A pergunta parece referir-se à história do futuro do indicativo (no Brasil, futuro do presente do indicativo), mais precisamente ao desenvolvimento das terminações -emos e -eis da 1.ª e 2.ª pessoas do plural; exemplos: cantaremos, cantareis (1.ª conjugação); comeremos, comereis (2.ª conjugação); partiremos, partireis (3.ª conjugação). Estes sufixos flexionais remontam às 1.ª e 2.ª pessoas do plural do presente do indicativo do latino habere, isto é, habemus e habetis, as quais evoluíram para havemos e haveis, no português contemporâneo, formas que ocorrem quando o verbo haver é empregado como auxiliar: «havemos de cantar», «haveis de partir». Como explicar que, por um lado, havemos e haveis, e, por outro, -emos e -eis têm origem comum?
Acontece que a flexão do futuro do indicativo se explica historicamente pelo latim vulgar. É o que faz, por exemplo, o linguista galego Manuel Ferreiro, na sua Gramática Histórica Galega (Laiovento, 1996, p. 297), que, relativamente à génese do futuro do indicativo e à sua evolução semântica e morfológica, propõe uma descrição também válida para o português, pois, como se sabe, até ao século XIV, falava-se a mesma língua ou praticamente na Galiza e em Portugal (o * assinala uma forma hipotética, que não está atestada):
«[...] [A] tendencia analítica do latín vulgar utilizou unha perífrase que xa estaba en uso para formar un novo tempo de futuro: AMARE HABEO 'hei de amar' AMARE HABES 'has de amar' O cambio semántico non era difícil, xa que o que se debe facer hai que facelo no futuro; deste xeito, utilízanse as formas, xa reducidas no latín vulgar, do presente de HABERE (onde puido influír a analoxía con DAS, DAT ou STAS, STAT..., ademais da redución fonética pola súa función como auxiliar:): *AIO, *AS, *AT, *(AB)EMUS, *(AB)ETIS, *ANT [...].»
Historicamente, as formas sufixais -emos e -eis são, portanto, variantes de havemos e haveis, respetivamente e surgiram precocemente, muito provavelmente no latim vulgar. Numa língua próxima do português, o castelhano, observa-se uma situação semelhante embora com resultados diferentes; com efeito, neste idioma existiram também formas divergentes para a 1.ª e 2.ª do plural: hemos/habemos (esta última pouco ou nada usada na atualidade); heis (desaparecida)/habéis (esta é hoje a única disponível para a 2.ª pessoa do plural – cf. "La asimetría hemos habéis").