DÚVIDAS

«Pedir desculpas» vs. «apresentar desculpas»

Pergunta semelhante foi já respondida em 2003, por Marta Pereira, mas não tendo (eu) ficado convencido... decidi insistir. Espero que não levem a mal até porque, seguramente, nem todos os especialistas (não é o meu caso) estarão, sempre, de acordo sobre tudo.

Aqui vai: quando alguém pretende rogar perdão, solicitar indulgência, mostrar arrependimento ou suscitar absolvição por motivo de uma falha por si cometida, por algo que lhe pesa na consciência ... deve, forçosamente, «pedir desculpas»... ou pode, tão-somente, «apresentar desculpas»? «Apresento o meu mais profundo pedido de desculpas pelo acto que cometi», ou «apresento as minhas mais profundas desculpas pelo acto que cometi»?

Eu diria que só a primeira é que estará correcta... pois entendo, de forma empírica, que somente o sujeito ofendido é que pode, se assim entender, apresentar/outorgar as suas desculpas ao sujeito ofensor. Desculpá-lo, portanto. Perdoar. O sujeito ofensor deve solicitar/pedir que lhe concedam/outorguem/apresentem as respectivas desculpas ... mas deve, antes disso, pedir/rogar/requerer as mesmas. Porque se for o ente ofensor a «apresentar desculpas», diria até que se invertem os papéis, pois fica a clara impressão de que o ofendido é que está a precisar, ou à espera, de que alguém lhe transmita/dê/apresente/conceda as respectivas desculpas (por algo que, manifestamente, não cometeu). Uma completa inversão da realidade, no meu entender. Mas isto sou eu, um leigo na matéria, a pensar.

Qual é, por favor, o vosso entendimento?

Obrigado.

Resposta

A expressão «apresentar desculpas» é tão legítima como «pedir desculpas», porque a palavra desculpa não se comporta como perdão.

Com perdão, apenas quem foi paciente ou alvo de ação danosa pode «dar perdão», «conceder perdão».Com desculpa, o agente da ação danosa (ou quem tenha ou sinta responsabilidade por isso) tanto pode «pedir desculpa» como «apresentar desculpas», porque no primeiro caso «desculpa» é equivalente a «perdão», enquanto  no segundo é equivalente a «justificativa».

Note-se que o próprio verbo correspondente permite esta dualidade:

1. Ele desculpou o filho do mau comportamento/desculpou o mau comportamento do filho. [= «perdoou»]

2. O filho desculpou-se pelo mau comportamento. [= «justificou-se»; neste caso, o verbo torna-se reflexo]

Acrescente-se que o dicionário da Academia das Ciências de Lisboa regista como subentradas associadas a desculpa tanto a expressão «pedir desculpa» como «apresentar desculpas», dando-se a esta última, registada como equivalente a «solicitação de perdão», um tom mais formal. Semanticamente próximas, são ainda as locuções coloquiais «dar uma desculpa» e «arranjar uma desculpa», nas quais desculpa é sinónimo de escusa ou pretexto (cf. idem, ibidem).

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