1. O livro infantil No Meu Bairro, de Lúcia Vicente, ilustrado por Tiago M. (ed. Nuvem de Letras) saiu recentemente a público. Na sessão do seu lançamento, um grupo de pessoas manifestou-se, de forma ruidosa e por vezes agressiva, contra a publicação, os seus valores e até o código de escrita adotado, evidenciando comportamentos considerados uma violação da liberdade de expressão. O ruidoso prototesto de extremistas de direita, que se repetiu quatro dias depois na presentação do livro na Fundação Saramago, visou a linguagem gramaticalmente neutra adoptada pelos autores, o sistema ELU. Este sistema traduz-se num conjunto de propostas que visam a adaptação da linguagem a uma forma de comunicação não sexista, que respeita as pessoas não-binárias, contribuindo para a diminuição dos comportamentos discriminatórios. Tal é feito por meio da procura de formas neutras que não marquem o género, nem masculino nem feminino. Neste quadro, propõe-se a substituição dos pronomes ele(s)/ela(s) pelo pronome neutro "elu(s)", palavra criada para este fim. Entre as "novas regras", sugere-se que a flexão em género dos nomes e adjetivos seja marcada pelo sufixo -e, substituindo palavras como menino/menina por "menine". No quadro das exceções, as palavras que terminam em -co/-ca, passarão a ter a terminação -que (médico/médica → "médique"); as terminações -go/-ga passam a -gue (amigo/amiga → "amigue"); as terminações em -r/-ra passam a -re (professor/professora → "professore"). Por fim, a flexão no plural faz-se com o sufixo -es: pedreiros/pedreiras → "pedreires". Esta proposta é, pelo menos neste momento, marginal em Portugal (ao contrário, por exemplo, do Brasil, onde já se discute se a linguagem neutra deve ser usada nas escolas) e tem sido recebida com muitas reservas por vários setores da sociedade. Não deixa de ser certo que a cortesia de género tem vindo a instalar-se nas diferentes variantes do português. É atualmente frequente ouvir-se como saudação inicial a formulação «Bom dia a todas e todos». A proposta de linguagem neutra entra também em conflito com visões que recusam que o uso do masculino gramatical seja associado a uma posição ideológica que sustenta uma perspetiva sexista da sociedade.
O Ciberdúvidas tem vindo a acompanhar a evolução das propostas e reações relativamente à questão da linguagem inclusiva. Recordamos aqui alguns textos já divulgados: «Linguagem neutra, estilo, morfologia», «O equívoco do termo «linguagem neutra», «Linguagem inclusiva: «os/as trabalhadores/as»» , «Afinal o que é a linguagem inclusiva?».
2. Serão as expressões «ataque cibernético» e «ataque cibernáutico» ambas válidas? A reflexão de natureza lexicográfica e morfológica abre o Consultório na atualização de hoje. Poderão ainda ser consultadas sete novas respostas: «A grafia de uma no passado», «Contração e complemento do nome: «mãe da Cátia», «Os significados de ler e a sinestesia», «Entreter e entretanto», «Figuras de estilo numa frase do Novo Testamento (1 Coríntios, 13, 1)», «Orçador e orçamentista» e «A função do advérbio até numa frase».
3. A polissemia do verbo contrair com os seus valores positivos e negativos é explorada no apontamento de Sara Mourato, colaboradora do Ciberdúvidas, onde se parte do significado de «contrair matrimónio» para outros usos do verbo.
4. A identificação da expressão correta para designar o dia em que o trabalhador está autorizado a não comparecer ao trabalho está na base do apontamento da professora Carla Marques: «Tolerância de ponto» ou «tolerância de ponte»?» (divulgado no programa Páginas de Português, na Antena 2).
5. A situação linguística da Guiné-Bissau e a realidade do seu sistema de ensino abrem caminho à análise da professora universitária e linguista Margarita Correia (artigo publicado no Diário de Notícias e aqui divulgado com a devida vénia).
6. Estão abertas as inscrições para o curso Aprendizagem e Ensino do Português Língua Não Materna, promovido pela Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, na modalidade de ensino a distância (mais informações aqui).