Sabe-se que o emprego de «meia dúzia» ou simplesmente meia como sinónimo de seis é característico do português coloquial do Brasil (na comunicação telefónica), até porque já tem registo tanto em dicionários brasileiros como em dicionários elaborados em Portugal:
(1) «[meia é redução de «meia dúzia» e] empregado especialmente. no discurso falado para diferençar o som da palavra seis do da três, como, p.ex., na frase: o prefixo dois-meia-três (263) é dos telefones da zona central do Rio.» (Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, 1.ª edição brasileira, 2001)
(2) «meia3 [mɐ́jɐ]. numeral. (redução de meia dúzia). Brasileirismo. Designação coloquial para o número 6.» (Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea, Academia das Ciências de Lisboa, 2001)
O que é dito no exemplo 2 é ainda facilmente confirmável em dicionários em linha produzidos e mantidos em Portugal como o dicionário de português da Infopédia e no Dicionário Priberam da Língua Portuguesa.
Diga-se, no entanto, que meia não constitui uso do português de Portugal, país onde se distingue bem seis de três1. É também possível que vários falantes, provavelmente mais idosos, achem estranho que meia ocorra com o significado em apreço, situação que poderá ser ultrapassada com o recurso à palavra seis. Entrando já em juízos éticos, é claro que são sempre de reprovar reações verbais agressivas, que relevam de atitudes intolerantes ou até xenófobas, como a que parece ter sido a descrita na pergunta.
Em suma, em Portugal, muitas pessoas compreenderão o que um cidadão brasileiro quer dizer com meia (dúzia) em lugar de seis. Para evitar equívocos, também é possível a qualquer falante de português adotar certos usos de uma variedade não materna. Assim como um brasileiro residente em Portugal pode achar preferível utilizar sistematicamente seis, quando fala com portugueses, também acontecerá certamente que um português a viver no Brasil se sinta levado a dizer meia em lugar de seis, num processo de adaptação à cultura local.
1 Do ponto de vista da descrição dialetal, no Brasil, observa-se a tendência para ditongar as vogais seguidas de -s ou -z em sílabas finais tónicas. Por exemplo, rapaz pode soar "rapais"; e três é pronunciado como "treis", exibindo o mesmo ditongo que se ouve em seis. Este fenómeno fonético está descrito por gramáticos brasileiros, como é o caso de Evanildo Bechara, que, na sua Moderna Gramática Portuguesa (Rio de Janeiro, Editora Lucerna, 2002, pág. 78), deixa esta observação: «Normalmente ditongamos, pelo acréscimo de um i, as vogais tônicas seguidas de -z ou -s. Assim não fazemos diferença entre pás, paz e pais; más e mais; rapaz e jamais; vãs e mães. Os poetas brasileiros nos dão bons exemplos destas ditongações.» Sobre a descrição deste tipo de ditongação e do seu enquadramento dialetal, ver Dermeval da Hora e Maria de Fátima S. Aquino, "Da fala para a leitura: análise variacionista", Alfa: revista de linguística (São José Rio Preto) vol.56 no.3 São Paulo 2012.