Aberturas - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
 
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Por Ciberdúvidas da Língua Portuguesa

1. O fecho das escolas foi uma das consequências da pandemia. Esta situação tem obrigado professores, responsáveis políticos e diversos agentes da comunidade a repensar os processos de ensino, em busca de soluções.  Foi o caso de Portugal, com o  regresso do ensino a distância, segundo o modelo da telescola, como forma de apoiar o percurso formativo dos alunos até ao 9.º ano de escolaridade. Os conteúdos serão transmitidos na RTP Memória, canal de acesso universal, disponível na TDT (Televisão Digital Terrestre). A Ciberescola da Língua Portuguesa, da responsabilidade da Associação Ciberdúvidas da língua Portuguesa, desenvolverá também um projeto em parceria com a Direção-Geral de Educação (DGE), com o objetivo de assegurar aulas por videoconferência a alunos estrangeiros. 

2. Atento à evolução da situação relacionada com a covid-19, o Ciberdúvidas da Língua Portuguesa continua a enriquecer e a rever o documento A covid-19 na língua, introduzindo novos termos e relacionando-os com o contexto em que são utilizados e com a realidade que convocam, sempre numa ótica de serviço público. O documento encontra-se disponível na rubrica O Nosso Idioma, estando em constante atulização.

3. As palavras têm ocupado o nosso quotidiano de forma proeminente. Embora muitos vivam atualmente confinados ao espaço de suas casas, é por meio das palavras que conseguem acompanhar e compreender a realidade dos acontecimentos. Algumas trazem consigo um mundo negativo que arrasta sentimentos do foro pessimista e derrotista, outras trazem esperança de mudança e de regresso à normalidade. É sobre o poder das palavras que reflete a professora Carla Marques neste apontamento

4. A linguista Margarita Correia deixa-nos um depoimento laudatório sobre a linguista Maria Helena Mira Mateus, recentemente falecida. Recordando o seu vasto trabalho na área da linguística e as suas qualidades como investigadora e como pessoa, Margarita Correia oferece-nos o retrato de uma mulher exemplar (depoimento oral para os programas de rádio Língua de Todos e Páginas de Português, transcrito em O Nosso Idioma). 

5. São também as palavras, neste caso luva  máscara, que motivam uma viagem pelo seu percurso de formação, proposta pelo professor universitário e tradutor Marco Neves, que dá atenção a estes termos tão presentes no nosso léxico ativo (crónica disponível no blogue Certas Palavras). 

 

6.  A RTP está a repor  séries anteriores do magazine televisivo Cuidado com a Língua!As questões da língua, as suas dificuldades, curiosidades e a correção de alguns erros podem ser acompanhados às terças-feiras, na RTP1, às 14h30, e ao domingo, na RTP2, pelas 20h20. 

7.  Dia 5 de abril, foi Domingo de Ramos. Pensando na origem deste ritual religioso, o professor universitário Frederico Lourenço  escreveu um texto que parte em busca da referência à presença de ramos na celebração desta data nos textos bíblicos, tendo concluído que não se trata de uma menção comum a todos os evangelhos, não obstante a importância que este elemento veio a assumir mais tarde. 

8. Recordamos que o regresso às atualizações do Consultório terá lugar a 15 de abril p. f. Até lá, fica desativado o acesso ao formulário para envio de perguntas, mas, para assuntos que não digam respeito a dúvidas linguísticas, mantêm-se disponíveis os contactos habituais. E, como sempre, temas da atualidade ficarão devidamente assinalados nos Destaques  e na nossa página do Facebook.

Por Ciberdúvidas da Língua Portuguesa

1. A omnipresença nefasta do vírus SARS-CoV-2, que ameaça a existência real da humanidade, não deixa de se manifestar virtualmente nas conversas quotidianas ou nas notícias que chegam insistentemente às nossas casas. Este assunto passou a ser quase único, o que tem gerado, no plano linguístico, a ativação de léxico adormecido (ou até agora usado em contextos muito circunscritos), a criação de novas palavras, a extensão semântica de várias outras ou a formação de campos lexicais até ao momento inexistentes ou pouco prováveis. O Ciberdúvidas tem acompanhado atentamente esta dinâmica linguística e tem vindo a esclarecer, em diferentes aberturas, significados de palavras, contextos de uso e as suas formas corretas. Este trabalho conduziu à compilação de um documento (que se encontra em constante atualização) que reúne em A covid-19 na língua, contemplando diversas áreas que têm vindo a ser referidas na atualidade mediática, e que envolvem conceitos da área médica, da economia, da política, da estatística, da educação e da comunicação social, entre outras. Uma realidade complexa que aglutina inúmeros domínios do saber e que, portanto, convoca léxico específico, cujos significados e contextos de uso importa conhecer para compreender a estranha realidade que vivemos, sempre com a convicção de que o futuro que se avizinha poderá significar o retorno à nossa antiga forma de vida e ao nosso modo de sermos humanos. 

Ainda no âmbito das expressões usadas com frequência, uma vez que a comunicação não presencial vai sendo uma constante, recordamos que deve dizer-se «a pessoa x fala-nos de sua casa» (e não «*desde sua casa» ou «*a partir de sua casa») e «a pessoa y dá aulas/trabalha em sua casa» (e não «*a partir de casa»).

A este propósito, recordemos as respostas «Disparatado desde», «... do estádio» e não "desde" o estádio...» e «A construção «desde... até...» com sentido temporal».

2. No século XVI, uma doença desconhecida espalhou-se pelas Ilhas Molucas, passando das galinhas para os humanos. Este mal converteu-se numa epidemia que vitimou, de forma nunca vista, inúmeros habitantes das ilhas: «E por toda a terra era este mal tão geral que os não podiam enterrar e o mar era coalhado dos mortos e muitos lugares despovoados; andavam os homens e mulheres como pasmados, dizendo que nunca tal viram nem ouviram aos antepassados», conta-nos o autor do Tratado das ilhas Maluco e dos constumes índios e tudo o mais (texto geralmente atribuído a António Galvão, governador português das Ilhas Molucas entre 1536 e 1540). Este é um texto que, cinco séculos depois, nos recorda a importância e a eficácia do isolamento no controlo da propagação das doenças desta natureza. Com efeito, na altura, a disseminação da infeção não atingiu outros países dado o isolamento das ilhas e a falta de vento, que impediu a chegada de comerciantes de especiarias. Nos dias de hoje, a facilidade de viajar para diferentes pontos do planeta, independentemente da sua distância ou dos ventos, permitiu que a infeção pelo novo coronavírus se convertesse numa pandemia, chegando a quase todo o lado. Por isso, resta-nos aprender com a experiência dos nossos antepassados: ontem como hoje, o isolamento é profilático e pode salvar vidas (leia-se o texto que apresenta a obras e as conclusões que esta suscitou em O Nosso idioma – um original da agência Lusa aqui transcrito com a devida vénia).

3.  Um destaque, ainda,  para o importante trabalho que, em Portugal,  tem vindo a ser desenvolvido pelos intérpretes para língua gestual portuguesa que têm acompanhado todas as comunicações oficiais dos vários organismos do governo ou da presidência da República transmitidas pelos canais televisivos. Um verdeiro serviço público que permite à comunidade surda acompanhar de modo informado a evolução da situação, com destaque neste trabalho publicado no  Diário de Notícias

4.  Os programas produzidos pela Associação Ciberdúvidas para a rádio pública portuguesa são inteiramente dedicados à linguista e professora universitária Maria Helena Mira Mateus, recentemente falecida. No Língua de Todos, divulga-se um extrato de uma antiga entrevista dada a propósito da pluralidade linguística dos alunos do ensino básico na zona da Grande Lisboa (RDP África, na sexta-feira, dia 3 de abril, pelas 13h20*). O Página de Português recupera também uma entrevista que a professora deu a propósito do lançamento da sua autobiografia Uma vida cheia de palavras (aqui apresentado) (Antena 2, no domingo, 5 de abril, pelas 12h30**). Ambos os programas contarão ainda com depoimentos sobre Maria Helena Mira Mateus. 

 

5. Como  foi referido na Abertura de 27/03/2020, o Consultório do Ciberdúvidas faz uma pausa coincidente (em condições normais) com a das atividades escolares em Portugal durante o período da Páscoa *. O regresso às atualizações está marcado para 15 de abril p. f. Até lá, fica desativado o acesso ao formulário para envio de perguntas, mas, para assuntos que não digam respeito a dúvidas linguísticas, mantêm-se disponíveis os contactos habituais. E, como sempre, temas da atualidade ficarão devidamente assinalados nos Destaques  e na nossa página do Facebook.

*O programa Língua de Todos será repetido no sábado, dia 4 de abril, depois do noticiário das 09h00.

**O Páginas de Português  tem repetição no sábado, dia 11 de abril, às 15h30.

 Hora oficial de Portugal continental, ficando ambos os programas disponíveis posteriormente aqui e aqui.

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1. Faleceu a linguista e professora universitária portuguesa Maria Helena Mira Mateus (Carcavelos, 18 agosto 1931 – 30 de março de 2020), figura cimeira dos estudos linguísticos sobre o português (cf. notícia agência Lusa em 31/03/2020*). Licenciada em Filologia Românica em 1954 e doutorada em Linguística Portuguesa em 1974, na Universidade de Lisboa, Maria Helena Farmhouse da Graça Mira Mateus era professora catedrática jubilada da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa (FLUL), onde foi docente durante mais de três décadas. 

Distinguindo-se pelo seu extraordinário dinamismo e poder de iniciativa, foi fundadora e presidente da direção da Associação de Professores de Português (1978-1984) e da direção da Associação Portuguesa de Linguística (1984-1986 e 2000-2004). Dirigiu também a Revista Internacional de Língua Portuguesa do n.º 1 (1988) ao n.º 17 (1997); e de 1986 a 1989 foi vice-reitora da Universidade de Lisboa.

A ação de Maria Helena Mira Mateus foi notável no desenvolvimento científico e institucional da investigação na área do processamento informático da língua portuguesa: em 1986, o presidente da Junta Nacional de Investigação Científica e Tecnológica incumbe-a de criar o grupo português do Projeto de Tradução Automática da CEE, EUROTRA; em 1989, fundou e presidiu (até 2012) à direção do Instituto de Linguística Teórica e Computacional (ILTEC), – entidade hoje integrada no CELGA-ILTEC (unidade criada em 2015, em fusão com Centro de Estudos de Linguística Geral e Aplicada da Universidade de Coimbra). Foi no ILTEC que se desenvolveram trabalhos com significado para a definição dos usos padronizados e institucionais da língua, como sejam o Observatório de Neologia do Português, o projeto Bilinguismo, aprendizagem do Português L2 e sucesso educativo na escola portuguesa, a Rede de Difusão Internacional do Português: rádio, televisão e imprensa (REDIP) e o Portal da Língua Portuguesa.

Numerosos são os artigos de que é autora em revistas portuguesas e estrangeiras sobre as áreas da sua investigação (com particular incidência na fonologia do português europeu) e sobre questões de linguística geral, especialmente no que toca às políticas de língua e à teoria da gramática generativa. Entre as obras que escreveu ou coordenou, têm destaque, Aspetos da Fonologia Portuguesa (1975), Fonética, Fonologia e Morfologia do Português (1991), The Phonology of Portuguese (2000, com Ernesto d'Andrade), A Face Exposta da Língua Portuguesa (2002), Gramática da Língua Portuguesa (2003, com Ana Maria Brito, Inês Duarte, Isabel Hub Faria, entre outras), Linguística (2006, com Alina Villalva), Norma e Variação (com Esperança Cardeira), A Língua Portuguesa. Teoria, Aplicação e Investigação (2014); e em 2018 publicou um livro de memórias, Uma Vida Cheia de Palavras.

Conferencista e orientadora de cursos de graduação e de pós-graduação, organizou e colaborou em seminários e colóquios em Portugal e no estrangeiro, com especial referência ao Brasil, a Moçambique, a Cabo Verde e a Macau.

Maria Helena Mira Mateus foi homenageada em várias ocasiões, sendo de realçar a cerimónia que a FLUL realizou em 24 de maio de 2017, marcada com a criação de uma sala com o seu nome na mesma instituição.

Também aqui no Ciberdúvidas da Língua Portuguesa se registam algumas das intervenções de M.ª Helena Mira Mateus na comunicação social portuguesa a propósito de questões de ensino e política linguística: "Pode estudar-se a língua materna?" (transcrição do Expresso, 24/04/2004), "Terminologias: a nova e a antiga" (Público, 29/11/2006), "Viver em diversidade" (Expresso, 08/12/2006), "O ensino da gramática e a terminologia" (13/12/2006), "Em defesa da diversidade linguistica" (Público, 26/09/2007). Ler também "Sobre a natureza fonológica da ortografia da língua portuguesa". Por várias vezes foi também entrevistada no programa  Páginas de Português, transmitido na Antena 2 (por exemplo, entre outras emissões, aqui ou aqui).

A familiares, amigos e colegas da professora Maria Helena Mira Mateus, também o Ciberdúvidas da Língua Portuguesa exprime pesar, não deixando de sublinhar o contributo marcante da sua personalidade e visão para o conhecimento e promoção da língua portuguesa.

* Cf. também notícias saídas em 31/03/2020 nos jornais Observador e Público, bem como na RTP Notícias, com origem  na agência Lusa. Registo ainda para as notas da Imprensa Nacional-Casa da Moeda,  da Associação de Professores de Português,da Associação Brasileira de Linguistas (ABRALIN) e do Centro de Linguística da Universidade de Lisboa. Fonte da imagem à esquerda: Associação Portuguesa de Linguística.

 

2. Com  foi referido na Abertura de 27/03/2020, o Ciberdúvidas faz uma pausa coincidente (em condições normais) com a das atividades escolares em Portugal durante o período da Páscoa *. O regresso às atualizações está marcado para 15 de abril p. f. Até lá, fica desativado o acesso ao formulário para envio de perguntas, mas, para assuntos que não digam respeito a dúvidas linguísticas, mantêm-se disponíveis os contactos habituais. E, como sempre, temas da atualidade ficarão devidamente assinalados nos Destaques  e na nossa página do Facebook.

*A palavra Páscoa vem do latim vulgar pascua, que significa “alimento (pasto)”, sentido que se associa ao facto de a Páscoa ser o momento que põe fim ao tempo de jejum que marca a Quaresma. A palavra latina teve origem no hebreu pasach (“passagem”), designação dada à comemoração judaica que evocava a fuga do Egito pelo povo de Israel e que tinha lugar na altura da crucificação de Jesus. Esta designação terá servido de inspiração para o nome da festa cristã que celebra a Ressurreição de Jesus Cristo.

 

 

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1. Por todo o mundo, é difícil fugir ao mesmo assunto: a pandemia da covid-19, que, em Portugal, entrou na chamada «fase de mitigação», conforme declaração da Direção-Geral de Saúde (DGS). Pelo uso de  mitigação, que significa «alívio», poderia julgar-se que a covid-19 recuou entre a população portuguesa, mas infelizmente a DGS esclarece que «a fase de mitigação é a terceira e a mais grave fase de resposta à doença covid-19 e é ativada quando há transmissão local, em ambiente fechado, e/ou transmissão comunitária». Mas não haverá aqui um uso impróprio do termo? Na rubrica O nosso idioma, a linguista Carla Marques, consultora permanente do Ciberdúvidas, mostra que a denominação não é contraditória.

2. O Consultório faz eco do impacto da covid-19 no quotidiano de quem acompanha o Ciberdúvidas: comenta-se a locução «(estar/ficar) de quarentena»; a propósito de desinfeção e higiene, fala-se do plural e da grafia das  formas «álcool-gel» e «álcool gel», equivalentes a «álcool em gel»; e da construção «testar positivo/negativo», que os padrões léxico-semânticos e morfossintáticos do português podem pôr em causa. Entretanto, em confinamento doméstico, professores e alunos enviam perguntas mais técnicas: a respeito da seleção de modos verbais nas orações relativas; sobre o contraste entre o Brasil e Portugal quanto à escrita de porque e por que em frases interrogativas; acerca da eventual relação de um modificador do nome com um predicativo do sujeito.

3. Com as sombrias perspetivas do atual cenário de pandemia, é recorrente falar-se em guerra, como bem ilustram os títulos «No mundo, líderes adotam discursos de guerra contra pandemia» (O Tempo, 23/03/2020) ou «Covid-19: o secretário-geral da ONU, António Guterres, defende "economia de guerra"» (Euronews, 26/03/2020). E, na Europa, regressam velhos preconceitos à cena política – a propósito da reunião informal do Conselho da Europa de 26/05/2020 *; por reação, sente-se,o desejo de, um dia, se abrirem todas as portas e janelas, reais ou imaginárias. À volta das palavras guerra e e janela, sugere-se, ainda na rubrica O nosso idioma, dois apontamentos etimológicos da autoria de João Nogueira da Costa. Do mesmo autor é também um pequeno artigo dedicado às maneiras de se dizer «gratificação» em diferentes línguas.

*Cf. "Costa considera discurso de ministro holandês "repugnante" e anti-União Europeia" (Público, 27/03/2020)

Na imagem, à esquerda, Janela 17 (1981), de Maluda (1934-1999).

4. Entretanto, os governos não deixam de tomar medidas para conter a crise económica que se desenha. Tendo como pano de fundo uma conversa telefónica entre Donald Trump, presidente dos Estados Unidos, e Xi Jinping, presidente da China, o G20 (o grupo constituído por 19 países e pela União Europeia), «disse que  injetaria 5 "triliões" de dólares na economia global para combater a pandemia», conforme se lê numa notícia do jornal português Diário de Notícias (27/03/2020). Sabendo que todo o cuidado é pouco com os termos bilião e trilião, porque, em português, não significam eles o mesmo que em inglês, da consulta da notícia em versão anglo-saxónica  infere-se haver equívoco da publicação portuguesa. Na verdade, se a agência Reuters pode dizer que o G20 tenciona injetar 5 "triliões" na economia mundial – «G20 Leaders to Inject $5 Trillion Into Global Economy in Fight Against Coronavirus» (fonte: The New York Times, 26/03/2020) –, espera-se que um jornal de Portugal anuncie uma promessa de ajuda que orça os 5 biliões, conforme se pode confirmar em "'O bilião e a nomenclatura dos grandes números: regra “N” e regra “n –1” , um artigo de Guilherme de Almeida (rubrica O nosso idioma, sub-rubrica Ciência e Tecnologia).

5. Uma sugestão de leitura: o depoimento de quem encontrou pela frente o desafio de aprender português e, com esforço, é certo, teve a abertura de alma e espírito para o adotar no dia a dia. Justifica-se, portanto aqui o registo da experiência relatada pela pianista Mariana Dellalyan, uma arménia radicada em Portugal, em texto intitulado "Como eu aprendi, e continuo a prender, todos os dias o português",  disponível no blogue Certas Palavras, do tradutor, escritor e divulgador de temas linguísticos Marco Neves.

6.  A Ciberescola/Cibercursos da Língua Portuguesa, projeto desenvolvido no âmbito de um protocolo da Associação Ciberdúvidas com a Direção-Geral de Educação (Ministério da Educação de Portugal), encontra-se disponível ao utilizador comum, com todos os seus materiais de Português como Língua não Materna (PLNM) e Português como Língua Estrangeira (PLE). Mais informação nas Notícias.

7. No Dia Mundial do Teatro, a imposição do isolamento é a (quase) negação de qualquer arte performativa pela falta da presença do público. Mas não seja por isso que não se celebram a data. Por exemplo, em Portugal, ocorrem várias iniciativas no mundo virtual:

– O Teatro do Noroeste-Centro Dramático de Viana oferece peças de teatro para os mais novos, tendo já acessíveis Antes de Começar, A vida trágica de Carlota, A filha da Engomadeira, Bojador ou João e o Pé de Feijão, entre outros.

– na sala virtual do Teatro Municipal Joaquim Benite, em Almada, pode assistir-se, às 21h00, a O Mandarim, a partir do conto homónimo de Eça de Queirós;

– no Teatro Nacional de São João, no Porto, disponibilizam-se quatro peças de Alfred Jarry: depois de Rei Ubu (foi no dia 25), Ubu Agrilhoado (no dia 26), apresentam-se Ubu Cornudo (dia 27) e Ubu no Outeiro, (dia 28);

– na sala online do Teatro Nacional de D. Maria II, em Lisboa, divulgam-se espetáculos: A origem das espécies (às 11h), Sopro (às 21h); e, no dia 28 de março, será a vez de Frei Luís de Sousa (às 21h).

8. Outras sugestões em modo virtual:

– Visitas a museus portugueses: Museu Nacional dos CochesMuseu RTPMuseu Nacional de História Natural e da CiênciaMuseu Calouste Gulbenkian (note-se, aliás, que museus do mundo inteiro podem ser visitados virtualmente a partir do Google Arts & Company );
– Música: Miguel Araújo canta canções de embalar (para a sua filha) todas as noites no Facebook; Festival, festival que decorre entre 27 de março e 1 de abril, com a participação de mais de 80 artistas de 11 nacionalidades diferentes, que é transmitido em linha, a partir de seis países, nas áreas de música e teatro na página do Facebook da iniciativa.
– Cinema: a Agência da Curta Metragem disponibiliza filmes curtos do seu catálogo: Viagem a Cabo Verde, animação de José Miguel Ribeiro; Água Mole, de   Alexandra Ramires (Xá) e Laura Gonçalves; e Versailles, de Carlos Conceição, entre outros (mais informação e sugestões no Plano Nacional de Cinema).

9. Outra efeméride: foi a de 26 de março de 1487 que foi impresso o primeiro livro em Portugal – curiosamente um livro em hebraico, o Pentateuco, saído das oficinas de Samuel Gacon, em Faro – e que  assinala oDia do Livro Português, por uma iniciativa da Sociedade Portuguesa de Autores.

10. Temas centrais dos programas que a Associação Ciberdúvidas da Língua Portuguesa produz para a rádio pública portuguesa: no Língua de Todostransmitido pela RDP África, na sexta-feira, dia 27 de março, pelas 13h20*, Margarita Correia, linguista, professora na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e presidente do Conselho Científico do Instituto Internacional da Língua Portuguesa (IILP), fala sobre a situação do português na Guiné-Equatorial no contexto da CPLP; e, no Página de Português, emitido pela Antena 2, no domingo, 29 de março, pelas 12h30*, o Projeto Read On Portugal, criado para apoio da entre jovens europeus, é explicado por João Paulo Proença, seu coordenador.

11. Com a Páscoa *, o Ciberdúvidas faz uma pausa coincidente (em condições normais) com a das atividades escolares em Portugal. O regresso às atualizações está marcado para 15 de abril p. f. Até lá, fica desativado o acesso ao formulário para envio de perguntas, mas, para assuntos que não digam respeito a dúvidas linguísticas, mantêm-se disponíveis os contactos habituais. E, como sempre, temas da atualidade ficarão devidamente assinalados nos Destaques  e na nossa página do Facebook.

*A palavra Páscoa vem do latim vulgar pascua, que significa “alimento (pasto)”, sentido que se associa ao facto de a Páscoa ser o momento que põe fim ao tempo de jejum que marca a Quaresma. A palavra latina teve origem no hebreu pasach (“passagem”), designação dada à comemoração judaica que evocava a fuga do Egito pelo povo de Israel e que tinha lugar na altura da crucificação de Jesus. Esta designação terá servido de inspiração para o nome da festa cristã que celebra a Ressurreição de Jesus Cristo.

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1. Se a China começou por ser o país mais afetado  pela covid-19 *– e onde tudo começou –, na Europa, nos Estados Unidos ou noutras regiões do planeta, a pandemia também se expande inexoravelmente e, portanto, continua tema dominante da atualidade nacional e internacional. Na comunicação social, não deixam de se fazer notar anglicismos recorrentes, que se somam ao vocabulário mais ativo nas notícias e nas opiniões sobre a presente crise (aquiaqui e aqui):

— Impeachment. O mesmo que impugnação. A palavra tem-se salientado a propósito da situação política no Brasil, onde o presidente Jair Bolsonaro  enfrenta novo pedido de impugnação.

 — Lay off. Ou seja, «dispensa temporária de pessoal», termo que figura entre as 30 medidas que o Governo português adotou para conter a pandemia.

— Spread. Termo da área da economia, que ainda não encontrou equivalente estável em português, ainda que diferença (de preços na compra e venda de ativos ou instrumentos financeiros) e margem (sobre taxa de juro) sejam palavras que o definam (cf. spread, no dicionário da Porto Editora, em linha na Infopédia). Seja como for, é o anglicismo que prevalece nas notícias sobre linhas de crédito para apoiar as empresas pelo impacto que estão a sofrer com a crise.

Entre os termos vernáculos, simples ou compostos, contam-se:

— "Covidário". Um doente com ou de covid-19 ou área hospitalar destinada a tais doentes**. Trata-se de um termo que, por enquanto, fará parte da gíria dos profissionais da saúde, atestando-se num título da edição de 24/03/2020 do jornal Público:  "Não basta ter “covidários”. É preciso vacinar crianças e continuar a tratar os outros doentes".

— Cloroquina Medicamento usado no tratamento e profilaxia da malária e que está a ser utilizado nalguns países em casos graves de coronavírus.

 Crime de desobediência. Crime praticado por aquele que desrespeita uma ordem ou um mandado comunicado ou mandado de uma autoridade ou funcionário com poderes para tal; na atual situação, o não cumprimento desta norma implica incorrer no crime de desobediência por violação de isolamento obrigatório que, segundo o Código Penal, consiste numa pena de prisão até um ano ou multa até 120 dias.

EPI. Sigla, também usada como acrónimo, de «equipamento de proteção individual» Esta expressão é recorrente nas  avaliações desencontradas que o primeiro-ministro português e os hospitais fazem acerca dos meios existentes nos hospitais de Portugal para o combate à epidemia.

Fase de mitigação. É quando as cadeias de transmissão do covid-19 já estão estabelecidas, e podem acontecer em ambientes abertos ou fechados. A fase de mitigação, nível vermelho de alerta e de resposta três (a mais elevada de uma escala de três), corresponde à presença de casos de infeção com vírus da covid-19 em território nacional. Divide-se aos subníveis de «cadeias de transmissão em ambientes fechados» e «cadeias de transmissão em ambientes abertos».  O país passa então a ter uma epidemia ou pandemia ativa. Cf. Fase de mitigação

Hospital de campanha. Estrutura de emergência que funciona como hospital provisório para dar resposta às necessidades dos doentes.

— Evacuar. Desocupar totalmente um edifício (em situação de emergência); é errado o uso  aplicado a  pessoas.

Paciente zero.  O caso inicial numa população com um surto epidemiológico, por poder indicar a fonte de uma nova doença, uma eventual propagação e o que detém o possível "segredo" da doença e como foi disseminada. O termo  foi usado pela primeira vez aquando da disseminação do HIV nos EUA , e, agora em relação ao covid-19 (aqui e aqui, por exemplo).

Ventilador. Aparelho que auxilia as trocas respiratórias no caso de perturbação da ventilação pulmonar.

Viseira. Resguardo que protege o rosto ou a parte dos olhos.

Zaragatoa. Vareta com algodão na extremidade (espécie de cotonete mais longo) usada para colheitas; na situação atual recolhem-se amostras do trato respiratório no nariz.

* Apesar de o termo cunhado pela Organização Mundial de Saúde para designar a doença ter a forma alfanumérica COVID-19, com maiúsculas, já em aberturas anteriores (ver também aqui) se assinalou que se usa covid-19, como nome comum do género feminino («a covid-19») escrito com letras minúsculas. Aliás, é esta a grafia que parece generalizar-se no uso, ainda que, referencialmente, ela se deva aplicar apenas à doença, e não ao vírus causador, o (novo) coronavírus, denominado SARS-CoV-2 pelo Comité Internacional de Taxonomia de Vírus. É de recordar que, relativamente à SIDA (síndrome de imunodeficiência adquirida), acrónimo que se converteu num nome comum («a sida»), também se distingue entre este termo, que denomina a doença, e o vírus causador, o HIV (ou transpondo para português, VIH, isto é, «virus de imunodeficiência humana»). Entretanto, para saber mais sobre o tema, merecem registo dois trabalhos do jornal Público, pela explicação da terminologia à volta deste e dos anteriores coronavírus: "O novo coronavírus: factos, respostas e previsões", de 10/03/2020; e "O novo coronavírus: factos, respostas e previsões II". Na imagem, mapa indicativo do alastramento da covid-19 do Coronavirus Resource Center da Universidade Johns Hopkins (consultado em 25/03/2020).** Definição corrigida em 24/04/2020.

2. No Consultório, as novas respostas abordam cinco tópicos: a locução «de acordo com»; a forma -no do pronome pessoal o; o esquema rimático de um poema com rima encadeada; o uso adjetival de xadrez; e a expressão «ainda bem».

3. Dois textos do mesmo autor, João Nogueira da Costa, em duas rubricas diferentes: em O nosso idioma, um pequeno elenco de palavras do dia a dia com origem em mitónimos, isto é, nomes mitológicos da Antiguidade greco-latina; em Lusofonias, o relato em tom de fantasia de uma visita a diferentes lugares de países de língua portuguesa e aos escritores que aí nasceram.

4. Voltando às medidas impostas em Portugal para combater a covid-19 e, em especial, à interrupção das aulas presenciais nas escolas (a partir de 16/03/2020), refira-se a preocupação com a avaliação e os exames finais do presente ano letivo. As avaliações do segundo período estão garantidas, segundo o ministro da Educação, Tiago Brandão Rodrigues, enquanto alunos, professores e famílias se afadigam na realização de tarefas escolares pela alternativa do ensino a distância*. Resta saber até que ponto os níveis de literacia digital ou outra são satisfatórios para enfrentar estas condições, pois de acordo com dados divulgados pela Pordata, a propósito do Dia Nacional do Estudante, comemorado em Portugal em 24/03/2020, metade da população de Portugal, dos 25 aos 64 anos, não completou o ensino secundário.

** Sobre a locução adverbial a/à distância, que define o tipo de atividades realizadas em alternativa às aulas presenciais, ocorre esta expressão com duas variantes, com preposição a ou com a contração à. Existem bons argumentos para adotar uma ou outra, conforme se pode confirmar pelas seguintes respostas e artigos: "Ensino a distância", "'À distância' ou a 'distância?", "À distância, e não à pressa", "Três razões para ser 'à distância' ( enão 'a distância')", "Breve históira recente de 'a distância'".

5. Perante os desafios do confinamento, maior significado e relevo têm as notícias da multiplicação de recursos digitais para aquisição e desenvolvimento de competências em língua portuguesa: um exemplo vem do Brasil, onde a Universidade do Livro, pertencente à fundação Editora da Universidade Estadual Paulista (UNESP), oferece cursos em linha para domínio da língua culta; e, no quadrante do Português como Língua Estrangeira, tem destaque o guia de apoio em linha disponibilizado pelo Camões-Instituto da Cooperação e da Língua.

6. Uma sugestão de leitura para estes tempos de quarentena: Bode Inspiratório uma iniciativa que o semanário português Expresso leva a cabo como atividade de escrita colaborativa de um folhetim ao estilo de antigamente. Trata-se de uma história que tem a participação de vários autores, entre eles, o português Mário de Carvalho, que escreve o primeiro capítulo na edição de sábado, 28 de março p. f. O último capítulo, previsto para final de abril, fica a cargo de Luísa Costa Gomes.

7. Nos programas que a Associação Ciberdúvidas da Língua Portuguesa produz para a rádio pública portuguesa são temas centrais:

– no Língua de Todostransmitido pela RDP África, na sexta-feira, dia 27 de março, pelas 13h20*, o depoimento de Margarita Correia, linguista, professora na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e presidente do Conselho Científico do Instituto Internacional da Língua Portuguesa (IILP), sobre a situação do português neste país, na sequência da sua recente deslocação à Guiné-Equatorial, integrada numa delegação da CPLP;

– no Página de Português, emitido pela Antena 2, no domingo, 29 de março, pelas 12h30*, entrevista-se João Paulo Proença, professor e coordenador do Projeto Read-on Portugal, iniciativa que visa apoiar e disseminar a paixão pela leitura nos jovens europeus, entre os 12 e os 19 anos, através do seu envolvimento ativo na reformulação das formas de vivenciar, compartilhar e criar literatura.

O programa Língua de Todos é repetido no sábado, dia 28 de março, depois do noticiário das 09h00; e o  Páginas de Português  tem repetição no sábado, dia 4 de abril, às 15h30. Hora oficial de Portugal continental, ficando ambos os programas disponíveis posteriormente aqui e aqui.

Por Ciberdúvidas da Língua Portuguesa

1. O número de novos casos de infeção pelo novo coronavírus continua a subir na Europa e em muitos outros locais deste nosso planeta, tendo já atingido mais de 280 mil pessoas e provocado mais de 11 mil mortes. A pandemia ocupa de forma quase plena não só o espaço mediático como também as conversas privadas. Desde as medidas profiláticas às políticas, desde as especialidades médicas às áreas da ciência envolvidas, desde o tratamento estatístico dos dados à sua análise, tudo envolve léxico para ser verbalizado e significações que devem ser claras. Por esta razão, o Ciberdúvidas assume também como sua a missão de esclarecer sem deixar de cuidar a língua portuguesa, o que nos leva a retomar neste espaço a explicação de termos que têm sido mobilizados para falar / escrever sobre a situação que se vive (A este propósito, consulte-se também as explicações já divulgadas aqui, aqui e aqui):

Primeira imagem: COM'tacto, composição gráfica de Josefa Reis, 2020

Achatamento da curva. Redução ou abrandamento do crescimento do número de infetados, afastando-se dos números previstos pelos modelos matemáticos.

Anestesiologia. Área da medicina que estuda técnicas de anestesia e reanimação.

— Anestesiologista. Especialista em anestesiologia.

— Centro de rastreio. Local onde se realizam testes para despistar a presença de algo (na atual situação, do vírus SARS-CoV-2).

— Cogula. Espécie de carapuço que os profissionais de saúde vestem por cima da máscara e dos óculos, protegendo-os na face e na região cervical. Com a viseira colocada por cima, seu uso é recomendado para médicos e enferrmeiros que prestam cuidados de saúde mais invasivos — como é o caso dos intensivistas, dos infecciologistas e dos internistas

— Comorbidade. Associação de duas ou mais doenças na mesma pessoa.

ConfinamentoEstado de quem está fechado numa área reservada, afastado do contacto com os outros; na atual situação, aplica-se a quem está em casa, sem contactos sociais no exterior.

— Curva de contágio. Percurso de crescimento/ rajetória seguida pelo número de contágios num dado espaço físico e num dado intervalo temporal.

Curva sombrero. Por regra, um surto epidémico desenvolve-se de acordo com uma curva com uma forma que muitos comparam à de um “sombrero” mexicano. Saber se os sistemas de saúde lidam bem ou mal com esses surtos epidémicos depende da altura do “sombrero”. A imagem aqui (em inglês: Flattening the Coronavirus Curve) e aqui.

— Epidemiologia. Ciência que estuda as epidemias.

— Epidemiologista. Especialista na área da epidemiologia.

— Imunidade: invulnerabilidade do organismo ao ataque de agentes infecciosos.

 Isolamento. Situação em que fica alguém com teste positivo de covid-18.

— Infecciologia/Infectologia: palavras sinónimas que referem a área da medicina que estuda as doenças infecciosas.

— Infecciologista/Infectologista: palavras sinónimas que referem o especialista em infecciologia / infectologia.

— Infetado vs. Infestado: pessoa que está contagiada está infetada; infestado é o que está invadido por alguma coisa (por exemplo, por parasitas que causam doenças).

— Internista. Médico especialista de medicina interna

 Medicina interna. Área da medicina que avalia o doente como um todo; atividade exercida sobretudo nas urgências hospitalares, fazendo o estudo e orientação inicial do doente na fase de internamento;

— Microbiologia. Ciência que estuda os micróbios.

— Microbiólogo/Microbiologista. Palavras sinónimas; especialista em microbiologia. 

— Percentagem/Porcentagem. Designa uma dada proporção em relação a cem; porcentagem é termo usado no português do Brasil.

Planalto. É quando a curva de contágios deixa de subir, estabilizando o número de infetados.

PneumologiaÁrea da medicina que estuda os pulmões.

Pneumologista. Especialista em pneumologia.

— Quarentenar: verbo intransitivo que significa «fazer quarentena».

— Severo vs. Grave: severo significa acentuado, enquanto grave significa duro, sério.

Sintomatologia: conjunto de sintomas de uma determinada doença; no caso da covid-19, pessoas assintomáticas poder ser  transmissoras do vírus, mais do que se supunha no início do surto pandémico.

— Taxa (ou coeficiente) de mortalidade (e não ‘taxa de mortandade’). Indice demográfico que normalmente indica o número de mortes por mil habitantes. Diferente de taxa de letalidade: a proporção entre o número de mortes por uma doença e o número total de doentes que sofrem dessa doença, ao longo de um determinado período de tempo. É geralmente expressa em percentagem.

Viseira. Equipamento para proteção facial dos profissionais de saúde em serviço hospitalar de risco acrescido de contágio, como no tratamento de doentes com a covid-19.

 

Destaque também para a dinâmica da língua que, dando resposta às necessidades da realidade, se abre à criação lexical. A nova "palavra" coronabonds é disso exemplo. O termo da área da economia, formado a partir da palavra eurobond (palavra já dicionarizada e usada para referir as obrigações emitidas pelos países da eurozona)*, tem sido usado para referir a possibilidade de emissão de dívida a muito longo prazo pelos países europeus para fazer face à crise provocada pela pandemia do novo coronavírus (cf. notícias aqui, aqui e aqui).  

* Obs.: Apesar de eurobond ser termo corrente na comunicação social, convém assinalar que existe um termo português equivalente, euro-obrigação, que está registado no dicionário de português da Porto Editora (em linha na Infopédia). Transpondo este caso para o de coronabons, pode formar-se em português o neologismo coronaobrigações., constituído por corona-, de coronavírus, e obrigação, tradução do inglês bond, nas aceçõs de «obrigação» e «título de dívida».

 

2. Dúvidas das mais diferentes áreas continuam a chegar ao Consultório do Ciberdúvidas. A etimologia é, com muita frequência, uma área de interesse que motiva novas questões relacionadas com a história das palavras. Desta vez, a palavra eleita foi poesia. É sobre a sua etimologia e ortografia esta nova resposta. É também a história das palavras e da sua evolução e eventual distribuição geográfica que justifica o cotejo entre «grão de arroz» e «bago de arroz». Já no plano da sintaxe, regressamos ao tratamento das orações subordinadas infinitivas para avaliar as situações em que se deve recorrer ao infinitivo pessoal (a partir da expressão «julgamos ser eternos») e a correção do recurso à preposição a em «ouvir alguém a pedir ajuda». Para finalizar, uma resposta que esclarece qual o plural do termo associação-membro.

3. O vocábulo insula deu origem a inúmeras palavras (sobretudo topónimos) que, nas línguas europeias, guardam o conceito de "ilha" na sua significação. É esta a história que nos conta o professor João Nogueira Costa neste apontamento, fazendo ainda uma viagem em busca da identificação da influência do termo árabe que designa ilha (jazira) na designação de várias localidades do Norte de África, de Espanha e de Portugal. 

4. Há línguas escritas, outras apenas faladas, mas também há línguas assobiadas. No Norte da Turquia, os habitantes de Kuşköy (a "ilha dos pássaros", numa tradução para português) comunicam através de uma língua assobiada, que inclui uma estrutura lexical e sintática e que permite comunicar a longas distâncias. Uma linguagem cujo processo de produção e compreensão mobiliza os dois hemisférios cerebrais (enquanto a linguagem escrita ou falada se associa apenas ao hemisfério esquerdo) (cf. notícia).

5. O isolamento a que estamos obrigados durante o estado de emergência pode ser transformado numa oportunidade cultural. Temos aqui dado notícia de algumas propostas que têm surgido. Hoje, deixamos mais algumas:

– assistir a concertos (por exemplo da Filarmonia de Berlim);

– visionar filmes (acompanhando, por exemplo, a Quarentena Cinéfila da Medeia filmes);

– assistir a uma peça de teatro (a partir, por exemplo, do D. Maria em Casa ou com as propostas do Teatro Aberto);

– visitar virtualmente museus (por exemplo, o Museu do Prado, o Museu Britânico ou o Museu Guggenheim); 

– Ler poesia, romances, ensaios ou acompanhar o Festival de poesia à mesa, consultar os livros disponibilizados pela Rede Nacional de Bibliotecas Públicas ou pelo Plano Nacional de Leitura na sua (Anti)quarentena de Leitura;

– A todas as sugestões que deixamos, acrescentamos a leitura do poema que o poeta Manuel Alegre dedicou a Lisboa em época que estado de emergência:

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Lisboa Ainda

Lisboa não tem beijos nem abraços

não tem risos nem esplanadas

não tem passos

nem raparigas e rapazes de mãos dadas

tem praças cheias de ninguém

ainda tem sol mas não tem

nem gaivota de Amália nem canoa

sem restaurantes, sem bares, nem cinemas

ainda é fado ainda é poemas

fechada dentro de si mesma ainda é Lisboa

cidade aberta

ainda é Lisboa de Pessoa alegre e triste

e em cada rua deserta

ainda resiste.

20 de março de 2020, Manuel Alegre

Por Ciberdúvidas da Língua Portuguesa

1. Em Portugal, o Presidente da República Marcelo Rebelo de Sousa declarou estado de emergência durante 15 dias (de 19/03 até 02/04). Esta declaração permitiu a suspensão de um conjunto de direitos e liberdades dos cidadãos portugueses (notícia aqui e aqui). Na sequência desta decisão, o governo definiu um pacote de medidas que visam defender a saúde pública (ver aqui as medidas em vigor), entre as quais se destaca a restrição do direito de livre circulação. As consequências que advêm destas medidas vão exigir dos portugueses coragem, persistência e resiliência. Entretanto, no Brasil foi declarado o estado de calamidade pública para combater a pandemia de COVID-19, que estará em vigor até ao final do ano que permite que os gastos públicos sejam aumentados, mesmo que violem as metas fiscais definidas nos Orçamentos do Estado.  

2. O avanço do novo coronavírus um pouco por todo o mundo (acompanhe a evolução da situação mundial através do mapa da Johns Hopkins University, em constante atualização e/ou neste outro) tem obrigado as populações a adotarem um estilo de vida muito diferente do que conheciam até ao momento. Isolamento social e higiene são palavras de ordem, numa altura em que as medidas de combate à propagação da infeção assumem formas mais duras. No plano linguístico, a situação que se vive está a levar ao desenvolvimento de um campo lexical, até aqui inexistente, em torno da doença COVID-19. Este novo contexto tem pressionado a língua a reestruturar o seu campo de significações e a realidade desencadeada pelo coronavírus tem atraído palavras e expressões inusitadas, algumas das quais eram usadas apenas em contextos de ficção científica ou num plano de análise teórica. Mas, porque essas palavras entraram no campo da referência à realidade efetiva que todos vivemos no momento atual, importa saber o que significam. Além do que já anteriormente foi registado (aqui, aqui e aqui, por exemplo), deixamos mais este  contributo do Ciberdúvidas:

Calamidade pública. Situação caracterizada por um grande mal que constitui perigo para muitos cidadãos.

Cerca sanitária. Encerramento de um determinado território por razões de saúde, o que implica o impedimento de entrada e saída de uma região, para além de outras medidas restritivas e/ou suspensivas.

Confinamento compulsivo. Ato de encerramento de um indivíduo num dado espaço, com eventual recurso à força persuasiva ou física.

— Contagiar vs. infetar. Transmitir uma doença por contágio.

Crime de desobediência Crime que corresponde ao desrespeito a uma ordem dada por alguém com poder legitimado.

Suspensão de direitos e liberdadesInterrupção temporária de determinados direitos e liberdades consagrados na Constituição.

 Enquanto nos protegemos e protegemos os outros, esperamos com confiança e força o dia em que esta situação difícil virá a ser superada. Trata-se de uma tarefa hercúlea que todos temos de levar até ao fim (por «tarefa hercúlea» entenda-se algo que exige muito esforço, uma ideia que assenta na figura mitológica de Hércules, caracterizada pela sua força sobre-humana).

Para quem se interessa pelo esperanto, deixamos aqui uma lista de termos médicos com a designação e respetiva explicação em esperanto, da autoria dos nosso consultor Miguel Faria de Bastos

  •  endemio: kronika aῠ  recidiva homa malsano enradikiĝinta en difinita regiono kaj  lando aῠ aro da landoj. Ekz.: malario, en subsahara Afriko kaj en Centra Ameriko (escepte de Kubo). 

[endemia: doença humana crónica ou recidivante em determinada região ou país ou conjunto de países. Ex.: malária (paludismo), na África subsariana e na América Central (exceto Cuba); 

  • epidemio: infekta homa malsano samtempe kaj samregione trafanta individuojn de unu aῠ pluraj apudaj landoj. Ekz.: ebolo, en Gvineo-Bisaῠo, Serraleono kaj Liberio

[epidemia: doença humana infecciosa que, ao mesmo tempo e na mesma região, atinge indivíduos de um ou mais países vizinhos. Ex..: ébola, na Guiné-Bissau, na Serra Leoa e na Libéria];

  • pandemio: infekta homa malsano tutplaneda aῠ  preskaῠ   tutplaneda. Ekz.: koronviruso, en ĉiu kontinento.

[pandemia: doença humana infeciosa estendida a nível planetário ou quase planetário. Ex.: coronavírus, em todos os continentes].

3. O facto de o novo coronavírus e de a doença COVID-19 se terem tornado os temas centrais da atualidade mediática leva a que muito se escreva sobre o assunto. Neste plano, continua a ser importante, por isso, respeitar a correção linguística. Algumas sugestões que podem auxiliar a redação de textos (algumas destas sugestões são adaptadas das recomendações para o espanhol da Fundéu BBVA):

– a palavra anticoronavírus é correta e deve ser grafada sem hífen;
– o termo anti-COVID-19 pode ser usado, mas com hífen a separar o prefixo do acrónimo, que é um nome próprio; todavia, se este acrónimo for usado como nome comum, já se escreverá anticovid-19 (refira-se que a palavra covid-19 está já dicionarizada em alguns dicionários eletrónicos: cf. aqui e aqui);
– a palavra pandemia deve ser usada sozinha, não devendo aparecer em expressões como «pandemia global» ou «pandemia mundial», uma vez que são redudantes;
– a palavra epicentro (do vírus) deve também ser usada sozinha, sendo a expressão «epicentro do foco (do vírus)» redundante;
– a expressão «morte por coronavírus» centra-se na causa da morte (o vírus SARS-CoV-2), enquanto «morte com coronavírus» se aplica a quem, tendo outras enfermidades, morre infetado pelo vírus, sem que se possa determinar se foi este o responsável pelo falecimento;
– a expressão inglesa take-away tem equivalente em português, pelo que é preferível utilizar «entrega em casa» ou «venda para fora». 

4. Apesar da situação de pandemia que se vive, o Ciberdúvidas mantém o seu Consultório aberto e as dúvidas linguísticas continuam a chegar e a encontrar resposta neste espaço dedicado à lingua portuguesa. Na nova atualização, poderá conhecer as respostas às seguintes questões: «É possível omitir o pronome pessoal em «avise-me»?», «Por que razão a pronúncia de Balcãs é diferente em Portugal e no Brasil?», «Qual a sintaxe do verbo implorar?», «Que verbos se associam ao nome paleio?» e «Quais os recursos expressivos presentes no poema "Tormenta", de Fernando Pessoa?»

5. Com o intuito de auxiliar a aprendizagem do Português Língua Estrangeira / Português Língua não materna numa altura de isolamento social, e numa perspetiva de serviço público, a Ciberescola da Língua Portuguesa e os Cibercursos da Língua Portuguesa colocaram em linha aberta, disponível a qualquer utilizador, a sua base de dados de exercícios e as suas fichas em formato pdf (cf. notícia).  

6.  O professor João Nogueira da Costa, enumerando primeiro alguns pares vocabulares que exibem fenómenos de alternância vocálica muito antigos (ano/biénioapto/ineptoarte/inerte), revela depois uma etimologia, para muitos, talvez inesperada, a de imbecil. Um texto que o autor publicou na sua página de Facebook e que aqui se transcreve.

7. Dia do Pai foi celebrado a 19 de março. Tratou-se de uma comemoração atípica, com muitos pais e filhos em situações de distanciamento físico. O tradutor e professor universitário Marco Neves não deixou de recordar o dia, encetando uma viagem à origem da palavra pai e às palavras usadas em diferentes línguas para referir a realidade (crónica disponibilizada no blogue Certas Palavras). 

8. Várias entidades têm vindo a promover ações que visam quer o acompanhamento informado da evolução da pandemia e das situações que esta implica quer a ocupação do tempo da população que se encontra em isolamento. Destacamos aqui:

– Sítio oficial de apoio à evolução da COVID-19, designado Estamos on;

– Oferta cultural do Teatro Aberto, que disponbilizou em linha alguns dos espetáculos que produziu (mais informação aqui).

9. Os programas que a Associação Ciberdúvidas da Língua Portuguesa produz para a rádio pública portuguesa são também uma forma de ocupar o tempo de modo significativo. Esta semana, propomos que acompanhe as entrevistas ao escritor cabo-verdiano Germano de Almeida ( no programa Língua de Todos*, transmitido pela RDP África) e a José Carlos Vasconcelos, fundador e diretor do JL – Jornal de Letras, Artes e Ideias (no programa Página de Português**, emitido pela Antena 2).

*O programa Língua de Todos irá para o ar a 20 de março, pelas 13h20, sendo repetido no sábado, dia 21 de março, depois do noticiário das 09h00.

**O Páginas de Português  é difundido a 22 de março, pelas 12h30, com repetição no sábado, dia 29 de março, às 15h30.

Hora oficial de Portugal continental, ficando ambos os programas disponíveis posteriormente aqui e aqui.

Por Ciberdúvidas da Língua Portuguesa

1. São dias que hão de com certeza ficar profundamente gravados na memória coletiva mundial. Com o alastramento do novo coronavírus (SARS-CoV-2), e tal como acontece noutros países, em especial na vizinha Espanha, também Portugal se encontra prestes a adotar medidas de exceção com forte impacto linguístico, testemunhado pela velocidade com que entram em circulação palavras menos habituais ou neologismos simples e compostos. Do vocabulário recorrente, destaca-se a locução estado de emergência, uma medida controversa que está prevista pela Constituição da República Portuguesa e suspende direitos, liberdades e garantias dos cidadãos, embora sujeita ao respeito do princípio da proporcionalidade e limitada ao «estritamente necessário ao pronto restabelecimento da normalidade constitucional» (art.º 19.º n.º4 da Constituição portuguesa. CfPúblico, 16/03/2020 + RTP Notícias, 17/03/2020); e, ainda, o artigo do jornalista Ferreira Fernandes, Portugueses declaram estado de resistência). Mas outros termos se repetem com os conceitos associados (às vezes muito técnicos) no discurso mediático, permitindo elaborar uma pequena lista não exaustiva, com breves referências aos contextos de cada um deles:

Declaração de requisição civil: expressão novamente usada em Portugal em referência à forma de travar a greve dos estivadores do porto de Lisboa, ativa apesar da situação de pandemia (ler aqui) e que o Decreto-Lei 637/74 define como «o conjunto de medidas determinadas pelo Governo necessárias para, em circunstâncias particularmente graves, se assegurar o regular funcionamento de serviços essenciais de interesse público ou de sectores vitais da economia nacional».  Em 2019, a expressão apareceu com alguma frequência nos media portugueses, sobretudo a respeito de duas greves então realizadas: a dos enfermeiros e a dos motoristas de matérias perigosas (ler mais num artigo do jornal Sol, 07/02/2019).

Distância social, distanciamento social: denomina a necessidade ou o dever de cada indivíduo de manter certo afastamento em relação a outros, de modo a evitar o contágio (na imagem, o cartune  Bartoon  de Luís Afonso, em alusão humorística a este imperativo – jornal Público, 17/03/2020).

Disciplina social: outra expressão que se torna recorrente no discurso, para frisar a responsabilidade que cabe a cada um na tomada de precauções contra a propagação do vírus.

Estado de calamidade pública: conforme se escreve num artigo do jornal Observador (17/03/2020), «[d]e acordo com a Lei de Bases da Proteção Civil, o estado de calamidade é declarado pelo Governo, após resolução do Conselho de Ministros»; pode «ser antecipado por um “despacho de urgência” conjunto do primeiro-ministro e da ministra da Administração Interna». É a situação decretada a partir de 17/03/2020 na cidade portuguesa de Ovar (distrito de Aveiro) por causa da infeção do coronavírus.

Ensino a distância: em Portugal, com as aulas presenciais suspensas, o ensino universitário e não universitário recorre ao ensino à distância, como forma de contornar a crise. Há escolas ainda abertas para garantir refeições ou para filhos de pessoas cuja atividade exige presença no local habitual de trabalho, como acontece com os profissionais de saúde, embora não sejam numerosas (cf. TVI 24). Entretanto, apesar dos esforços para reforçar e melhorar os meios de ensino à distância, o ano letivo de 2019/2020 parece comprometido, falando-se na eventual suspensão de exames e estágios, visto estes coincidirem com o pico previsível do surto viral. Mesmo assim, novas regras permitem fazer em linha as inscrições nos exames e provas nacionais, tendo o Ministério da Educação também alargado o prazo até 3 de abril (ler notícia no jornal Observador, 17/03/2020).

Isolamento: recomenda-se ou impõe-se o recolhimento em casa e, havendo suspeitas ou confirmação de o vírus ter sido contraído, deve-se não contactar com ninguém. A etimologia deste termo foi abordada pelo professor universitário, tradutor e divulgador Marco Neves num texto igualmente divulgado nas páginas do Ciberdúvidas (ler aqui).

Internação: palavra modificada por vezes pelo adjetivo compulsória – «internação compulsória». É a forma empregada no Brasil;  em Portugal, usa-se geralmente internamento.

Mapa pandémicoA que países já chegou o coronavírus?

– Quarentena: costumava significar «período de 40 adias», mas com a presente crise tornou-se sinónimo de «período de isolamento», o que quer dizer que pode não ter a duração do referido intervalo. Sobre a situação na França, ler aqui . A respeito das medidas que se aplicam ou se discutem no Brasil, ler aqui  e aqui.

Teletrabalho: o trabalho feito a distância que os atuais meios eletrónicos e digitais proporcionam. Ver mais acima Ensino a distância.

No registo da terminologia mais específica à volta desta pandemia mundial, a informação jornalística pode ser responsável por muita imprecisão lexical. É o que assinala O Observatório da Ética Jornalística (objETHOS), do Departamento de Jornalismo e do Programa de Pós-Graduação em Jornalismo (POSJOR) da Universidade Federal de Santa Catarina, no Brasil. «Qual é a diferença entre cobertura intensiva e alarmismo social? Como abordar um tema urgente sem alimentar histeria coletiva? De que maneira o jornalismo pode ajudar a combater a pandemia? Jornalistas devem apenas contabilizar casos de contaminação e mortos? Como responsabilizar autoridades e não agravar a crise de confiança nas instituições num momento tão delicado?As perguntas são muitas, mas elas poderiam ser resumidas numa só: qual é a responsabilidade do jornalismo em meio à crise do coronavírus?» Pormenores aqui.
 

Na imagem à esquerda, cartune da série Bartoon, de Luís Afonso (Público, 18/03/2020).

2. No Consultório, quatro novas perguntas: a locução latina de cujus; as construções «enquanto crianças» e e«em crianças»; a análise sintática de uma frase de Camilo Castelo Branco; e a ordem interna a que pode obedecer em português uma sequência de adjetivos.

3. O sal costuma prestar-se a metáforas, para sugerir aquilo que pode dar graça à vida, desde que não caia em excessos. A propósito da família de palavras de sal, o professor João Nogueira da Costa apresenta, na rubrica O nosso idioma, uma nova lista definida pela escala que vai do salgado ao insonso.

4. Como foi dito, as medidas de confinamento aconselhado ou imposto pelos governos levam a suspender as aulas presenciais, mas o mundo do ensino a distância move-se e testa os seus limites. Tal é o contexto do desafio que o professor e classicista português Frederico Lourenço propõe: aulas de latim a partir do zero na página de Facebook que criou para efeito. Material de apoio; o livro da sua autoria a Nova Gramática do Latim, publicada em 2019 (ver Montra de Livros).

5. As medidas de exceção alteram o nosso quotidiano, é verdade, mas reconheça-se que, mesmo sem teletrabalho, são muitas as opções para manter o espírito vivo e curioso, pondo-o em contacto com o mundo da cultura. Algumas sugestões com origem em Portugal:

– neste dia, pelas 19h00, a inauguração virtual em linha da exposição Julian Opie. Obras inéditas, no Museu Coleção Berardo;

– os projetos A Música Portuguesa a Gravar-se a ela própria, e A Dança Portuguesa a Gostar de si própria, desenvolvidos no âmbito das atividades de A Música Portuguesa a Gostar dela própria, do realizador-musicólogo Tiago Pereira;

– a "Quarentena Cinéfila", uma programação que a exibidora  portuguesa Medeia Filmes organiza e disponibiliza em linha;

– as plataformas de arquivo de livros digitalizados e eletrónicos, entre as quais se contam a biblioteca digital da Biblioteca Nacional de Portugal.

6. Nos programas que a Associação Ciberdúvidas da Língua Portuguesa produz para a rádio pública portuguesa, realce para três entrevistas:

– No programa Língua de Todostransmitido pela RDP África, na sexta-feira, dia 20 de março, pelas 13h20*, entrevista-se o escritor cabo-verdiano Germano de Almeida, que fala sobre o Jornal de Letras, Artes e Ideias – em Portugal, o conhecido JL – e a sua importância na divulgação das literaturas africanas em português.

– No Página de Português, emitido pela Antena 2, no domingo, 22 de março, pelas 12h30*, dá-se destaque à comemoração dos 40 anos de vida do JL – Jornal de Letras, Artes e Ideias com um depoimento do seu fundador e diretor, desde o início, José Carlos Vasconcelos.

O programa Língua de Todos é repetido no sábado, dia 21 de março, depois do noticiário das 09h00; e o  Páginas de Português  tem repetição no sábado, dia 29 de março, às 15h30. Hora oficial de Portugal continental, ficando ambos os programas disponíveis posteriormente aqui e aqui.

Por Ciberdúvidas da Língua Portuguesa

1. Os processo de formação de uma  língua consolidam-se no tempo, o que implica que a reconstituição do percurso efetuado seja um processo tanto apaixonante quanto complexo. Por exemplo, a mesóclise (colocação de um pronome átono entre o radical e a desinência do verbo, visível em formas como amá-lo-ei), fenómeno pleno de vitalidade na escrita e em registos mais formais do oral, encontra a sua origem em formas perifrásticas verbais características do latim vulgar, como se explica numa das respostas constantes da atualização do Consultório. A sintaxe volta a ser um assunto que dá origem a questões diversas, o que fica patente em duas respostas que tratam os complementos oblíquos do verbo voltar e a identificação de uma oração resultativa em «O que aconteceu para chegares tarde?» Discute-se, ainda, qual será a forma correta de uma parlenda: «hoje é domingo, pé de cachimbo» ou «hoje é domingo, pede cachimbo»? Finalmente, trata-se a questão da pronúncia do nome científico Erlichia canis (doença popularmente conhecida como «febre da carraça»): "erlíquia" ou "erlíchia"?

2.  A comida que alimenta o corpo sustenta também o espírito. É o que parece comprovar a obra «Que cousa é chanfana?», que o jornalista e escritor Fernando-António Almeida arquitetou em torno de 9 sonetos dedicados à chafana pelo poeta satírico António Lobo Carvalho, em pleno século XVIII. Uma obra de natureza histórica, ensaística, que passa pelos ambientes literários e pelo mundo da restauração lisboeta e que «com aparente despretensão, marca uma diferença erudita e ao mesmo tempo de grande força sugestiva, quando evoca ambientes da Lisboa antiga, entre poetas devassos e galegos laboriosos. Assim se dá também alimento à curiosidade por um passado citadino, afinal, tão vivo nos nomes das ruas e praças lisboetas», como sintetiza Carlos Rocha, coordenador executivo do Ciberdúvidas, na apresentação que divulga na Montra de Livros

3. Nos dias que correm, as palavras mais ouvidas e lidas convergem para a situação provocada pela pandemia do coronavírus. COVID-19 é a palavra do momento, ainda não dicionarizada, mas por todos já reconhecida como tal e usada a cada hora. Todavia, a sua significação permanece instável, como é comum nas palavras recém-criadas. Por essa razão, recordamos aqui que COVID-19 é o nome da doença provocada pelo vírus que recebeu a designação de SARS-CoV-2 pelo Comité Internacional para a Taxonomia dos Vírus. Visto que o nome da doença está a sofrer um processo de lexicalização, poderá ser escrito em letra minúscula, usado como nome comum (covid-19), não se justificando o recurso a maiúscula inicial. Os usos dados à palavra estão a provocar uma instabilidade no seu género, pois esta é utilizada tanto para referir a doença («a covid-19») como, indevidamente, o vírus que a provoca («o covid-19»). Para evitar esta indefinição e a falta de rigor que causa, sugerimos que se utilize o termo no género feminino («a covid-19») exclusivamente para designar a doença, tal como definiu a Organização Mundial de Saúde, reservando para o vírus a designação técnica SARS-CoV-2, a expressão «novo coronavírus» ou ainda «2019-nCoV». No âmbito das decisões políticas associadas à pandemia, recordamos que as expressões «estado de alerta» e «estado de emergência» se escrevem com letra minúscula e teletrabalho se escreve com minúscula e sem hífen.

Algumas destas sugestões e ainda outras foram já apresentadas em aberturas anteriores do Ciberdúvidas: aqui, aqui e aqui

4. Também à volta das palavras da atualidade, o professor universitário e tradutor Marco Neves explica a origem do termo isolamento, esclarecendo que deriva do verbo isolar, que se formou a partir da palavra isola, derivada do termo latino insula. Uma história curiosa para acompanhar os dias de isolamento voluntário que marcam o nosso quotidiano e, já agora, sigamos os conselhos do autor: «Já que temos de ficar uns tempos armados em ilhas, usemos as palavras e as histórias para nos achegarmos uns aos outros. São um pequeno alívio nestes dias do vírus.» (crónica divulgada no blogue Certas Palavras e aqui transcrita, com a devida vénia).

5. É também à volta das palavras que o apontamento da jornalista Anabela Mota Ribeiro se constrói. São as palavras que nos podem estruturar e auxiliar nos tempos que vivemos: empatia, disciplina, obediência e confiança, mas também força e coragem. Esta é uma mensagem feita de palavras que nos auxilia na reinvenção dos nossos dias. 

6. Visões apocalíticas do devir do mundo consideram que a pandemia que vivemos pode ser o resultado de uma vingança divina. Tomando o tema sob a ótica do texto bíblico (de que é tradutor), o professor universitário Frederico Lourenço esclarece, no seu mural de Facebook, que na Bíblia as passagens que associam a doença à ira de Deus são residuais, o que invalida a generalização deste conceito. Uma visão esclarecida que denuncia usos abusivos e adulteradores que vingam com alguma facilidade nos tempos atuais.

 7.  Destacamos, neste ponto final,

– A colaboração da Porto Editora e da Leya, que decidiram abrir gratuitamente as suas plataformas digitais a todos os alunos e professores, como forma de auxiliar a reestruturação do ensino em função da nova realidade de ensino-aprendizagem (notícia);

– A apresentação, pelo jornal Nexo, de um panorama gráfico da obra do escritor brasileiro Guimarães Rosa, que trata aspetos como a avaliação dos leitores, as obras publicadas por idade e por número de páginas, entre outros aspetos (aqui);

– O passatempo, também divulgado pelo jornal Nexo, que convida o leitor a identificar a língua em que 10 músicas são cantadas (aqui). 

Por Ciberdúvidas da Língua Portuguesa

1. A atualidade económica e financeira é dominada pelo impacto da propagação da doença do coronavírus, mas, noutro quadrante, a queda do preço do petróleo, decorrente de um diferendo entre a Federação Russa e a Arábia Saudita, também se reflete nos mercados. A propósito de combustível barato, um jornal português fala até do preço mais elevado do litro de água, à volta dos "0,37 cêntimos". Mas será mesmo este o valor que se pretende referir? No Pelourinho, um apontamento do professor Guilherme de Almeida, especialista em termos e unidades de medida, mostra como o descaso com o registo de valores em euros e cêntimos pode levar as notícias ao absurdo.

2. Concebidos geralmente como um tipo de «publicação anual com calendário, diversas informações úteis para cada mês e textos de índole variada (de caráter literário, de divulgação científica, de cariz humorístico, etc.)» (Infopédia), os almanaques tiveram lugar importante nos consumos culturais em língua portuguesa: basta lembrar o antigo Almanach de Lembranças Luso-Brasileiras, publicado durante oito décadas, de 1851 a 1932. Retomando com engenho esta tradição, o professor universitário e tradutor Marco Neves escreveu e publicou recentemente mais um livro dedicado ao português: trata-se de Almanaque da Língua Portuguesa, obra que «reúne curiosidades e dificuldades de natureza linguística, num formato de almanaque, destinada ao grande público», conforme assinala Carla Marques, consultora permanente do Ciberdúvidas, na apresentação que fez para a Montra de Livros.

3. Com os prazeres da leitura oitocentista ou deste segundo milénio, conjuga-se bem um chá reconfortante, reforçado talvez com um duchesse, um éclair, um croissant, um... Para completar a série, consulte-se a lista de galicismos que o professor João Nogueira da Costa elaborou para a sua página de Facebook e que se transcreve agora em O nosso idioma.

4. No Consultório, duas perguntas da Polónia centram-se no uso de preposições com os verbos permitir e perguntar. Outra questão diz respeito a uma palavra derivada de elicitar, verbo que ainda não reúne consenso normativo. A sintaxe e a coesão textual também voltam a ser abordadas nesta atualização: será que um pronome pessoal, vós, por exemplo, pode ter a função de vocativo?  Numa frase como «a equipa visitante derrotou a equipa visita, mas esta tinha um jogador a mais», a que equipa se refere o demonstrativo esta?  

5. Continua imparável o fluxo de notícias sobre a propagação mundial da doença do coronavírus (COVID-19): depois de, em 11/03/2020 a Organização Mundial da Saúde (OMS) ter classificado a situação já como uma pandemia,* um pouco por todo o mundo há o registo da adoção de medidas drásticas para evitar a transmissão do coronavírus. É o caso de Portugal, cujo governo decretou em 12/03/2020 um conjunto de medidas restritivas, que inclui a suspensão de todas as atividades letivas –  também tendo já o mesmo acontecido no Brasil. Entretanto, para os aspetos terminológicos associados a este tema, releiam-se os registos e comentários das aberturas de 11/03/2020, 09/03/2020, 02/03/2020, 03/02/2020, 30/01/2020 e 24/01/2020.

 * Consultar "Pandemia, epidemia e endemia". Recorde-se que COVID-19 (género feminino) é o termo adotado pela OMS para designar a doença do coronavírus. A denominação, que é nome próprio, também ocorre como nome comum, sob a forma covid-19, com letras minúsculas. Quanto ao vírus causador da doença, emprega-se correntemente o nome genérico coronavírus, que é aceitável, embora o Comité Internacional para a Taxonimia dos Virus lhe atribua o nome oficial de SARS-CoV-2, de modo a distingui-lo claramente de outros do género Coronavirus e da família Coronaviridae. Todas estas distinções terminológicas provêm das linhas de orientação que, para os usos mediáticos da língua espanhola, foram definidas pelFundéu BBVA, baseando-se nas decisões terminológicas das organizações internacionais médicas e sanitárias envolvidas no acompanhamento da atual crise. Para o português, parece faltar, por enquanto, a intervenção de entidades reconhecidas capazes de fixar com clareza a transposição de tais termos. Assim, dado não haver normas da língua portuguesa a respeito da ortografia destas denominações, afigura-se recomendável manter as grafias fixadas internacionalmente: COVID-19 ou covid-19, com hífen; e SARS-CoV-2, também hifenizado.

6. Temas com destaque nos programas que a Associação Ciberdúvidas da Língua Portuguesa produz para a rádio pública portuguesa: no Língua de Todostransmitido pela RDP África, na sexta-feira, dia 13 de março, pelas 13h20*, algumas questões da nossa língua comum como, por exemplo, a diferença entre neologismos, estrangeirismos e empréstimos; e no Página de Português, emitido pela Antena 2, no domingo, 15 de março, pelas 12h30*, o que vai ser feito na Guiné Equatorial quanto ao ensino do português de acordo com um depoimento da linguista  Margarita Correia, professora na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e presidente do Conselho Científico do Instituto Internacional da Língua Portuguesa (IILP), na sequência da sua recente deslocação a este país, integrada numa delegação da CPLP.

O programa Língua de Todos é repetido no sábado, dia 14 de março, depois do noticiário das 09h00; e o  Páginas de Português  tem repetição no sábado, dia 21 de março, às 15h30. Hora oficial de Portugal continental, ficando ambos os programas disponíveis posteriormente aqui e aqui.