1. A Guiné Equatorial foi integrada na Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) em 23 de julho de 2014 na Cimeira de Díli, sob duas condições: a abolição da pena de morte e a adotar o português como língua oficial, de par com o espanhol (ler aqui). Seis anos depois, o segundo compromisso estará, finalmente, prestes a ser concretizado. Pelo menos, Teodoro Obiang, presidente guinéu-equatoriano, parece assim disposto, conforme relata a jornalista Bárbara Reis no Público de 10/03/2020: «Se na Guiné Equatorial há uma escola espanhola, uma escola francesa e uma escola turca, porque não uma escola portuguesa? O presidente Teodoro Obiang Nguema Mbasogo gostou da ideia proposta pelo secretário-executivo da (...) CPLP [ o embaixador Francisco Ribeiro Telles], que esteve em visita oficial no país [juntamente com a linguista Margarita Correia, na sua qualidade de presidente do Conselho Científico do Instituto Internacional da Língua Portuguesa – Cf. ponto 4, em baixo] e comprometeu-se a financiar uma futura escola de língua portuguesa gerida pela CPLP.» Entretanto, registe-se que a página oficial do governo da Guiné Equatorial continua a ter versões em espanhol, em francês e em inglês, mas em português ainda não: à data desta Abertura, o português, apesar de figurar na lista de línguas disponíveis (menu no topo da página à direita), não é uma opção ativa, porque os conteúdos se mantêm em espanhol.
Sobre o compromisso assumido da abolição da pena de morte na Guiné Equatorial transcreva-se o que se lê a dado passo na notícia acima citada: «Na reunião com a delegação da CPLP, o Presidente Obiang disse que o seu Governo terminou um projecto de reforma profunda do Código de Processo Penal (CPP), no qual está prevista a abolição da pena de morte, e que em breve deverá ser entregue ao parlamento. Há mais de um ano, no entanto, que o regime de Malabo diz que essa reforma legislativa está “quase pronta”.»
2. A presente crise sanitária mundial, decorrente do alastramento da doença do coronavírus, confronta a informação mediática com o uso de neologismos terminológicos, muitos grafados sob numerosas variantes. Pergunta-se, então: que palavras se aplicam internacionalmente a esta doença e à sua causa viral? Como grafá-las? O Consultório procura ir ao encontro destas interrogações com uma resposta à volta da forma COVID-19, acrónimo fixado em 11/02/2020 pela Organização Mundial da Saúde. Outra pergunta, ainda, da presente atualização: em que aceção se emprega mais o nome classismo? E duas questões sobre gramática e escrita literária: como classificar duas construções introduzidas pela conjunção como numa carta de Monteiro Lobato (1882-1948) ? Que importância têm os deíticos no estilo de José Saramago (1922-2010)?
Na imagem à direita, mapa mundial indicativo da situação, em 11/03/2020, dos países afetados pelo surto de COVID-19 (fonte: "Surto de COVID-19", Wikipédia, consultado em 11/03/2020).
2. Associada a uma guerra de preços do petróleo entre a Federação Russa e a Arábia Saudita, a situação criada pela COVID-19 entre a população mundial repercute-se também na economia globalizada e nos mercados financeiros. Nos títulos notíciosos são recorrentes vocábulos e expressão como colapso (das bolsas), queda (das bolsas), recessão. Junta-se-lhes ainda o anglicismo sell-off, que pode ter vários equivalentes corretos em português, desde os simples venda ou liquidação a expressões compostas como «venda apressada (para se desfazer de ações na bolsa)», «venda (de ações) ao desbarato». Virando a atenção para o que se faz em línguas irmãs, refira-se que, para o espanhol, a Fundéu BBVA recomendou em 10/03/2020 o emprego alternativo de venta masiva e oleada de ventas, expressões adaptáveis sem dificuldade ao português como «venda maciça» e «onda de vendas». É fórmula correta, sobretudo, pela sua expressividade, a perífrase «onda de vendas», que já tem uso na escrita jornalística em português ("Onda de vendas acentua crise na Turquia", Dinheiro Vivo, 13/08/2018), com eventuais variações adjetivadas: «onda generalizada de venda».
3. A propósito de petróleo, ocorre evocar o nome geográfico Golfo Pérsico. Pois, passando ao domínio risonho dos prazeres da vida, entre eles, o de comer uma bela peça de fruta, quem havia de dizer que, por exemplo, a palavra pêssego é uma forma divergente de pérsico? Este é um dos cinco nomes de frutos com origem em topónimos, isto é, derivados de nomes de lugares ou regiões, a que o colaborador João Nogueira da Costa dedicou na sua página de Facebook um interessante apontamento etimológico, que agora se divulga em O nosso idioma.
4. Nos programas que a Associação Ciberdúvidas da Língua Portuguesa produz para a rádio pública portuguesa, são temas centrais:
– no programa Língua de Todos, transmitido pela RDP África, na sexta-feira, dia 13 de março, pelas 13h20*, algumas questões da nossa língua comum esclarecidas e comentadas pela professora Sandra Duarte Tavares, colaboradora do Ciberdúvidas: qual a diferença entre neologismos, estrangeirismos e empréstimos?
– no Página de Português, emitido pela Antena 2, no domingo, 15 de março, pelas 12h30*, a linguista Margarita Correia, professora na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e presidente do Conselho Científico do Instituto Internacional da Língua Portuguesa (IILP), aborda o que ficou decidido sobre o ensino do português na Guiné Equatorial, na sequência da sua recente deslocação a este país, integrada numa delegação da CPLP [ver ponto 1, em cima].
O programa Língua de Todos é repetido no sábado, dia 14 de março, depois do noticiário das 09h00; e o Páginas de Português tem repetição no sábado, dia 21 de março, às 15h30. Hora oficial de Portugal continental, ficando ambos os programas disponíveis posteriormente aqui e aqui.
1. A oralidade é, muitas vezes, o espaço das grandes inovações linguísticas. Num lento processo, a língua falada lima, transforma, deturpa. Este é um contexto onde a vigilância e o controlo da norma são menos eficazes, o que contribui para a criação de novas realidades lexicais, semânticas e sintáticas. É neste âmbito que se insere a ação da erosão linguística sobre a expressão «raios me/te partam», como se explica numa das respostas divulgadas na nova atualização do Consultório. É também na oralidade que encontramos registos da construção «combinar para», que aqui se analisa em contraste com os usos normativos. Numa outra resposta, explica-se que a expressão de realce «é que» é uma construção cuja origem se perde no tempo, sendo possível identificar a sua utilização já em textos de Padre António Vieira, o que parece contrariar a tese do seu decalque da construção francesa «c'est que». Apresentamos ainda uma resposta que trata os significados do nome tempo enquanto termo que designa meteorologia e tempo cronológico. Por fim, abordamos uma questão que envolve as construções com o verbo insistir.
2. Bem portuguesa é a questão-tag «não já?», usada no final de uma pergunta para confirmar uma determinada informação, cujos usos o jornalista e cronista Miguel Esteves Cardoso explora para concluir que os processos da significação se enredam em construções específicas que exigem um conhecimento profundo da língua para serem compreendidas. Exemplo disso é também o uso da expressão «pois não», cuja significação afasta o português do Brasil do português europeu (crónica divulgada no jornal Público, aqui transcrita com a devida vénia).
3. A palavra coronavírus entrou definitivamente no leque dos lexemas mais usados e ouvidos na atualidade. Numa viagem à sua origem, o professor universitário, escritor e tradutor Frederico Lourenço conta-nos parte da história dos caminhos da forma e da significação dos nomes corōna e vīrus, que se vieram a juntar para designar uma nova realidade. Duas palavras que «[p]or via da herança grega e latina, [...] têm uma história milenar, cuja viagem (pelo menos a reconstruível) começa com Homero e tem ponto de passagem no Novo Testamento», esclarece o autor num texto divulgado no seu mural de Facebook. Também o tradutor e professor universitário Marco Neves, influenciado pela omnipresença da palavra palavra da atualidade, enceta uma viagem à história da palavras vírus, que, ao longo do seu percurso de evolução, surge em Os Maias, de Eça de Queirós, numa altura em que o conhecimento desta nova realidade era considerado um real avanço da medicina (texto divulgado no blogue do autor, Certas Palavras, e aqui transcrito com a devida vénia).
4. A evolução dos processos articulatórios no campo do desenvolvimento da linguagem humana é uma área de estudos muito interessante e de âmbito muito complexo, dada a dificuldade em encontrar evidências que comprovem as teorias desenvolvidas. A revista National Geographic divulgou um estudo, considerado uma hipótese controversa, que procura associar o início da produção das consoantes fricativas /f/ e /v/ à diversificação dos alimentos, realidade que veio a alterar o processo de desgaste dentário, facilitando, assim, a reprodução destes sons (artigo disponível em linha aqui).
5. A leitura digital tem tido um crescimento extraordinário, tendo vindo a substituir, em inúmeras situações, a leitura em papel. Não obstante a rapidez e a facilidade associadas à leitura neste suporte, um estudo desenvolvido em Espanha demonstrou que a leitura em papel favorece a compreensão, até porque se associa a uma maior calma e concentração, que o mundo digital raramente propicia (ver notícia aqui). Estes resultados poderão também revelar-se pertinentes para a realidade portuguesa.Todavia, em sentido contrário, encontramos projetos que apostam no desenvolvimento das competências digitais, procurando, em muitos momentos, a centralidade das tecnologias no espaço da sala de aula (como nos relata a reportagem divulgada na Revista_2, separata do jornal Público). O equilíbrio entre a motivação que as tecnologias proporcionam e a construção da compreensão que o papel assegura mais eficazmente será um dos desafios da educação do século XXI.
6. Entre os eventos relacionados com a língua portuguesa, divulgamos a realização do Festival do Roteiro da Língua Portuguesa – Guiões –, que pretende criar um espaço propício à criação de guiões / roteiros que possam promover a criação e a produção cinematográfica em língua portuguesa. Este festival decorrerá em Lisboa, no cinema São Jorge, na Universidade Lusófona e na Cinemateca Portuguesa, nos dias 11 a 13 de março.
1. Dia 8 de março celebra-se o Dia Internacional da Mulher, data instituída oficialmente em 1957, pelas Nacões Unidas. Embora haja quem associe o dia a um momento de festejo, o seu mais profundo intuito é de protesto pelos direitos que as mulheres ainda não conseguiram ver reconhecidos. E é por esta razão que este dia mantém a sua essência. Com efeito, em pleno século XXI, continuamos a verificar a existência de direitos diferentes com base apenas na discrimunação de género. As mulheres continuam a ter salários inferiores para o mesmo trabalho, continuam a ter dificuldades em aceder a cargos de chefia nos diferentes domínios e muitas continuam a acumular empregos com tarefas domésticas e exercício da maternidade, para já não falar de outras diferenças mais gritantes ainda que se observam em diferentes culturas e em diferentes pontos do planeta. Também a linguagem sinaliza estas assimetrias, funcionando como uma projeção da forma como se concebe a sociedade. Recordemos o caso das profissões que não têm feminino ou cujo feminino tem dificuldades em impor-se. A este propósito, deixamos aqui apontamento das muitas respostas que o Ciberdúvidas tem tratado a respeito deste tema: «O feminino de guarda-noturno», «O feminino de palhaço», «Feminino de piloto aviador», «A Juíza + a aprendiza», «Capataz ou capataza?», «Ainda o feminino de capitão», «Feminino de escanção», «Qual o feminino de bombeiro?», «A tropa no feminino», «O feminino de gramático», «O feminino de músico», «Político-mulher» e ainda o artigo «Palavras à procura de feminino». A evocação dos direitos da mulher não nos deve permitir esquecer que continuam a fazer parte do quotidiano de muitíssimas mulheres terríveis situações de violência doméstica, algumas das quais resultam em feminícidio (palavra tratada aqui por diversas ocasiões «Ginocídio e feminicício», «Feminicício ≠ uxoricídio»). Esta é uma luta que a todos convoca. O Dia da Mulher é também motivo bastante para que recordemos aqui o texto intitulado «Porque sou feminista», da jornalista Anabela Mota Ribeiro, no qual, assumindo-se como exemplo, esta evoca todo um percurso de libertação e conquistas da mulher portuguesa ao longo de três gerações, passando também pela pintura de Paula Rego e pelas personagens femininas do escritor brasileiro Machado de Assis. Da mulher e das suas histórias à arte e ao mundo, vistos a partir do espaço doméstico onde a mulher existe e se reconstrói (texto divulgado no blogue pessoal da autora e que foi lido no International Seminar Female Public Intellectuals: critical thinking and social activism, com lugar na Universidade dos Açores, em 26 e 27 Setembro de 2019).
A propósito ainda do dia da «mais bela metade do mundo», como lhes chamou Jean-Jacques Rosseau: Vestidas de Negro + O Dia Internacional da Mulher ainda é necessário? Sim! Saiba porquê
Primeira imagem: Anjo, Paula Rego, 1998.
2. A acentuação resulta de um conjunto de convenções que procuram, em simultâneo, resolver questões especificamente associadas à representação dos sons. O caso dos sons nasais e, em particular, dos ditongos nasais exige um olhar atento que se proporciona nesta resposta que integra a atualização do Consultório. Nesta secção, encontramos ainda uma análise aos complementos do verbo falar e às preposições que este rege bem como a identificação da função sintática do constituinte que acompanha o nome pergunta em «pergunta sobre o sentido que a dada altura nos assalta». Apresentamos também duas respostas de âmbito lexical: uma sobre a existência e significado do verbo desadensar e outra que coteja os adjetivos favorito e preferido.
3. O preconceito racial confunde-se com a história de vários países. Portugal não é exceção e a sua língua, sendo permeável à cultura do povo que a fala, não permanece neutra, acabando por denunciar uma matriz discriminatória na base de algum do seu léxico. Partindo destes princípios, a professora e investigadora da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, Margarita Correia propõe, num artigo intitulado «A discriminação racial nos dicionários de língua», colocar novas questões relativas à forma como as palavras que designam conceitos relacionados com a raça e com a etnia deverão ser abordadas num dicionário: deve procurar-se o socialmente correto ou optar-se por uma perspetiva meramente descritiva?
4. Entre as notícias que se relacionam com a língua portuguesa, damos destaque a dois eventos:
– O Presidente português Marcelo Rebelo de Sousa foi o último convidado do «Camões dá que falar», promovido no dia 4 de março pelo Camões – Instituto da Cooperação e da língua. Aqui se falou do desafio que coloca a expansão da língua portuguesa e do seu ensino pelo mundo, considerando o orador que o grande desafio é o de promover a língua portuguesa como «língua universal» (ver notícia);
– A peça «A menor língua do mundo» está em cena até dia 15 de março no Teatro Nacional D. Maria II, em Lisboa. Trata-se de um texto que resulta de uma viagem da equipa artística por diferentes regiões do país ao encontro das línguas e dialetos que em Portugal e na Península Ibérica estão ameaçadas: «a língua gestual portuguesa, o minderico, o aragonês, o barranquenho e o mirandês entre outras», lê-se no texto de apresentação do espetáculo.
5. Nos programas que a Associação Ciberdúvidas da Língua Portuguesa produz para a rádio pública portuguesa, recordamos:
– A entrevista ao linguista Fernando Venâncio a propósito da sua obra Assim Nasceu uma Língua, no programa Língua de Todos, transmitido pela RDP África, na sexta-feira, dia 9 de março, pelas 13h20*;
– A entrevista dada pela professora Teresa Simão ao programa Página de Português, emitido pela Antena 2, no domingo, 8 de março, pelas 12h30*, abordando a sua obra Dicionário do Falar Raiano de Marvão.
O programa Língua de Todos é repetido no sábado, dia 7 de março, depois do noticiário das 09h00; e o Páginas de Português tem repetição no sábado, dia 14 de março, às 15h30. Hora oficial de Portugal continental, ficando ambos os programas disponíveis posteriormente aqui e aqui.
1. Em Portugal, por precipitação, descaso ou ignorância, acumulam-se perigosos sinais de descuido no que se escreve no espaço público. O Pelourinho regista duas situações críticas. Primeiro, a de um concurso televisivo, novamente aqui mencionado num texto de Sara Mourato, desta vez, por causa de uma questão ortográfica que não deveria gerar dúvidas: a dos nomes compostos que denotam espécies botânicas e zoológicas, sempre hifenizados. A segunda é abordada num apontamento de Carla Marques e centra-se no cartaz na apresentação pública da candidatura de um político português à Presidência da República: os erros detetados são incompatíveis com um processo eleitoral sério.
2. Há mais de três décadas, na voz de António Variações (1944-1984), ouvia-se na rádio ou na televisão portuguesas um estribilho que ao som de música rock dizia assim : «toma o comprimido, que isso passa». Mas, se a ordem do trepidante criador português fosse «"bebe" o comprimido», estaria ele a cometer um claro erro de impropriedade vocabular? A interrogação vem a propósito de uma das perguntas da presente atualização do Consultório, no qual são igual motivo de dúvida o regionalismo «de enxotão» e a história fonética do possessivo nosso. Realce ainda para duas questões sobre advérbios que contribuem para a coesão do discurso: como se analisa gramaticalmente a associação de um advérbio e uma conjunção como «também porque»? E como classificar justamente na sequência «justamente porque»?
3. Em contexto escolar, em Portugal e não só, os cursos de Ciências e Tecnologias do ensino secundário têm um tratamento diferente dos de Línguas e Humanidades do mesmo ciclo de estudos. Na rubrica Ensino, transcreve-se, com a devida vénia, do blogue da historiadora Raquel Varela, um texto intitulado "A excelência das Letras", no qual esta autora lamenta atitudes que denunciam uma menorização das Humanidades no ensino – e deixa um aviso: «Este desequilíbrio de fazer das ciências sociais e humanas o parente pobre vai pagar-se caro no futuro, é uma coisa, aliás, de um país atrasado, sem estratégia autónoma. E todos vamos pagar caro, quer os de ciências quer os de letras.»
4. Entre obras editadas nos últimos meses com interesse para uma visão da língua como fator de comunicação intercultural, são de realçar:
– O livro Alin-mane: Lusofonia e Cooperação na Área Educacional em Timor-Leste, organizado por Valdir Lamim-Guedes e Carlos Gontijo Rosa e sob a chancela da editora brasileira Na Raiz. Esta obra, disponível em formato eletrónico, dá conta da participação de um grupo de educadores brasileiros na atividade da Universidade Nacional de Timor-Leste, localizada em Díli, a capital timorense, no ano de 2012.
– A publicação de As Literaturas em Língua Portuguesa (Das Origens aos Nossos Dias), da autoria do professor José Carlos Seabra Pereira (Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra) e editado pela Gradiva com o apoio do Instituto Politécnico de Macau e do Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos. O volume vai ser apresentado, em 11 de março de 2020, na Livraria Buchholz, em Lisboa, pelo poeta e crítico literário Pedro Mexia e pelo académico e ensaísta António Feijó.
5. Mudando de tom e aflorando o debate contemporâneo* à volta da linguagem preconceituosa e de estratégias para a evitar, fica o registo do vídeo que adiante se mostra – "Aprendendo português sem palavras preconceituosas":
* Cf. "Da minha língua vê-se o preconceito", "A linguagem do ódio", "Palavras carregadas de preconceitos e tabus", "10 expressões racistas que deveríamos tirar do nosso vocabulário", "'Machista' e 'heteropatriarcal' a língua portuguesa?". Ler também Margarita Correia, "A discriminação racial nos dicionários de língua: tópicos para discussão, a partir de dicionários portugueses contemporâneos", Alfa – Revista de Linguística, v. 50, n.º 2, 2006.
6. Sobre os programas que a Associação Ciberdúvidas da Língua Portugues produz para a rádio pública portuguesa, assinale-se o Língua de Todos é transmitido pela RDP África, na sexta-feira, dia 6 de março, pelas 13h20*, enquanto o Página de Português tem nova emissão na Antena 2, no domingo, 8 de março, pelas 12h30*.
O programa Língua de Todos é repetido no sábado, dia 7 de março, depois do noticiário das 09h00; e o Páginas de Português tem repetição no sábado, dia 14 de março, às 15h30). Hora oficial de Portugal continental, ficando ambos os programas disponíveis posteriormente aqui e aqui.
1. O mês de março, que teve início ontem, tem o seu nome formado a partir de Martius (Marte), o deus romano da guerra, a quem este mês era dedicado. Antes do calendário juliano, era neste mês que o ano tinha início, o que coincidia com a chegada da primavera. Era o mês consagrado ao deus Marte porque nesta altura tinham início as campanhas bélicas. Há ainda países, como o Irão, em que o ano começa em março, nomeadamente a 20 de março, no momento do equinócio da primavera (mais detalhes associados ao mês de março aqui). Na tradição popular, o mês de março está associado a provérbios relacionados com a duração do dia solar («Em março, tanto durmo como faço»), com a instabilidade meteorológica («Março, marçagão, manhã de Inverno, tarde de Verão», «Em março, chove cada dia um pedaço.», «Lua cheia em março trovejada, trinta dias é molhada.») ou com a agricultura («Poda em março, vindima no regaço.», «Nasce a erva em março, ainda que lhe deem com o maço.», «Vento de março, chuva de abril, fazem o maio florir.») (outros provérbios relacionados com o mês de março aqui).
Este tema justifica também que recordemos algumas respostas relacionadas com o mês de março: «Hoje são 2 de março» e «Eram princípios de março».
Primeira imagem: Marte, de Diego Velázquez, 1640.
2. O termo empreendedorismo é frequentemente utilizado no domínio empresarial para referir a iniciativa de promover negócios inovadores que podem envolver alguns riscos. Embora seja já do domínio comum, a forma que este nome assumiu continua a oferecer dúvidas face à forma "empreendorismo", que aqui se esclarece, discutindo ainda a forma das palavras computorizado e computadorizado. Na atualização do Consultório, trazemos ainda uma resposta sobre a proximidade de significados dos adjetivos radioso e radiante. Os tempos verbais voltam a colocar problemas tanto no campo da correção como no da significação, como se observa pelo cotejo das frases«Talvez possa ir hoje» e «Talvez pudesse ir hoje». No campo da sintaxe, discutimos a regência de partícipe e a função sintática do adjetivo no sintagma «série televisiva». Uma nota ainda para o enriquecimento da resposta «Guitarra "vs." viola», com um esclarecimento sobre a tradução de guitarra e de viola para o inglês e uma precisão relativamente ao uso do termo guitarra em contexto formal em Portugal.
3. Na terça-feira, dia 3 de março, 14 estados norte-americanos realizarão as suas eleições estaduais para o processo de nomeação do candidato presidencial pelo Partido Democrata. É a designada superterça-feira. Dado que este termo tem assumido várias grafias na comunicação social escrita (ver aqui), aconselhamos a que a sua grafia assente na aglutinação de super a terça, mantendo-se o hífen já existente em terça-feira. Por outro lado, a palavra deve ser grafada com letra minúscula (uma opção similar é aconselhada para o espanhol pela Fundéu BBVA).
4. O coronavírus continua na ordem do dia, pelo que muito se escreve a propósito desta temática. Para além do que já aqui ficou recomendado (cf. Aberturas de 24/01/2020, de 30/01/2020, de 03/02/2020 e de 28/02/2020), remetemos para algumas precisões introduzidas pelo Fundéu BBVA que também se aplicam à língua portuguesa: as expressões «foco do vírus» ou «epicentro do vírus» são preferíveis a «epicentro do foco do vírus», que se revela redundante; a expressão «paciente zero» deve ser escrita com minúsculas e não necessita de aspas. A este propósito coloca-se também a questão da pronúncia de coronavírus que deve ser realizada como /kurônavírus/, não sendo correto pronunciar a primeira sílaba como "kô", pelo menos, entre os falantes de Portugal.
Cf.covid-19: em minúsculas e no feminino é a opção adotada no Ciberdúvidas da Língua Portuguesa.
5. Entre as notícias relacionadas com a língua portuguesa em sentido largo, destacamos:
– A atribuição do Prémio Literário Vergílio Ferreira ao professor da Universidade de Coimbra e ensaísta Carlos Reis, cuja cerimónia de entrega tem lugar hoje (2 de março) na Universidade de Évora (notícia);
– A reabertura do Museu da Língua Portuguesa, em São Paulo, no dia 25 de junho – cinco anos após o incêndio que o destruiu em 2015.
1. Falando de entretenimento mediático, volta-se novamente a atenção para um concurso muito popular da televisão pública em Portugal. Trata-se do Joker, um campeão de audiências, que com aflitiva despreocupação deixa incólumes vários erros de escrita e oralidade. Um caso recente com o vocábulo obus motivou o professor João Nogueira Costa a escrever um apontamento no Pelourinho, para lembrar que esta palavra é aguda (isto é, oxítona) – soa obus –, e não grave ("óbus"), como erradamente se pronunciou no programa em causa.
2. No consultório, evoca-se o escritor duriense João de Araújo Correia (1899-1985), a propósito de um curioso regionalismo de origem obscura: trata-se de manaxo, que, em Portugal, parece típico do vale do Douro e do norte das Beiras. Outros tópicos: como abreviar a palavra frei, sinónimo de freire e frade? Que tipo de complemento seleciona o verbo adaptar-se? A sequência «como te dê jeito» não deveria ser substituída corretamente por «como te der jeito»?
3. Afinal, em Portugal, o sotaque regional não inspira apenas a composição de personagens cómicas, à moda vicentina; também tem um reverso sombrio, por constituir fator de exclusão na procura de emprego. Na rubrica O nosso idioma, o preconceito linguístico – isto é, a discriminação em consequência da pronúncia que foge ao padrão –, é o tema que a jornalista Catia Mateus desenvolve num texto, transcrito, com a devida vénia, do caderno Emprego do semanário Expresso, do dia 23 de fevereiro de 2020. Ainda na mesma rubrica, outra transcrição, a da crónica que o escritor português Miguel Esteves Cardoso escreveu à volta das recordações de família que lhe desperta a locução «ao nível de» (texto do jornal Público, do dia 26/02/2020).
4. Face ao agravamento da propagação da doença do coronavírus, agora chamada COVID-19, a própria Organização Mundial da Saúde não descarta um cenário de pandemia e a multiplicação dos casos em todo o mundo. A situação pode até determinar mudanças na organização dos dois mais importantes eventos desportivos deste ano: os Jogos Olímpicos de Tóquio (entre 24 de Julho e 9 de agosto) e o Europeu itinerante de futebol (de 12 de junho a 12 de julho, em 12 cidades europeias). Em Itália, entretanto, anuncia-se que seis jogos de futebol se disputarão à porta fechada devido à propagação do coronavírus no país, considerada já muito preocupante. Para o espanhol, a Fundéu já identificou vários termos, tendo dado várias recomendações; para o português, entre palavras recorrentes nas notícias a respeito do tema, a lista inclui assintomático, contágio, contaminação, doença crónica, epidemia, infeção/infecção, infetado(s)/infectado(s), (médico) infecionologista/infecciologista, infodemia, pandemia, propagação (do vírus), sinofobia, quarentena, virose, etc. Cf. Aberturas de 24/01/2020, de 30/01/2020 e de 03/02/2020.
5. E já que se fala de léxico, refira-se o lançamento da plataforma Património Léxico da Gallaecia (PLG), coordenado pelo Instituto da Língua Galega (ILG) com a participação de equipa do Centro de Linguística da Universidade do Porto e outra do Centro de Estudos em Letras da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro. Esta nova ferramenta permite, conforme se lê no texto de apresentação em linha, «conhecer as diferentes unidades lexicais que servem para expressar uma série de conceitos e visualizar a sua distribuição territorial no noroeste da Península Ibérica, numa área que compreende a Eurorregião Galiza-Norte de Portugal e as zonas galegófonas das Astúrias e de Castela e Leão». As fontes de informação lexical utilizadas encontram-se entre as que «compilam léxico dialetal com a referenciação geográfica correspondente a territórios de fala galega ou dos municípios portugueses da Eurorregião».
6. Fazendo ainda referência ao léxico, mas já não de âmbito regional, registe-se como curiosidade um glossário que a publicação eletrónica Vortex Magazine reuniu sob o título "90 palavras da língua portuguesa que você (quase de certeza) não conhece". Na verdade, muitas das palavras elencadas até são bem conhecidas, mas outras há menos comuns, de caráter mais ou menos especializado, como asseidade, colédoco, gematria, humifuso, menorá, etc. Para saber os significados, consultar aqui.
7. Nos programas que a Associação Ciberdúvidas da Língua Portuguesa produz para a rádio pública portuguesa, têm destaque:
– no programa Língua de Todos, transmitido pela RDP África, na sexta-feira, dia 29 de fevereiro, pelas 13h20*, um depoimento do linguista Bernardino Calossa sobre o ensino do português em Angola,
– e, no programa Página de Português, emitido pela Antena 2, no domingo, 1 de março, pelas 12h30*, uma entrevista ao linguista Fernando Venâncio, sobre a publicação do livro que publicou em outubro de 2019, Assim Nasceu uma Língua.
O programa Língua de Todos é repetido no sábado, dia 29 de fevereiro, depois do noticiário das 09h00; e o Páginas de Português tem repetição no sábado, dia 7 de março, às 15h30). Hora oficial de Portugal continental, ficando ambos os programas disponíveis posteriormente aqui e aqui.
1. Era um jogo de futebol, e o desportivismo deveria ser inerente aos gestos e às palavras. Não foi o que aconteceu em 16 de fevereiro de 2020, no jogo entre o o Vitória de Guimarães e o Futebol Clube do Porto, durante o qual o jogador franco-maliano Moussa Marega foi insultado por adeptos da equipa minhota. A deceção pela derrota levou várias pessoas a dar voz a palavras e expressões de ódio, testemunhos verbais de práticas e visões racistas de um passado para não repetir. Fazendo a crónica deste triste incidente na rubrica O nosso idioma, a linguista Carla Marques, consultora permanente do Ciberdúvidas, dá conta de como o racismo, entre outras atitudes ofensivas da integridade humana, se inscreve na língua – e deixa um aviso: «[A] linguagem que usamos pode colocar-nos acima ou abaixo da linha da humanidade. A escolha é nossa!»
2. De histórias antigas de preconceito e discriminação se fala também no Consultório, a propósito da expressão tradicional «ruço de mau pelo». Mas os tópicos relativos à análise interna da língua igualmente estão igualmente de regresso na presente atualização: como se classifica o complemento do verbo pertencer? E a que subclasse gramatical pertencem, afinal, os advérbios efetivamente, efetivamente e decerto? Por último, uma resposta volta a abordar um uso do advérbio onde: deve apenas dizer-se «aonde vamos?», e «onde vamos?» é erro crasso?
3. Em vários pontos do mundo, o divertimento, a alegria esfuziante e a imaginação das máscaras marcam o Carnaval, tempo também de excessos e abusos que nenhuma tradição pode legitimar. No Brasil, país onde a festa é especialmente assinalada, a campanha Não É Não, começada em 2017, atinge, em 2020, 15 estados contra o assédio sexual, que cresce durante este período tão popular. Num artigo de 19/02/2020 da publicação digital Tornado, o jornalista brasileiro Marco Aurélio Ruy faz a reportagem da ação do referido movimento, que sublinha que «assédio é diferente de paquera» e «xingar de vagabunda» é evidente abuso – tudo isto se pode ler no título bem brasileiro que o autor dá ao texto: "Não seja um babaca no Carnaval e leve a lição contra o assédio para a vida toda". Recorde-se que babaca é termo muito utilizado no português brasileiro para designar, de forma insultante, uma pessoa tola, ingénua, boba, idiota ou de baixo intelecto.
Leia-se, ainda a reportagem No Carnaval brasileiro vale tudo, menos assediar, da autoria do jornalista João Ruela Ribeiro, no jornal "Publico" do dia 26/02/2020. Texto escrito segundo a norma ortográfica de 1945.
Na imagem à esquerda, Carnaval, de Candido Portinari (1903-1962).
4. Convém ainda lembrar que o Entrudo, nome mais tradicional desta festa, tinha e ainda tem uma função precisa no calendário de tradição cristã: trata-se de um introito, isto é, da preparação para a entrada no período de jejum e de abstinência da Quaresma. Sobre o Carnaval e a Quaresma, é já longa a lista de artigos e respostas em arquivo no Ciberdúvidas, mas aqui se deixa uma seleção: "Portugal, Alentejo, no Carnaval", "'Enfezar o Carnaval': etimologia", "'Enfezar o Carnaval', mais uma vez", "Entrudo, novamente", "Natal, Carnaval, Páscoa: palavras variáveis", "A palavra confete", "Do Carnaval ao futebol", "O Carnaval e o futebol são o ópio do povo»", "Partidas de Carnaval", "Sobre a origem de Quaresma"., "Etimologia de Quaresma, Pascoela, micareta, advento, educar e inteligente", "/Quarèsma/", "Quarta-Feira de Cinzas". E serve esta chamada de atenção também para informar que, devido à quadra festiva, a próxima atualização fica marcada para sexta-feira, 28 de fevereiro de 2020.
5. Comemora-se na presente data o Dia Internacional da Língua Materna, e vem, portanto, a propósito o artigo que a publicação em inglês The Visual Capitalist dedicou em 15/02/2020 às 100 línguas mais faladas no mundo. Baseando-se numa infografia divulgada pelas páginas do Wordtips, por sua vez, apoiado pela 22.ª edição do Ethnologue, o texto salienta alguns dados interessantes sobre o estatuto do português na história e na atualidade linguística mundiais: é uma das línguas da família linguística mais difundida no mundo, a indo-europeia; encontra-se entre as 10 mais faladas mundialmente, ocupando a 9.ª posição quanto ao número total de falantes nativos e não nativos; mas ascende à 6.ª posição, quando se conta o número de falantes nativos. Uma conclusão entre várias é que, em comparação com o inglês ou o espanhol, o chamado idioma de Camões precisa de ser mais dinâmico para se tornar 2.ª língua de muitos milhões de falantes.
6. No âmbito da promoção do português como língua internacional e de conhecimento, assinala-se a eleição de Margarida Mano, docente da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra (FEUC), para presidente da direção da associação FORGES-Fórum da Gestão do Ensino Superior nos Países e Regiões de Língua Portuguesa. Trata-se de uma instituição criada em 2011 que tem como principal objetivo promover uma rede de estudo e investigação na área da gestão e das políticas de ensino superior no espaço da língua portuguesa. Em nota de imprensa da Universidade de Coimbra (UC), data de 14/02/2020, a nova presidente da FORGES considerou que «[o] português é a língua mais utilizada no hemisfério sul e a sexta língua mais falada do globo», acrescentando que «o ensino superior tem particulares responsabilidades de um compromisso ativo na defesa da língua portuguesa e do seu papel na preservação da civilização e da cultura humanas» (ler também aqui no jornal regional As Beiras).
7. Nos programas que a Associação Ciberdúvidas da Língua Portuguesa produz para a rádio pública portuguesa, o tema comum é a leitura, em conversa com dois convidados:
♦ No programa Língua de Todos, transmitido pela RDP África, na sexta-feira, dia 21 de fevereiro, pelas 13h20*, entrevista-se Ana Sousa Martins, linguista e coordenadora da Ciberescola da Língua Portuguesa, a propósito da edição da obra Contos com Nível, especialmente dirigida a alunos de português língua estrangeira com cerca de um ano na aprendizagem do idioma.
♦ No programa Páginas de Português, emitido pela Antena 2, no domingo, 23 de fevereiro, pelas 12h30, convida-se o professor João Luís Lisboa, da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa a falar da necessidade que a atual sociedade do conhecimento tem de adquirir competências de leitura de diferentes textos – literários, informacionais, mediáticos.
O programa Língua de Todos é repetido no sábado, dia 22 de fevereiro, depois do noticiário das 09h00; e o Páginas de Português tem repetição no sábado, dia 29 de fevereiro, às 15h30). Hora oficial de Portugal continental, ficando ambos os programas disponíveis posteriormente aqui e aqui.
1. Ao contrário dos eufemismos, cujo conteúdo suaviza a alusão a certas realidades – caso de «ir desta para melhor», em vez de morrer –, fala-se de disfemismos quando em discurso se usam palavras e expressões desagradáveis e depreciativas que acentuam e dão vazão a sentimentos de amargura, rancor ou ódio. São bons exemplos as metáforas inspiradas no mundo natural: «seu burro!», «grande camelo!», «este tipo é um cepo». Sobre a criatividade linguística mobilizada e fixada ao longo de gerações, frequentemente para ofender e insultar, a professora Carla Marques, consultora permanente do Ciberdúvidas, desenvolve na rubrica O nosso idioma um curioso apontamento sobre as diferentes injúrias e imprecações do português.
2. Na rubrica Pelourinho, um erro indesculpável em televisão é tema de comentário: o uso da forma popular "tar" em lugar de estar, levando na escrita a confusões escusadas com o verbo ter. Recorde-se que esteve é a forma de estar na 3.ª pessoa do singular do pretérito perfeito do indicativo; mas teve é a flexão correspondente do verbo ter.
3. No Consultório, cinco novas perguntas: haverá algum adjetivo equivalente a «(pessoa) que tem memória de elefante»? O que é um não expletivo? Numa pergunta, a palavra ou a expressão interrogativas são seguidas de vírgula? Como distinguir casos de coesão lexical? E quando se torna obrigatório empregar a locução pronominal relativa «o qual»?
4. O escritor angolano Pepetela é o vencedor do prémio Prémio Literário do festival Correntes d’Escritas 2020, conforme o anúncio feito neste dia na cerimónia de abertura oficial deste encontro (ler também aqui). Trata-se de um acontecimento cultural que reúne escritores africanos, brasileiros e de expressão ibérica na cidade portuguesa da Póvoa de Varzim e se prolonga até 22 de fevereiro.
Além de outros escritos do escritor angolano Pepetela disponíveis no arquivo do Ciberdúvidas, vale a pena (re)ler, na rubrica Antologia, o texto "Uma língua que aceita brincadeiras" – especialmente escrito para uma sequência que envolveu o cabo-verdiano Germano Almeida, o guineense Carlos Lopes, o moçambicano Mia Couto e o português José Saramago.
5. Um comportamento recorrente na história de qualquer língua é empregar velhas palavras para aplicar a novos referentes. Foi o caso de faia, que, nos Açores e na Madeira, passou de denominação da Fagus sylvatica a termo identificativo da Myrica faya; ou, entre os topónimos, o de Santarém, nome latino-romance de uma cidade portuguesa de origens romanas e de uma cidade brasileira fundada no século XVII. A expansão e colonização europeias a partir do século XV marcaram uma época fértil em situações destas, bem conhecidas na evolução do português. A propósito deste tema, assinale-se o artigo que, no blogue Travessa do Fala-Só, o tradutor Vitor Lindgaard dedica, em 17/02/2020, a nomes como milho e feijão, de etimologia europeia bastante antiga, mas que hoje denotam plantas importadas do continente americano há mais de trezentos anos.
6. Entre iniciativas académicas com interesse para a promoção da língua portuguesa, merecem registo:
– Neste dia, 19 de fevereiro, o conjunto de atividades abertas à comunidade que a Universidade de Aveiro organiza, focando a importância da diversidade cultural para as relações humanas e para a sociedade. É uma iniciativa que se insere na comemoração, em 21 de fevereiro p. f., do Dia Internacional da Língua Materna.
– O colóquio Línguas de Camões. O que pode e o que quer o português língua estrangeira?, a realizar em 11 de março de 2020 na Faculdade de Ciências de Humanas da Universidade Católica Portuguesa. A conferência de abertura é do professor Roberto Vecchi, especialista de literatura portuguesa na Universidade de Bolonha. As inscrições são até 4 de março (mais informação aqui).
7. Sobre os programas de rádio que a Associação Ciberdúvidas da Língua Portuguesa produz para a rádio pública portuguesa, uma chamada de atenção para o programa Língua de Todos, transmitido pela RDP África, na sexta-feira, dia 21 de fevereiro, pelas 13h20*, e para o Páginas de Português, que tem mais uma emissão na Antena 2, no domingo, 23 de fevereiro, pelas 12h30.
O programa Língua de Todos é repetido no sábado, dia 22 de fevereiro, depois do noticiário das 09h00; e o Páginas de Português tem repetição no sábado, dia 29 de fevereiro, às 15h30. Hora oficial de Portugal continental, ficando ambos os programas disponíveis posteriormente aqui e aqui.
1. De onde vêm as palavras? Que percursos realizaram para chegar até nós com a roupagem que hoje trazem? Dúvidas desta natureza ocorrem muitas vezes aos falantes e algumas delas chegam ao Consultório do Ciberdúvidas. Na nova atualização, ocupamo-nos da etimologia do substantivo noite, que se explica vir de uma forma do latim vulgar. As palavras que se apresentam como novas aos falantes que as pretendem converter à forma escrita são, por vezes, feitas de sons que parecem resistir à grafia. Como selecionar, então, a melhor solução ortográfica? Hoje, fazemos essa reflexão a propósito da palavra ianomâmi, referente a uma tribo indígena brasileira, à procura de uma forma que a torne clara para as diferentes variantes do português. Em palavras como mares, rapazes, dores e luzes, o e que surge antes da consoante s faz parte do sufixo de plural ou pertence ao radical da palavra? As conjunções, ao estabelecerem nexos entre segmentos textuais, podem não traduzir sempre o mesmo valor. É o que sucede com a conjunção enquanto na frase «Enquanto não trouxermos o estrangeiro até à nossa língua, teremos ficado apenas a meio do caminho», na qual se afasta do seu valor típico de localização de um intervalo de tempo que inclua a situação descrita na oração subordinante. Por fim, uma reflexão sobre as diferenças entre a modalidade epistémica e a modalidade apreciativa.
Primeira imagem: Noite Estrelada, pintura de Vincent van Gogh,1889
2. Adotando como tema central a questão da expansão e afirmação da língua portuguesa no plano internacional, o jornalista, escritor e ex-ministro da Comunicação Social angolano João Melo advoga que a defesa da língua deve constituir um objetivo comum a todos os países de língua portuguesa, que têm de conseguir ultrapassar os seus "traumas" de fundo histórico para se unirem em torno deste objetivo estratégico, fundamental para a sua afirmação no plano internacional. Defende, ainda, que a existência de um acordo ortográfico, comum a todos os países é vital para se atingir com sucesso esta meta (artigo originalmente publicado no Diário de Notícias, aqui transcrito com a devida vénia).
3. Ainda a propósito do mundo cinematográfico e dos seus prémios e festivais, a lexicógrafa Ana Salgado organizou um pequeno apontamento onde se esclarecem as regras a adotar para grafar títulos de documentários, de eventos cinematográficos, de prémios e de categorias de prémios, um texto divulgado na plataforma Gerador.
4. Numa altura em que Portugal parece estar próximo de atingir a média europeia em termos de abandono escolar, há outro problema estruturante que emerge: os alunos que, estando na escola, não aprendem quase nada. Refletindo sobre o tema, no artigo O perfil dos que não aprendem, divulgado no jornal Público, Isabel Flores, secretária-geral do IPPS-ISCTE, analisa os indicadores ligados à família destes alunos muito fracos, comparando-os com a média nacional. Assinala ainda as razões justificativas do insucesso apontadas por diretores e pelos próprios alunos. Uma reflexão importante para a definição de caminhos suscetíveis de integrar estes alunos, que não podem viver à margem da escola sob pena de estarem condenados a permanecer à margem da sociedade.
5. No plano das notícias relacionadas com a língua e cultura, destacamos:
– A cerimónia de apresentação pública do Programa Indicativo de Ação Cultural Externa para 2020, que tem lugar no próximo dia 19 de fevereiro, pelas 11h30, no Ministérios dos Negócios Estrangeiros;
– O projeto da TDM rádio Macau, que, a partir de Macau, China, produz uma emissão de 24 horas com conteúdos totalmente em português. Trata-se de uma rádio com milhares de ouvintes, pelo que o projeto tem relevância para a promoção da língua portuguesa (notícia).
1. Na atualização do Consultório, a pontuação volta a motivar uma questão, desta feita relacionada com as expressões «ave Maria» e «salve Maria», relativamente às quais se pretende determinar se deveriam ter vírgula antes dos nomes próprios, que têm a função de vocativo, apesar de na tradição religiosa tal não fazer parte dos usos. Uma resposta esclarece que a concordância do verbo haver com sentido temporal com o verbo principal é considerada de regra pela linha mais tradicional de gramática. Todavia, parece verificar-se alguma tendência para a cristalização do verbo no presente do indicativo. Ainda neste contexto, há situações de especialização de usos que importa considerar, uma vez que o verbo haver tanto pode contribuir para a expressão da duração («Ele faz este trabalho há dois anos.») como para a localização («Ele fazia este trabalho há dois anos.») e, nestes casos, como aqui se explica, a concordância pode interferir nos sentidos veiculados. Esclarece-se ainda o significado da expressão latina «in Liborium», usada por Camilo Castelo Branco na obra A queda de um anjo. Por fim, uma questão sobre a compatibilidade do adjetivo quieto com o verbo ser e uma outra sobre a regência do adjetivo coetâneo.
Primeira imagem: Ave Maria, de Paul Gauguin, 1891.
2. A despenalização da morte assistida será discutida na Assembleia da República portuguesa no próximo dia 20 de fevereiro (ver notícia). Este debate traz à atualidade vocábulos e expressões como «suicídio assistido», «morte assistida» ou eutanásia, cujos significados importa esclarecer. A eutanásia significa, etimologicamente, "morte sem sofrimento" ou "morte boa". Este termo é utilizado para referir um ato praticado por alguém com o objetivo de proporcionar uma morte sem sofrimento a um paciente terminal, afetado por dores intoleráveis, a pedido deste último, que deseja intencionalmente pôr fim à vida. O «suicídio assistido» é um ato praticado pelo paciente, que, encontrando-se numa situação de doença terminal, com dores insuportáveis, decide pôr termo à vida. Neste caso, a função de um terceiro será a de facilitador/colaborador, pois apenas ajuda, de forma indireta, o paciente a autoadministrar os fármacos letais. Em termos sintéticos, a diferença entre os dois termos reside no agente responsável pela ação de pôr termo à vida. O conceito de «morte assistida» engloba a eutanásia e o «suicídio assistido». Pode usar-se, ainda, o termo ortotanásia, que se refere à situação de suspensão ou de minimização dos tratamentos destinados a prolongar a vida de um paciente em situação terminal. O contrário de ortotanásia é a distanásia, que designa a ação de prolongar a vida de um paciente terminal através do recurso desproporcionado a tratamentos ou máquinas.
O Ciberdúvidas abordou já questões linguísticas relacionadas com esta temática, como se pode recordar nas respostas «Eutanásia», «Eutanásico» e «Bioética».
3. COVID-19 é a designação atribuída pela Organização Mundial de Saúde à doença provocada pela ação do coronavírus. O nome escolhido é um acrónimo formado a partir do inglês "coronavirus disease". Trata-se de um nome próprio que deve ser escrito com letras maiúsculas e com um hífen antes de 19, opção que segue as indicações da Classificação Internacional de Doenças. O vírus, por seu turno, foi designado oficialmente SARS-CoV-2. Isto significa que afirmações como «contágio por coronavírus Covid-19» não são corretas, devendo ser substituídas por «contágio por SARS-CoV-2». Tal como indica a Fundéu, para o espanhol, o que também se aplica ao português, se se preferir lexicalizar o nome da doença, usando-o como substantivo comum, a palavra deverá ser escrita em minúsculas, não usando maiúscula inicial (covid-19). Quando se designa a doença pelo nome, será correta uma afirmação como «(A doença) COVID-19 continua a fazer vítimas».Cf. A locução «à tona de», o verbo discriminare o termo infodemia – campo aberto para manifestações de sinofobia
4. O professor universitário e tradutor Marco Neves lança, no dia 18 de fevereiro, um novo livro intitulado Almanaque da Língua Portuguesa (ed. Guerra e Paz). Trata-se de uma publicação que, segundo a editora, é «uma homenagem feliz à língua portuguesa. Aqui se contam histórias deliciosas, curiosidades e efemérides incríveis. Aqui se resolvem dúvidas e erros. Um livro divertido e inspirador». A obra inclui ainda as listas de erros mais irritantes e palavras mais feias e bonitas do português, na opinião dos leitores do blogue Certas Palavras.
5. «Se ti sabir, ti respondir; se non sabir, tazir, tazir»1. Esta frase retirada do Burguês gentil-homem, uma comédia ballê, de Molière, de alguma forma, soa-nos familiar, ao mesmo tempo que traz estranheza. Isso acontece porque está escrita não em francês mas em sabir, uma língua franca que se falou no Mediterrâneo durante séculos e que desapareceu completamente. Tratava-se de uma língua oral, usada como facilitadora por diplomatas, comerciantes e marinheiros e que resultava, julga-se, de uma mescla do italiano, com os seus dialetos, com espanhol, provençal, português, árabe, turco e línguas berberes. Seria falada no Mediterrâneo oriental e nos portos de Tripoli, Tunes e Argélia e ainda, possivelmente, em Marrocos. Estes e outros pormenores relacionados com o sabir poderão ser lidos no artigo da BBC News, redigido em espanhol (aqui).
6. A vida e a obra de João Malaca Casteleiro constituem o tema central dos programas produzidos pela Associação Ciberdúvidas da Língua Portuguesa para a rádio pública portuguesa. O linguista, recentemente falecido, é aqui evocado pelas palavras de Margarita Correia, professora da Faculdade de Letras de Lisboa e presidente do Conselho Científico do Instituto Internacional da Língua Portuguesa, e pelo gramático brasileiro Evanildo Bechara.
O programa Língua de Todos é repetido no sábado, dia 15 de fevereiro, depois do noticiário das 09h00; e o Páginas de Português tem repetição no sábado, dia 22 de fevereiro, às 15h30). Hora oficial de Portugal continental, ficando ambos os programas disponíveis posteriormente aqui e aqui.
1. «Se sabes, responderás; se não sabes, silêncio, silêncio.»
Este é um espaço de esclarecimento, informação, debate e promoção da língua portuguesa, numa perspetiva de afirmação dos valores culturais dos oito países de língua oficial portuguesa, fundado em 1997. Na diversidade de todos, o mesmo mar por onde navegamos e nos reconhecemos.
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