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Por Ciberdúvidas da Língua Portuguesa

1. No regresso do Ciberdúvidas à atividade regular, depois da pausa do Natal, os neologismos são o tema principal da primeira atualização de 2024. Um vocábulo novo, formado no contexto de uma mesma língua, ou introduzido como estrangeirismo, isto é, como empréstimo de outra língua, pode ter vida efémera, ditada pela moda, ou uso escasso, limitado a temas especializados; mas um neologismo pode integrar-se e ter futuro. Vem, então, a propósito referir uma palavra em circulação na cobertura mediática da guerra na faixa de Gaza: trata-se de domicídio, adaptação do inglês domicide, «destruição deliberada programada de casas e lares», formado a partir de domestic («doméstico») ou domicile («domicílio») e -cide, elemento cognato do português -cídio, que veicula a noção de «assassínio» (ver Wiktionary em inglês). Constituído integralmente por material com origem no latim, o termo terá sido cunhado em 1998 pelo geógrafo anglo-canadiano J. Douglas Porteous, autor, com Sandra E. Smith, de um livro publicado em 2001 com o título Domicide: The Global Destruction of Home, isto é, numa tradução livre (e inquietante), o mesmo que «Domicídio: A Destruição Mundial da Casa». A palavra domicídio é, portanto, motivada por um composto inglês de etimologia latina, cujos formantes se transpõem em português sem dificuldade e com correção.

CfA dimensão da destruição na faixa de Gaza no fim de 2023 Destruição em Gaza faz especialistas pedirem que crime de «domicídio» seja criado + Relatores da ONU acusam Israel de «domicídio» + '"Escolasticídio", acrónimo vs. sigla, «mais além», o feminino nos nomes dos cargos e profissões'

2. A palavra enantiossema existe em português? E que quererá dizer? A resposta sobre este termo neológico encontra-se no Consultório, onde se esclarecem outras cinco dúvidas: que diferença há entre «gostar da música popular» e «gostar de música  popular»? Uma locução é o mesmo que uma colocação? Que preposições podem associar-se ao adjetivo desconfiado? Como analisar sequências como «viúvo que foi» ou «acabado que foi o prazo»? Media-arte é palavra correta?

3. Na rubrica O Nosso Idioma, dois apontamentos ainda sobre casos de neologia:

– O empréstimo dorama é a denominação japonesa de um género televisivo que conquista público, a ponto de ter entrada no vocabulário da Academia Brasileira de Letras. A consultora Sara Mourato regista as primeiras manifestações do uso desta palavra em português.

– No contexto do lançamento de um novo livro da investigadora portuguesa Maria Filomena Mónica, o consultor Paulo J. S. Barata aborda um neologismo de há vinte anos, blogue, cujo radical estimulou a inventividade dos falantes, com o aparecimento de vocábulos como blogueiro e blogodesenvolvido.

4. Na rubrica A covid-19 na língua, assinala-se uma nova entrada: esplanadas-covid, relativa à remoção das muitas esplanadas que, em Lisboa, foram criadas para enfrentar a crise na restauração decorrente da pandemia.

5. Em 20 de dezembro de 1999, o território de Macau tornava-se a Região Administrativa Especial de Macau (RAEM) da República Popular da China. A professora universitária e linguista Margarita Correia evoca esta transição, considerando que, ao contrário do que seria de esperar, o português «floresceu em Macau», num artigo publicado no Diário de Notícias em 01/01/2024, transcrito aqui, com a devida vénia.

6. Faleceu, em Lisboa, em 4 de janeiro de 2024,  o cantor, compositor e poeta angolano Rui Mingas (Luanda, 1939), que ficou famoso por êxitos musicais como Os Meninos do Huambo. Além do desporto de competição (recordista dos 110 metros barreiras, em 1960, pelo Benfica de Lsboa), teve também importante ação política, assumindo funções como ministro do governo de Angola e como embaixador angolano em Portugal. Rui Mingas é também o autor da música do hino nacional de Angola, com letra do escritor Manuel Rui.

7. Outros registos da atualidade em Portugal com interesse para a língua portuguesa: a criação de um comissariado para as comemorações do 5.º centenário de Camões (Observatório da Língua Portuguesa, 30/12/2023); a escolha de professor como Palavra do Ano, passatempo da Porto Editora (Expresso, 03/01/2024); sobre a falta de professores, a estimativa da Federação Nacional de Professores, segundo a qual há, desde setembro de 2023, dois mil alunos sem um dos professores (Jornal de Notícias, 03/01/2024); e a aprovação pela Comissão dos Assuntos Constitucionais de diploma que permite nomes neutros no registo civil (Público, 03/01/2024).

8. Na passagem de 2023 para 2024, salienta-se:

– A publicação do número 60-61 da revista Palavras, da Associação de Professores de Português. Este número, coordenado pela linguista Carla Marques, que é também consultora permanente do Ciberdúvidas, reúne um conjunto de estudos de investigadores de Portugal e do Brasil sobre o ensino da oralidade na disciplina de Português, nos ensinos básico e secundário.

– O livro eletrónico O Galego e o Português: o Passado Presente (Parábola), volume organizado por Jussara Abraçado e Xoán Carlos Lagares, com a finalidade de aprofundar o estudo das relações históricas entre o galego e o português e promover interações na investigação de questões e fenómenos próprios do galego e de variedades do português.

9. A respeito de três dos programas que a rádio pública portuguesa dedica ao idioma comum:

– No programa Língua de Todos, difundido na RDP África, na sexta-feira, 05/01/2024 às 13h20* (repetido no dia seguinte, c. 09h05*), inclui-se uma entrevista com Cristina Martins, investigadora do CELGA-ILTEC, da Universidade de Coimbra, que discorre sobre um artigo que escreveu para a Revista da Associação Portuguesa de Linguística, intitulado, "O que ainda não sabemos e precisávamos de saber para o ensino de Português Língua Não Materna".

– Para refletir sobre os horóscopos enquanto género textual, Rute Rebouças, investigadora do Centro de Linguística da Faculdade de Letras da Universidade do Porto, é a especialista convidada de Páginas de Português, transmitido pela Antena 2, no domingo, 07/01/2024, às 12h30* (repetido no sábado seguinte, 13/01/2024 às 15h30*). No programa inclui-se ainda um apontamento da professora Carla Marques sobre o sentido do provérbio «pedra movediça não cria bolor».

– Mencione-se ainda Palavras Cruzadas, programa realizado por Dalila Carvalho e transmitido na Antena 2, cujas emissões de 8 a 12/01/2024 (de segunda a sexta-feira, às 09h50* e às 18h30*) são preenchidas com a discussão de palavras e expressões da linguagem das finanças públicas e da economia.

10. Por úlitmo, recorde-se que, até dia 10 de janeiro, o Ciberdúvidas lança aos seus leitores um desafio – a Dúvida do Ano. Qual lhe parece ser a dúvida (ou erro) mais frequente entre os falantes? Apresentamos dez possibilidades, entre as quais poderá selecionar aquela que julga ser a mais corrente – para participar, clicar aqui.

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1. Como foi assinalado na Abertura de 15/12/2023, o Consultório faz uma pausa no período de Natal, de 15/12/2023 a 02/01/2024, ficando inativo o formulário para o envio de dúvidas. As atualizações regulares são retomadas em 5 de janeiro, sexta-feira. Durante esta pausa, poderão ser postos em linha ou simplesmente divulgados com ligação direta à fonte novos conteúdos relacionados com a atualidade e a história da língua portuguesa, os quais são assinalados nos Destaques colocados logo abaixo deste espaço da Abertura. Mantém-se também aberto o acesso a todo o extenso arquivo do Ciberdúvidas – perto de 38 000 respostas no Consultório e mais de 12 000 artigos nas demais rubricas. A todos os nossos consulentes, votos de umas excelentes Festas!

Para outros assuntos, fora dos âmbitos gramatical e linguístico, ficam os contactos habituais aqui.

2. A Dúvida do Ano é o desafio que o Ciberdúvidas propõe aos seus consulentes na passagem de 2023 a 2024. Trata-se de um inquérito em formato digital – o acesso encontra-se aqui – , no qual se apresentam dez dúvidas recorrentes entre quantos procuram esclarecimentos sobre os usos corretos. Pede-se aos participantes que assinalem a dúvida ou erro que lhes pareça mais frequente entre os falantes. O inquérito é preenchido diretamente na página eletrónica criada para o efeito, que estará ativa até 4 de janeiro de 2024. Mais informação no mural do Ciberdúvidas no Facebook.

3. Entretanto, propõe-se aqui a leitura de um poema do poeta português Jorge de Sena (1919-1978), cujo título, embora referindo um Natal com mais de meio século, não perdeu atualidade:

 

NATAL DE 1971
 
Natal de quê? De quem?
Daqueles que o não têm?
Dos que não são cristãos?
Ou de quem traz às costas
as cinzas de milhões?
Natal de paz agora
nesta terra de sangue?
Natal de liberdade
num mundo de oprimidos?
Natal de uma justiça
roubada sempre a todos?
Natal de ser-se igual
em ser-se concebido,
em de um ventre nascer-se,
em por de amor sofrer-se,
em de morte morrer-se,
e de ser-se esquecido?
Natal de caridade,
quando a fome ainda mata?
Natal de qual esperança
num mundo todo bombas?
Natal de honesta fé,
com gente que é traição,
vil ódio, mesquinhez,
e até Natal de amor?
Natal de quê? De quem?
Daqueles que o não têm,
ou dos que olhando ao longe
sonham de humana vida
um mundo que não há?
Ou dos que se torturam
e torturados são
na crença de que os homens
devem estender-se a mão?
 
Pode também ouvir-se este poema na voz da atriz portuguesa Márcia Breia (fonte: Arquivos RTP).
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1. O acordo alcançado na cimeira da ONU sobre as alterações climáticas (COP28), que terminou no Dubai em 12/12/2023, suscita reações divergentes, enquanto aumenta o aquecimento global e se fala de 2023 como o ano mais quente de sempre. Acrescem os conflitos armados, o mais trágico dos quais em Gaza, donde vêm notícias e imagens apocalípticas, a ponto de apocalíptico se tornar a palavra mais pesquisada em 2023 no dicionário eletrónico Priberam (ver Notícias). Cabe, portanto, assinalar que apocalíptico é adaptação do grego apokaluptikós («que revela, que descobre»), adjetivo derivado do vocábulo apokalúpsis («ato de descobrir, descoberta; revelação»), por sua vez formado do verbo apokalúptō («desmascarar, forçar a falar; revelar») e transmitido ao português e outras língua modernas por via do latim tardio apocalypsis (cf. Dicionário Houaiss). Em português, o uso de apocalipse, que pode ser sinónimo de catástrofe, já vem da Idade Média e tem enorme significado religioso, porque, no Novo Testamento, dá nome ao último livro, o que contém revelações e visões sobre o fim do mundo. Quanto à sua autoria, o Apocalipse terá sido escrito pelo apóstolo e evangelista João na ilha grega de Patmos – local que também foi notícia em 2023 a propósito do drama dos imigrantes e refugiados que arriscam a vida a atravessar o Mediterrâneo para chegar à Europa.

Na imagem, "A mulher no Sol e o dragão" (fól. 153v), ilustração do Apocalipse de Lorvão, códice de 1189, que se encontra no Arquivo Nacional da Torre do Tombo, em Lisboa (digitalização e outra informação disponíveis aqui). O Apocalipse de Lorvão é um pergaminho com 223 folhas que pertenceu ao mosteiro de S. Mamede de Lorvão, de onde foi trazido para a Torre do Tombo por Alexandre Herculano (1810-1877). O seu conteúdo baseia-se no comentário do Beato de Liébana, do séc. VIII.

2. Pode lamentar-se a falta de interesse dos editores anglo-saxões pelas literaturas em português, mas noutros universos linguísticos constatam-se grande atenção e muitas traduções. É o caso da popularidade da obra de José Saramago em turco, conforme o testemunho de Jessica Mendes na rubrica Literatura.

3. Intensifica-se o debate sobre o futuro da unidade da língua portuguesa face a tendências centrífugas cada vez mais fortes. O português do Brasil tem tradição normativa própria e impõe-se pela demografia; por seu lado, Angola apropria-se cada vez mais do idioma, mas confere-lhe características próprias. Entretanto, em Portugal, a língua não estagnou, muito pelo contrário, adquirindo traços inconfundíveis, como se mostra Vítor Barros em Gramática do Português Europeu, um livro publicado pelas Edições Colibri e agora apresentado em Montra de Livros.

A consideração de diferentes normas para o português convoca o conceito de «língua pluricêntrica», acerca do qual se pode consultar "A gramática e o conceito de língua pluricêntrica", "Como se ensina uma língua pluricêntrica?"  e "Para uma língua efetivamente pluricêntrica".

4. Já aqui foi comentada a frase de efeito cómico «fi-lo porque qui-lo» (ou melhor, de forma mais correta, «fi-lo porque o quis»), que tem sido atribuída ao presidente brasileiro Jânio Quadros (1917-1992). No Consultório, explica-se a forma qui-lo, entre outros tópicos, num total de nove respostas nesta atualização: a concordância em «Roma e Pavia não se fizeram num dia»; o significado do verbo ocorrer; a expressão «de presente»; a construção de uma enumeração por um polissíndeto; a diferença entre «para eleger» e «por eleger»; o fecho de uma carta formal; o pronome aquilo seguido de construção relativa; e o uso nominal de exposto.

5. Nas Controvérsias, inclui-se um apontamento do meteorologista Manuel Costa Alves, sobre o sentido implicitamente inclusivo de saudações como «bom dia», «boa tarde» e «boa noite».

6. Registos da atualidade com incidência em temas da língua portuguesa:

– a realização em 15/12/2023, a partir da Universidade de Évora, do VIII Congresso Internacional História e Língua: Interfaces, subordinado ao tema "O  Português como Língua Pluricêntrica" (evento em linha);

– o comunicado da Faculdade de Comunicação, Arquitetura, Artes e Tecnologias da Informação da Universidade Lusófona, no Porto, no qual se apresentam resultados preliminares de um estudo que revelam que 53% dos universitários recorre a Inteligência Artificial para estudar e realizar trabalhos (ver Jornal de Notícias, 14/12/2023).

7. A respeito de três dos programas que a rádio pública portuguesa dedica ao idioma comum:

– Em Língua de Todos (RDP África, sexta-feira, 15/12/2023, 13h20*; repetido no dia seguinte, c. 09h05*), conversa-se com Márcio Undolo, professor associado do departamento de Ensino da Língua Portuguesa do Instituto Superior de Ciências da Educação de Benguela (Angola), sobre a recente publicação do livro eletrónico Português de Angola: fonologia, sintaxe e lexicografia.

– Em Páginas de Português (Antena 2, domingo, 17/12/2023, 12h30*; repetido em 23/12/2023, 15h30*), entrevista-se a linguista e professora universitária Esperança Cardeira (Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa) a respeito da sua mais recente obra, Gramática Histórica do Português Europeu, editada no Brasil.

– Mencione-se ainda Palavras Cruzadas, programa realizado por Dalila Carvalho e transmitido na Antena 2, cujas emissões de 18 a 22/12/ 2023 (de segunda a sexta-feira, às 09h50 e às 18h30) tem por mote os termos empregados na gastronomia e na restauração.

8. Por último, informa-se que o Consultório estará encerrado no período de Natal,  de 15/12/2023 a 02/01/2024, ficando inativo o formulário para o envio de dúvidas. As atualizações regulares são retomadas em 5 de janeiro, sexta-feira. Durante esta pausa, poderão ser divulgados novos conteúdos relacionados com a atualidade e a história da língua portuguesa. Mantém-se também aberto o acesso a todo o extenso arquivo do Ciberdúvidas – perto de 38 000 respostas no Consultório e mais de 12 000 artigos nas demais rubricas. A todos os nossos consulentes, votos de umas excelentes Festas!

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1. Em Portugal, a palavra escrutínio tem surgido com alguma frequência no discurso político associado ao momento de crise que emergiu em várias frentes. Diferentes intervenientes na cena política têm vindo a público defender um escrutínio sobre as instituições, no âmbito tanto das investigações promovidas pelo Ministério Público, que levaram à queda do governo, como do chamado «caso das gémeas», que poderá ter beneficiado de influência política. O termo escrutínio é também mobilizado no contexto de eleições e, no caso português, será usado com bastante frequência em 2024 atendendo a que num mesmo ano ocorrerão eleições legislativas antecipadas nos Açoresem Portugal e ainda eleições europeias. Escrutínio é, assim, um substantivo com uma diversidade de possibilidades significativas: de «votação por meio de boletins que se depositam numa urna» a «apuramento ou contagem dos votos entrados em urna» ou ainda «exame minucioso». Este último significado parece ser o mais próximo do valor originário da palavra, que, etimologicamente, vem do latim scrūtĭnĭum, ii, palavra que significava «ação de sondar, ato de pesquisar» e que tem como base scrūta, ōrum, cujo significado refere «roupas velhas, ferros velhos ou outros objetos de pouco valor». Da mesma família, são as palavras escrutinar, escrutar («sondar, remexer») e também esquadrinhar («buscar com cuidado e diligência»). Ao âmbito lexical pertencem também as duas novas entradas em A covid-19 na LínguaJN.1Pirola, que designam a nova sublinhagem do coronavírus que domina no hemisfério Norte.

2. A atualização do Consultório integra esclarecimentos a várias dúvidas recebidas pela equipa. Entre elas encontra-se a questão da natureza da partícula -se nos verbos desmoronar-se e estender-se, a construção do verbo terminar equivalente a «acabar por», a troca da terminação -am por -em, as expressões «ao largo de» e «ao longo de» e a possível diferença entre lides e lida. Por fim, trata-se a questão da abordagem didática relacionada com o uso excessivo do verbo falar, no sentido da promoção da diversidade lexical e apresentam-se formulações para indicar o destinatário no cabeçalho de uma carta formal.

3. É frequente ouvir-se a construção «*os livros que mais gostei», a qual é incorreta por não incluir a preposição de antes do pronome relativo, tal como explica a professora Carla Marques neste apontamento divulgado no programa Páginas de Português, da Antena 2. 

4. Na Montra de Livros são apresentadas duas publicações: a obra Da didática de língua(s) ao seu ensino (Pontes Editores), organizada por Luciana GraçaMatilde GonçalvesLuzia Bueno e Eliane Lousada, que compila um conjunto de estudos de homenagem ao professor Joaquim Dolz, docente na Universidade de Genebra, e a obra Ensinar Português Língua de Herança como Língua Pluricêntricaorganizada por Isabel DuarteMaria de Lurdes Gonçalves e Sónia Rita Melo, onde se pode conhecer um conjunto de propostas didáticas relacionadas com o ensino do português, tendo em consideração o seu pluricentrismo.

5. Os resultados do Relatório Pisa, divulgados na semana passada, desencadearam a discussão sobre o estado do ensino e das aprendizagens em Portugal. A professora universitária e linguista Margarita Correia aborda este assunto na perspetiva dos seus resultados internacionais, num artigo aqui partilhado com a devida vénia.

Cf. Porque pioram os alunos?

6. As subtilezas do domínio de expressões alusivas a referentes masculinos nos textos de natureza jurídica dão matéria à reflexão apresentada pela professora universitária Inês Espinhaço Gomes, na qual defende a importância da seleção das palavras (texto publicado no jornal Público e aqui partilhado com a devida vénia).

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1. A atualidade internacional volta a ficar marcada pela guerra em Gaza e na Ucrânia, pela crise climática e pelo decionante impasse na COP28, no Dubai, entre muitos outros focos de tensão e conflito. No mundo de língua portuguesa, as notícias dão igualmente conta de alguma agitação, pelo menos, mais declarada na Guiné-Bissau, onde o parlamento foi dissolvido, ou em Portugal, com o chamado «caso das gémas». Bem mais pacífica e estimulante é com certeza uma novidade vinda de Angola: a publicação do livro Português de Angola: Fonologia, Sintaxe e Lexicografia, uma obra coordenada por três linguistas – dois angolanos, Márcio Undolo e Gaudêncio Kimuenho, e o moçambicano Alexandre António Timbane. Trata-se de um trabalho que visa dar contributos para a elaboração da norma do português angolano, conforme se regista nas Notícias.

Na imagem, as quedas-d'água de Calandula, na província de  Malanje, em Angola (fonte: "Quedas de Calandula", Wikipédia, consultada em 05/12/2023).

2. O que se faz e não faz pela inclusão e pela linguagem que a promove continua a dar abundante matéria de reflexão. Na rubrica O Nosso Idioma, a consultora Inês Gama mostra como  as questões de género e identidade geram um debate não despiciendo – adjetivo que ganhou relevo mediático em Portugal e que é comentado pela professora Carla Marques na mesma rubrica.

3. Quando se conjuga o verbo sair no presente do indicativo, como se escreve a forma da 3.ª pessoa do plural (eles, elas)? "Saiem"? No Pelourinho, a consultora Sara Mourato recorda que a grafia correta é saem, corrigindo o que se escreveu numa notícia sobre uma plataforma de encontros.

4. Quando o nome resto ocorre, por exemplo, em expressões como «o resto», não estaremos a usar um pronome indefinido? A resposta faz parte do conjunto de nove respostas que atualizam o Consultório e abordam outros tópicos: o gentílico de Bereia, o nome Via Sacra, a relação das conjunções com os modos verbais, um caso de oração subordinada comparativa, dois verbos homónimos (decorar), o verbo sentir seguido de oração adverbial, o superlativo relativo e o termo primitivabilidade.

5. Os jovens portugueses parecem perder as denominações de relações de família e parentescos menos próximos, como sejam, bisavó, tio-avô ou genro. Nada de comparável entre os falantes de mandarim, que memorizam um sistema de termos de parentesco muito complexo – revela a professora Dora Gago nas Diversidades, em crónica transcrita, com a devida vénia, da revista digital Algarve Informativo.

6. Na rubrica Ensino, inclui-se um comentário dos investigadores brasileiros Henrique BragaMarcelo Módolo incluído no Jornal da USP, acerca dos critérios de correção (no Brasil, gabarito) da prova de Linguagens do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem).

7. O "brasileiro" já não faz parte da língua portuguesa? Nas Controvérsias, o gramático brasileiro Fernando Pestana contesta a ideia de «língua brasileira», defendendo a unidade do idioma, que permite a qualquer aprendente estrangeiro comunicar tanto no Brasil como em Cabo Verde, Portugal, Angola, Moçambique, Timor-Leste ou mesmo na Guiné-Bissau.

8. À medida que 2023 se aproxima do fim, aparecem os já tradicionais passatempos da «Palavra do Ano». É o caso da votação organizada pela Porto Editora, que apresentou a seguinte lista, a traduzir bem as preocupações sociais e políticas dos últimos meses em Portugal: clima, conflitos, demissão, habitação, inflação, inteligência artificial, jornada, médico, navegadoras, professor. É de lembrar que, em 2022, guerra foi a palavra escolhida pelos participantes na escolha promovida pela Porto Editora.

 Acrescente-se que, para o inglês, a Oxford University Press (OUP), a segunda editora mais antiga do mundo, já anunciou a palavra do ano: rizz , nome do registo coloquial, que significa «estilo, charme ou atratividade; a capacidade de atrair um parceiro romântico ou sexual» (cf. jornal digital brasileiro Nexo e, em inglês, página da OUP).

9. Da atividade académica relacionada com a língua portuguesa, destacam-se:

– o anúncio da 1.ª chamada de trabalhos da conferência "De cada língua se constrói o futuro – a voz da sustentabilidade no ensino e aprendizagem das línguas", promovida pelo Centro de Línguas e Cultura (CLiC) do Instituto Politécnico de Lisboa (IPL);

– a ação de curta duração "Ensino e aprendizagem do PLNM: estratégias e recursos", também do do CLiC do IPL, em parceria com a Escola Superior de Educação de Lisboa.

10. Devido ao feriado religioso de 8 de dezembro, celebrado em Portugal como noutros países, a próxima atualização do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa fica marcada para 12 de dezembro. Sobre o significado também histórico-político da data de 8 de dezembro, ler a Abertura de 27/11/2020.

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1. O conflito israelo-palestiniano vive uma fase de interrupção dos confrontos bélicos que tem permitido a troca de reféns detidos pelo Hamas por prisioneiros palestinianos detidos em prisões israelitas. Esta pausa facilitou a entrada de ajuda humanitária em Gaza. Mal o acordo foi tornado público, alguma comunicação social anunciou pedidos de «trégua permanente» ou de «trégua duradoura». Estas são expressões que não se ajustam à situação que se pretende descrever, pois encerram termos antitéticos. Com efeito, trégua significa «cessação temporária de hostilidades entre beligerantes» (Priberam), o que contrasta com a noção de permanente, que descreve algo «duradouro, ininterrupto», ou de duradouro, pelas mesmas razões. São, portanto, termos que se excluem: uma situação será ou transitória ou permanente. Para referir de forma mais ajustada aquilo que efetivamente é pedido será preferível recorrer a expressões como «cessar-fogo permanente», «fim nos combates» ou, não sendo possível uma situação definitiva, «prolongamento das tréguas». Acrescente-se ainda que a expressão «tréguas temporárias» também não é ajustada por ser redundante, visto que a palavra trégua já encerra a ideia de algo momentâneo.

2. «Andar à guna» é uma expressão pertencente ao registo familiar ou a um determinado tipo de gíria. É usada sobretudo na região norte, na zona do grande Porto. A consultora Inês Gama descreve o seu significado e a sua origem no apontamento divulgado no programa Páginas de Português, na Antena 2.  

3. A construção «dar ghosting» tem registos frequentes entre as gerações mais jovens. A consultora Sara Mourato explica como se formou, abordando a sua origem a partir do inglês, e esclarece os contextos de uso, num apontamento disponível na rubrica O Nosso Idioma.

4.  A presença ou ausência do artigo definido junto de um substantivo pode implicar diferenças no sentido veiculado pelos sintagmas nominais, tal como se esclarece numa das respostas incluídas na atualização do Consultório. Nesta secção podem também ser consultadas as seguintes perguntas e respetivas respostas: «A origem de Donim (Guimarães)», «A origem de Fão (Esposende, Braga)», «O significado de ressecar», «Concordância do possessivo: «as vossas esperanças e desejos»», «O nome gaultéria», «O verbo cair com modificador», «A frase "que tenha um bom dia"» e «O adjetivo influencial».

 5. O treinador do Benfica Roger Schmidt irritou-se com os jornalistas por estes lhe terem colocado questões em português, não tendo ido a uma conferência de imprensa após um jogo. Este é um episódio que motiva o apontamento disponível no Pelourinho, da autoria de José Mário Costa, cofundador do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa. 

6. A confusão entre pisteiro e pistoleiro deu azo a um título equívoco num jornal televisivo, o que merece a correção e o esclarecimento de Carlos Rocha, coordenador executivo do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa. 

7. Paulo J. S. Barata, consultor do Ciberdúvidas, dá conta do uso da expressão «vai na fé», que é usada como a verbalização de um ato de confiança. 

8. Uma discussão em torno dos substantivos incluídos na expressão «velho e relho» levam o jornalista e escritor Carlos Coutinho em busca de esclarecimentos relacionados com o significado destes termos.  

9. Entre os eventos de relevo para a língua damos destaque aos seguintes:

– Lançamento do Dicionário de Abreviaturas Digitais, coordenado por Raquel Amaro e disponível em linha;

– O Congresso Internacional Em Português – falar, viver, e pensar no século XXI, organizado pela Universidade Católica Portuguesa e ainda em decurso (presencial e online).

 

*Informamos os nossos leitores e consulentes que na próxima sexta-feira, 1 de dezembro, não haverá abertura do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa por ser dia feriado. A próxima atualização terá lugar em 5 de dezembro, terça-feira. 

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1. Pela Europa, somam-se os sintomas de mal-estar político e social, que vão do resultado das eleições nos Países Baixos a desacatos em Dublim. Por outro lado, o consumismo entrega-se ao ritual multitudinário da Black Friday (cf. "Um duplo contrassenso"). A agitação presente pode motivar a nostalgia de uma tranquilidade pretérita; mas depressa se descobre que, no passado, a ordem social e política estabelecida gerava descontentamento e era desafiada por juízos populares muito negativos, como confirmam provérbios antigos, já atestados na Idade Média. Por exemplo, «mais vale salto de mata que rogo de homens-bons», que é como quem diz «não confies nos poderosos»; ou o niilista «quem não mente não vem de boa gente». Estes e outros provérbios estão reunidos e comentados em O Essencial sobre os Provérbios Medievais Portugueses, um livrinho de 1987 que foi escrito pelo historiador português José Mattoso (1933-2023) e que se recupera numa apresentação incluída na Montra de Livros, subscrita pela escritora e professora Arlinda Mátires.

Sugere-se aqui também a consulta da base de dados Cantigas Medievais Galego-Portuguesas, na qual se disponibiliza uma lista dos provérbios que ocorrem na lírica profana trovadoresca. Crédito da imagem: NCultura, 20/01/2019.

2. Ainda na rubrica Montra de Livros, dá-se conta de duas publicações recentes que reúnem estudos linguísticos sobre o português: Gramática e Texto. Contextos, usos e propostas didáticas, volume dedicado à investigação desenvolvida no âmbito da linguística textual e discursiva; e Saberes em sociolinguística: trilha, demandas e proposições, um conjunto de nove trabalhos à volta da sociolinguística brasileira.

3. A lendária e muito avisada máxima «conhece-te a ti mesmo» contém um pleonasmo? Não, como se explica numa das seis novas respostas do Consultório, nas quais são tratados ainda os seguintes tópicos: a pronúncia do nome obreia, a estrutura da frase «estou com medo de entrar no avião», a identificação de um modificador do grupo verbal, os significados de pilrito e a construção de grau numa frase.

4. «Não é só o português que os brasileiros falam – musical, gracioso, sexy, humorístico, brincalhão, metediço, encantador – mas a maneira como eles vão construindo a língua à medida que falam» que cativam o escritor português Miguel Esteves Cardoso, que elogia a criatividade dos brasileirismos, em crónica incluída no jornal Público de 19/11/2023 e transcrita com a devida vénia nas Diversidades.

5.  «Isto da crise deixa-me confuso porque nos mexeram no vocabulário» – confidencia ironicamente o escritor Afonso Reis Cabral, a propósito da crise política em Portugal e de certa desordem vocabular decorrente, em crónica publicada no Jornal de Notícias em 22/11/2023 e devidamente atribuída em O Nosso idioma.

6. Do muito que se publica na Internet sobre a projeção mundial da língua portuguesa, dois destaques: um trabalho da jornalista brasileira Adelina Lima a respeito das 10 línguas mais faladas no mundo em 2023, elenco onde o português é o 6.º classificado; e o sucesso da tradução em inglês do romance A palavra que resta, do escritor brasileiro Stênio Gardel, que ganhou o National Book Award, um dos mais importantes prémios dos Estados Unidos da América.

7. Um registo de pesar pelo falecimento do encenador e ator Carlos Avillez, fundador do Teatro Experimental de Cascais, onde desenvolveu um trabalho notável, desenvolvendo uma dramaturgia baseada quer em obras de autores de língua portuguesa quer na tradução de textos de autores estrangeiros.

8. Os francesismos que circulam numa aldeia do distrito de Leiria dão o mote para o 3.ª episódio da série áudio Ciberdúvidas – o Podcast, que tem como anfitriãs Sara Mourato e Jessica Mendes, no âmbito da atividade do Laboratório de Competências Transversais do Iscte.

8. Quanto aos três dos programas que, na rádio pública portuguesa, são dedicados ao português:

– no Língua de Todos, difundido na RDP África, na sexta-feira, 24/11/2023 às 13h20* (repetido no dia seguinte, c. 09h05*), fala-se do livro Migrações e Interculturalidade: Conhecer para intervir em Sala de Aula;

– no Páginas de Português, transmitido pela Antena 2, no domingo, 26/11/2023, às 12h30* (repetido no sábado seguinte, 2/12/2023 às 15h30*),  o convidado convidado é o professor Paulo Feytor Pinto (Centro de Estudos de Linguística Geral e Aplicada – CELGA-ILTEC, da U. Coimbra),  que propõe uma leitura intercultural do episódio  Chegada à Índia (canto VII, estrofes 16­-59), d'Os Lusíadas, e inclui-se um apontamento de Inês Gama, consultora do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, acerca do significado da expressão «andar à guna»;

– assinale-se, por último, Palavras Cruzadas, programa realizado por Dalila Carvalho e emitido pela Antena 2, de segunda à sexta-feira, às 09h50 e às 18h50*.

* Hora oficial de Portugal continental.

Por Ciberdúvidas da Língua Portuguesa

1. A Argentina foi a votos e elegeu como presidente o economista Javier Milei, conhecido pelas suas posições radicais. O homem que tomará a cargo o destino do povo argentino descreve-se como anarcocapitalista. A expressão, pouco corrente em Portugal, designa um tipo particular de capitalismo que se caracteriza por não ser regulado pelo Estado e pela defesa do mercado livre e do sistema de propriedade privada. Milei caracteriza-se ainda como um «liberal libertário», termo que refere uma corrente política defensora do individualismo e da liberdade económica e de mercado. A comunicação social apresenta-o como ultraliberal e ultradireitista. A curiosidade do léxico usado para definir os traços do novo presidente argentino passa pelo facto de as palavras que o integram apontarem para o campo semântico do extremismo, o que se refletirá eventualmente nas práticas políticas a encetar no novo cenário político. No âmbito da grafia das palavras em destaque, recordemos que, no quadro do Acordo Ortográfico de 1990, os termos anarcocapitalista, ultraliberal e ultradireitista deverão ser grafados como formas aglutinadas, o que significa que não levam hífen. Já a expressão «liberal libertário» deve ser escrita sem hífen a ligar as palavras que a constituem, visto que se trata de uma locução não consagrada pelo uso (cf. Base XVI, do AO90). Refira-se, por fim, que o termo ultradireita é equivalente à expressão «extrema direita» que, no português europeu, tem mais tradição de uso. 

Primeira imagem: Bandeira de Gadsden: por baixo da cascavel pode ler-se a frase «Não me pises». Esta foi uma das primeiras bandeiras adotadas pelos anarcocapitalistas. 

2. No Consultório analisa-se a forma como se pronuncia o e em palavras como mexo, fecho ou desço, para se concluir que existe oscilação nas práticas dos falantes. Esta resposta a uma dúvida colocada por um consulente do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa é acompanhada de outras nove: «Carta de prego e tradução de La Fontaine», «Se», «Mau/mal seria/era», «Pronomes átonos e os verbos esperar e morder», «O verbo significar seguido de oração subordinada», «O adjetivo desregulatório», «Costumar e a voz passiva», «Gerúndio: «qual fantasma, os olhos cintilando no escuro»» e «Tudo, antecedente do pronome relativo quanto».

3. Poderão os advérbios ter um complemento? E este complemento poderá ter uma natureza oracional? Estas questões dão mote à reflexão proposta pela professora Carla Marques (apontamento divulgado no programa Páginas de Português, na Antena 2). 

4. A diferença entre lembraste e lembras-te constitui uma dificuldade sentida por muitos falantes, tal como se assinala no Pelourinho, num apontamento do consultor Paulo J. S. Barata

5. Na sequência de uma análise sobre o uso do termo nega num texto jornalístico, José Mário Costa, cofundador do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa,  escreve sobre o uso da  informalidadevem discordar da avaliação aí proposta, num novo texto disponível na rubrica Controvérsias.

6. A professora universitária Dora Gago partilha com os seus leitores uma experiência de ensino na Faculdade de Letras da Universidade da República Oriental do Uruguai (partilhado com a devida vénia).

7. Um destaque final para a mesa-redonda Revisitar os clássicos em aulas do Ensino Básico e Secundário - III, com a presença de Adriana NogueiraAna Paula LoureiroPaulo Sérgio Ferreira, que terá lugar na Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, no dia 24 de novembro de 2023, pelas 17h.

Por Ciberdúvidas da Língua Portuguesa

1. Portugal vive um período conturbado politicamente devido à demissão do primeiro-ministro António Costa e à anunciada dissolução da Assembleia da República. Esta reviravolta política foi desencadeada pela, assim designada, Operação influencer, da responsabilidade do Ministério Público, que levou a cabo uma investigação que lida com suspeitas de corrupção de vários membros do governos e de outras figuras com poder na sociedade civil, no âmbito dos negócios do hidrogénio e do lítio e dos assuntos relacionados com a empresa Start Campus. No plano da língua, observamos, uma vez mais, a preferência das entidades públicas pelas designações em inglês, selecionando palavras que, tal como em outros casos similares, têm, em língua portuguesa, um equivalente estável e já dicionarizado. Com efeito, o termo influencer é equivalente ao português influenciador, que pode ser usado ora como nome ora como adjetivo com o significado de «que ou quem influencia ou tem alguma espécie de influência sobre algo ou alguém» (Priberam), um significado que poderia ter bastado para habilitar a palavra a ser adotada para designar a operação. Aceitar o domínio excessivo da língua inglesa e ser, inclusive, cúmplice deste processo em nada contribui para a defesa da língua portuguesa e para a sua afirmação no plano internacional.

A questão do progressivo recurso ao inglês nas mais diversas áreas sociais tem sido muito discutida no Ciberdúvidas. Recordamos algumas aberturas que focaram o assunto: «Pressão anglófona em Portugal [...]», «A tradução de deepfake [...]», «A palavra media [...]», «[...], a tradução de bullying [...]», «dummy feminino [...]». 

2. O uso do substantivo nega num texto da comunicação social leva a consultora do Ciberdúvidas Sara Mourato a avaliar a adequação do recurso a um substantivo marcado pela informalidade nestes contextos, num apontamento disponível na rubrica Pelourinho.

3. A frase «Está um dia bom» tem sujeito? A questão colocada leva à análise de algumas estruturas copulativas, considerando ainda a ordem dos elementos na frase. Também de ordem sintática é a explicação do facto de o pronome átono lhe não ser precedido de preposição. A estas respostas vêm juntar-se ainda as seguintes: «O topónimo «serra da Marofa»», «A locução «de todo»», «Incómodo e inconveniente», «A expressão «a seu pedido»» e «A pronúncia de anéis».

4. Na Montra de Livros estão em destaque duas novas publicações:

Assim nasceu uma norma — pequena história da corrida linguística na Galiza entre 1970 e 1983, de José João Rodrigues (Através Editora);

– O número 10 da Revista da Associação Portuguesa de Linguística, uma edição organizada por Adelina CasteloAlexandra Fiéis e Cristina Flores

5. O Dia Nacional da Língua Gestual Portuguesa teve lugar a 15 de novembro tendo sido assinalado com inúmeros eventos de natureza muito distinta. Neste âmbito, o P3 (separata do jornal Público) divulgou uma reportagem sobre a primeira médica do Serviço Nacional de Saúde que usa língua gestual no seu consultório (partilhado com a devida vénia). 

6. Encontrar uma língua suficientemente simples e suficientemente acessível a todos os povos é um desejo muito antigo, que levou ao desenvolvimento de inúmeras ações entre as quais se conta a criação de uma língua como o esperanto. As tensões neste campo são, no entanto, inúmeras, como nos dá conta, neste texto, o advogado e interlinguista Miguel Faria de Bastos

7.  Entre os eventos de relevo para a língua, destaque para os seguintes:

Jornada dos Dicionários - Usos didáticos do dicionário, evento híbrido com lugar hoje em Lisboa e à distância (17 de novembro, na Universidade Nova de Lisboa);

– Lançamento da versão física do Dicionário Kaiowá-Português, que reúne mais de 6000 palavras do idioma indígena, organizado por Graciela Chamorro, com a chancela da editora brasileira Javali.

8. Uma referência final aos novos temas dos programas à volta da língua portuguesa transmitidos pela rádio pública de Portugal:

– Em Língua de Todos, difundido na RDP África, na sexta-feira, 17/11/2023, às 13h20* (repetido no dia seguinte, c. 09h05*), a professora e linguista Sandra Duarte Tavares reflete sobre os processos didáticos que podem conduzir os alunos ao aperfeiçoamento da sua competência linguística;

– O projeto Pela mão da Literatura vejo o mundo, que pretende motivar alunos sobredotados para a literatura, é o tema da conversa com o professor de Português e Espanhol André Matias no programa Páginas de Português, transmitido pela Antena 2, no domingo, 19/11/2023, às 12h30* (repetido no sábado seguinte, 25/11/2023 às 15h30*);

– De 20 a 24 de novembro, as emissões de Palavras Cruzadas, programa realizado por Dalila Carvalho e transmitido na Antena 2, são dedicadas à linguagem na economia com o economista e professor na Universidade Stern de Nova Iorque, Luís Cabral (segunda a sexta, às 09h50* e às 18h50*).

*Hora oficial de Portugal continental.

Por Ciberdúvidas da Língua Portuguesa

1. Em Lisboa, de 13  a 16 de novembro, tem lugar mais uma edição da Web Summit – «apesar das controvérsias, apesar dos boicotes», como observou um visitante brasileiro, em português (ver e ouvir apontamento da RTP Notícias, em 13/11/2023). O encontro tem projeção internacional e visa a inovação tecnológica e os seus negócios, áreas cuja língua veicular é geralmente o inglês. Mas, e apesar das promessas de promoção linguística, o facto é que o idioma da cidade anfitriã, continua a primar pela discrição e até mesmo pela ausência. Basta visualizar as páginas da plataforma digital do evento.

À volta das Web Summit, realizadas em Lisboa desde 2016, sugere-se a leitura dos seguintes conteúdos: "Web Summit, start-up e feature:como usar em português?", "10 novas respostas no consultório do Ciberdúvidas, a Web Summit 2017 e (um)a Urban Beach à beira-Tejo", "Uma Web Summit que angliciza Lisboa", "Falar do futuro pós-pandemia, o termo orçamento, o conceito de língua materna e sobre a Web Summit 2021 em Lisboa", "A dinâmica do idioma no Brasil, a glotofobia, uma vírgula de Sophia, o fruto pera-melão e o pluricentrismo no ensino da língua", "A evolução de plafom, o cinema no Cuidado com a Língua!, a invasão linguística da Web Summit e os alertas de Jorge de Sena".

2. A pressão do inglês exerce-se, por exemplo, através dos falsos amigos, que mesmo falantes bilingues experientes deixam inadvertidamente escapar. No Pelourinho, ilustra-se esta situação com a tradução errónea do inglês casualty («vítima, baixa») por casualidade, nos comentários em direto sobre a guerra de Gaza num canal de televisão em Portugal. O consultor Paulo J. S. Barata regista e esclarece a confusão.

3. A frase «comprou um presente para levar para a festa» estará incorreta? Repetir palavras na mesma frase, como é o caso de para no exemplo, é erro de gramática? No Consultório, responde-se a esta dúvida e a mais sete, num total de oito novas respostas abrangendo os seguintes tópicos: as orações coordenadas copulativas, o adjetivo educativo, o uso de entender + por («entender pela prorrogação»), os nomes frei, freira e sóror, o apelido Charneco, o topónimo Timpeira e o momento da resolução num conto de  Eça de Queirós.

4. Em O Nosso Idioma, a confusão frequente mas evitável entre as preposições sob e sobre é o tema de um apontamento da professora Carla Marques. Na mesma rubrica, os tratamentos honoríficos usados no foro jurídico motivam um texto do jurista Miguel Faria de Bastos, que, no final, menciona o conceito de heterarquia; e, a propósito deste termo e da  sua transposição para os media, inclui-se um artigo de 2008, do jornalista Carlos Castilho, que define heterarquia como «uma forma de trabalho coletivo onde não há um superior e nem uma agenda ou método imposto de cima para baixo, por meio de chefias hierarquizadas».

5. Moçambique é um país multilingue, onde, além do português, coexistem muitas outras línguas predominantemente do ramo bantu da família linguística Níger-Congo. Como lidam as autoridades e as comunidades académicas com esta diversidade? Em Lusofonias, transcreve-se, com a devida vénia, o artigo que, publicado no Diário de Notícias (13/11/2023), a professora universitária e linguista Margarita Correia dedicou às políticas linguísticas de Moçambique.

6. Nas Notícias, dá-se conta do projeto FLIPP, ao qual se associa uma plataforma de ferramentas e cursos que visam a transformação digital das escolas. Trata-se de uma iniciativa com a participação de equipas académicas da Turquia, Grécia, Kosovo, Itália e Portugal, no âmbito do programa europeu Erasmus+. Entre os cursos disponíveis, destaca-se o contributo da representação portuguesa, intitulado "Introdução à sala de Aula Invertida", com coordenação de Helena Belchior-Rocha, professora auxiliar do Iscte.

7. Outros registos da atualidade, a respeito da língua portuguesa:

 – Foi reeditada a primeira revista de culinária de língua portuguesa – Annona ou Misto Curioso –, que teve 36 fascículos entre 1836 e 1837.

– Para responder às necessidade do ensino do português no seu país, o embaixador da Guiné Equatorial em Portugal pede a criação de um corpo próprio de docentes no seio do Instituto Internacional da Língua Portuguesa (ver Correio da Manhã, 12/11/2023).

– Salientam-se igualmente as declarações da linguista Margarita Correia, defendendo que as crianças da Guiné-Bissau devem ser escolarizadas em crioulo e aprender o português como língua estrangeira, de modo a elevar o nível de literacia e contribuir para o desenvolvimento pessoal e social guineense (País ao Minuto, 13/11/2023).