DÚVIDAS

«A porta abriu-se» vs. «a loja abriu»

Com sujeito constituído por substantivo inanimado, fala-se a voz passiva das seguintes formas:

(1) a porta se abriu

ou

(2) a porta abriu;

(3) a loja abriu cedo

e

(3) a loja se abriu cedo.

Percebo que, quando nos referimos a objetos, o uso da partícula se é mais comum. Contudo, quando nos referimos a estabelecimentos, o uso da partícula se é menos comum. Há lógica? No que se refere a esse assunto, as duas formas são gramaticais? Elas têm diferença de significado? Prefere-se uma a outra na fala coloquial? Quais são as implicações do uso ou não uso do se em tais casos?

Obrigado pela atenção.

Resposta

As opções apresentadas pelo consulente são todas corretas. A diferença está na opção por uma construção passiva com -se impessoal ou por um uso intransitivo do verbo abrir.

As frases apresentadas pelo consulente são próximas das construções impessoais ou de sujeito indeterminado, que, em português, se podem realizar como1:

(i) frases com sujeito nulo e verbo na 3.ª pessoa do plural:

    (1) «Abriram a porta.»

    (2) «Abriram a loja cedo.»

(ii) frases com -se impessoal:

    (3) «Abriu-se a porta.»

    (4) «Abriu-se a loja cedo.»

(iii) frases passivas pronominais:

    (5) «Abriram-se as portas.»

    (6) «Abriram-se as lojas.»

Assim, em (i), o sujeito não está expresso na frase, mas poderá ser recuperado pelo contexto. A diferença entre (ii) e (iii) reside no facto de o sujeito semântico de (ii) ser equivalente a alguém. Em (iii) o sujeito é portas ou lojas2. Embora estes termos não desempenham a função de agente do evento descrito, tem a função de sujeito da frase passiva, desempenhando a função semântica de paciente («A porta / a loja foi aberta por alguém»).

Pode optar-se por usar o verbo abrir como impessoal, o que implica que não seleciona nenhum complemento. Neste uso, o verbo  significa «começar a funcionar»:

(7) «A porta abriu (às sete).»

(8) «A loja abriu cedo.» 

Disponha sempre!

 

1. Cf. Duarte in Raposo et al., Gramática do Português. Fundação Calouste Gulbenkian, pp. 446-447.

2. As palavras foram colocadas no plural para assinalar a sua ação enquanto sujeito frásico

 

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