1. No primeiro dos casos apresentados, deve ter-se em conta que a frase «Quem acredita sou eu» não pode, em termos de concordância verbal, ser analisada como «Quem acredita sempre alcança»: nesta, a oração relativa é sujeito de um verbo usado intransitivamente (alcançar), enquanto aquela constitui uma frase equativa ou identificacional, a qual permite ao verbo da oração subordinante (ser) concordar com o predicativo do sujeito (daí, a gramaticalidade de «Isso são ninharias», apesar de «isso» comportar-se como singular e ter a função de sujeito).
2. O pronome quem só pode ser anafórico, isto é, só pode ter antecedente, se for precedido de preposição (cf. M.ª H. Mira Mateus et al., Gramática da Língua Portuguesa, Lisboa, Editorial Caminho, 2003, pág. 663): «esta é a pessoa de quem te falei». Deste modo, quem não pode ser usado como sujeito ou complemento directo de uma relativa com antecedente: é, portanto, impossível — pelo menos, no âmbito da norma — aceitar sequências como *«Ela é a pessoa quem fez isso» ou «Ela é a pessoa quem encontrei ontem». O pronome quem só pode ser usado como sujeito ou complemento directo de relativas livres, isto é, de relativas sem antecedente expresso: «Quem espera sempre alcança»; «Quem vi ontem no restaurante passou por ti agora».
3. Assinale-se, contudo, que estas orações relativas livres que participam em frases equativas se agrupam com outras construções para entrar naquilo que a descrição linguística designa como construções clivadas. A frase «Sou eu que acredito nisso» é um caso de construção clivada, que já foi comentada noutras respostas anteriores.
4. Quanto a frases como «(Eu) Imagino de quem falas» e a sua distribuição pelas variedades do português, verifica-se, pelo menos em português europeu, a tendência, se não mesmo a necessidade, de ocorrer um antecedente para pronomes relativos preposicionados que sejam, por um lado, complementos do verbo da oração relativa e, por outro, introduzam essa oração relativa no contexto da sua subordinante:
1) ? «Imagino do que ele gosta/fala.»
2) OK «Imagino aquilo de que ele gosta/fala.»
3) ? «Imagino de quem falas.»
4) OK «Imagino a pessoa de que/quem falas.»
As dúvidas sobre a gramaticalidade de 1) e 3) parecem decorrer da significação do verbo imaginar. Se o verbo imaginar for entendido como «adivinhar» ou «pensar saber», a oração subordinada é interpretada como interrogativa indirecta, e as frases 1) e 3) tornam-se aceitáveis; contudo, quando o mesmo verbo é sinónimo de visualizar, a oração subordinada é encarada como relativa livre, determinando a agramaticalidade das frases.
Compreendem-se melhor as restrições de imaginar, no sentido de «visualizar», a partir da leitura de um estudo de Telmo Móia, A Sintaxe das Orações Relativas sem Antecedente Expresso (pág. 35), no qual se dão exemplos da incompatibilidade de conhecer e falar com uma relativa livre introduzida pelo relativo quem preposicionado (exemplos da fonte consultada):
5) *«O Paulo conhece a quem eu dei o livro.»
6) ?«O Paulo falou a quem eu dei o livro da sua viagem a África.»
Paralelo ao emprego de imaginar como «pensar saber», salienta-se o de ver (exemplos de Móia, op. cit., pág. 29):
7) «O professor viu quem fez o trabalho.»
8) «O professor viu o Paulo.»
Em 8), ocorre «o Paulo», sintagma nominal simples que substitui «quem fez o trabalho», em 7); em ambos os exemplos, o verbo ver é equivalente a «reparar em». Mas, se o pronome quem fizer parte de um constituinte preposicionado (oblíquo), apenas fica disponível a interpretação da subordinada como interrogativa indire{#c|}ta, e o ver significa «descobrir», «perceber» (exemplo de Móia, op. cit., pág. 28):
9) «O professor viu com quem o Luís esteve a conversar.»
Por outras palavras, em função do seu significado, ver selecciona ora uma relativa livre, podendo ser introduzida por quem sujeito ou objecto directo, se significar «reparar em», ora uma interrogativa indirecta, se tiver por sinónimo descobrir.
Em suma, as frases 1) e 3) são aceitáveis à luz de uma de duas interpretações possíveis de imaginar, as quais se verificam tanto no português brasileiro como no português europeu.