1. A cantora portuguesa A Garota Não recebeu a 1 de outubro o Globo de Ouro da SIC para a melhor intérprete. Agradeceu a distinção não com o habitual discurso, mas com um poema de sua autoria, que analisa de forma crítica alguns dos fatores que podem estar na base do sucesso, terminando com as seguintes palavras: «Há quem tenha muita sorte / A sorte, a mim, tem-me dado muito trabalho». Esta afirmação rapidamente se tornou viral nas redes sociais, chegando às páginas da comunicação social. Na sua aparente simplicidade, o enunciado faz assentar a sua intenção comunicativa na antítese entre dois conceitos: sorte vs. trabalho. O substantivo sorte (do latim sors, sortis) é equivalente a destino ou fado, referindo uma força superior que determina o rumo dos acontecimentos de forma inelutável; trabalho (de trabalhar, do latim tripaliare) designa uma tarefa que exige algum tipo de esforço. A oposição entre as palavras condensa duas formas de se atingir um dado objetivo: a via fácil, na qual tudo acontece naturalmente, sem esforço por parte da pessoa, e a via difícil, na qual o objetivo se atinge por meio de empenho contínuo e persistente e de sacrifício. Esta antítese junta ainda uma nota de ironia ao implicitar uma crítica a todos os que atingem o sucesso por um conjunto de fatores que não estão relacionados com a dedicação e a persistência, ou seja, que lá chegam pela via fácil e que, portanto, serão menos merecedores do triunfo. As inúmeras partilhas das palavras da cantautora mostram como muitas pessoas se identificaram com o que foi dito e, do ponto de vista linguístico, ilustram o caminho do que pode ser entendido como uma expressão idiomática, ou seja, uma expressão de uso comum cujo sentido ultrapassa o valor literal das palavras que a compõem. Neste caso, a afirmação condensaria uma significação equivalente a «o meu sucesso é fruto do meu empenho e não de um momento de fortuna ocasional».
As palavras sorte e trabalho estão na base de várias respostas disponíveis no Ciberdúvidas, que aqui recordamos: «Má sorte», «A expressão «toda a sorte de»», «O mérito, o brilho e... a sorte», «O trabalho e o ócio», ««Trabalho duro», «trabalho árduo»: solidariedades lexicais».
2. Qual a opção correta: pudico ou púdico? Esta é uma questão que se discute há mais de 100 anos e cujos contornos se analisam nesta resposta disponível no Consultório. Para além desta, ficam disponíveis na atualização outras seis novas respostas: «Arrogar e gostar + pronome se», «Os sufixos -ivo e -ório», «A pronúncia de saem e caem», «A métrica numa cantiga de D. Dinis», «Oração relativa e complemento oblíquo», «Os advérbios aqui, cá, lá e acolá». Por fim, regressamos ao tema da linguagem inclusiva, desta feita para responder a uma questão «Sobre as origens da linguagem inclusiva».
3. Serão os prefixos presentes nas palavras irracional e indispensável manifestações de um mesmo prefixo? Na sua rubrica semana, a professora Carla Marques analisa a variabilidade do prefixo in- na formação de palavras (rubrica divulgada no programa Páginas de Português, na Antena 2).
4. Em Portugal, o crescimento de locais de comércio geridos por estrangeiros tem levado ao aumento de letreiros / anúncios que exibem erros ortográficos e frases de sintaxe defeituosa ou, por vezes, quase impercetíveis. O consultor Paulo J. S. Barata apresenta, no Pelourinho, o caso do letreiro onde se pode ler «Este massa é tu gostas» (ver aqui).
5. Um registo final para os prémios atribuídos a autores portugueses:
– António Lobo Antunes foi o vencedor da 16.ª edição do Prémio Literário Fundação Inês de Castro pela obra O Tamanho do Mundo (notícia);
– Alice Vieira venceu o Prémio ibero-americano de literatura infantil e juvenil (notícia).