvida o regionalismo «de enxotão» e a história fonética do possessivo nosso. Realce ainda para duas questões sobre advérbios que contribuem para a coesão do discurso: como se analisa gramaticalmente a associação de um advérbio e uma conjunção como «também porque»? E como classificar justamente na sequência «justamente porque»?
3. Em contexto escolar, em Portugal e não só, os cursos de Ciências e Tecnologias do ensino secundário têm um tratamento diferente dos de Línguas e Humanidades do mesmo ciclo de estudos. Na rubrica Ensino, transcreve-se, com a devida vénia, do blogue da historiadora Raquel Varela, um texto intitulado "A excelência das Letras", no qual esta autora lamenta atitudes que denunciam uma menorização das Humanidades no ensino – e deixa um aviso: «Este desequilíbrio de fazer das ciências sociais e humanas o parente pobre vai pagar-se caro no futuro, é uma coisa, aliás, de um país atrasado, sem estratégia autónoma. E todos vamos pagar caro, quer os de ciências quer os de letras.»
4. Entre obras editadas nos últimos meses com interesse para uma visão da língua como fator de comunicação intercultural, são de realçar:
– O livro Alin-mane: Lusofonia e Cooperação na Área Educacional em Timor-Leste, organizado por Valdir Lamim-Guedes e Carlos Gontijo Rosa e sob a chancela da editora brasileira Na Raiz. Esta obra, disponível em formato eletrónico, dá conta da participação de um grupo de educadores brasileiros na atividade da Universidade Nacional de Timor-Leste, localizada em Díli, a capital timorense, no ano de 2012.
– A publicação de As Literaturas em Língua Portuguesa (Das Origens aos Nossos Dias), da autoria do professor José Carlos Seabra Pereira (Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra) e editado pela Gradiva com o apoio do Instituto Politécnico de Macau e do Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos. O volume vai ser apresentado, em 11 de março de 2020, na Livraria Buchholz, em Lisboa, pelo poeta e crítico literário Pedro Mexia e pelo académico e ensaísta António Feijó.
5. Mudando de tom e aflorando o debate contemporâneo* à volta da linguagem preconceituosa e de estratégias para a evitar, fica o registo do vídeo que adiante se mostra – "Aprendendo português sem palavras preconceituosas":
* Cf. "Da minha língua vê-se o preconceito", "A linguagem do ódio", "Palavras carregadas de preconceitos e tabus", "10 expressões racistas que deveríamos tirar do nosso vocabulário", "'Machista' e 'heteropatriarcal' a língua portuguesa?". Ler também Margarita Correia, "A discriminação racial nos dicionários de língua: tópicos para discussão, a partir de dicionários portugueses contemporâneos", Alfa – Revista de Linguística, v. 50, n.º 2, 2006.
6. Sobre os programas que a Associação Ciberdúvidas da Língua Portugues produz para a rádio pública portuguesa, assinale-se o Língua de Todos é transmitido pela RDP África, na sexta-feira, dia 6 de março, pelas 13h20*, enquanto o Página de Português tem nova emissão na Antena 2, no domingo, 8 de março, pelas 12h30*.
O programa Língua de Todos é repetido no sábado, dia 7 de março, depois do noticiário das 09h00; e o Páginas de Português tem repetição no sábado, dia 14 de março, às 15h30). Hora oficial de Portugal continental, ficando ambos os programas disponíveis posteriormente aqui e aqui.