1. Em Portugal, coincidindo com a entrada do verão (em 21 de junho), a pandemia recobra força e obriga o governo a fechar a Área Metropolitana de Lisboa, que na segunda quinzena de junho entrou na região vermelha de análise da evolução da pandemia. Deu-se, portanto, um «passo atrás» no desconfinamento e diz-se que Lisboa está «no vermelho», expressões que a rubrica A covid-19 na língua regista a par de outras, num total de oito entradas: «testes recomendados», a respeito de eventos familiares que reúnam mais de 10 pessoas(casamentos ou batizados), eventos desportivos e culturais, bem como serviços públicos e empresas com mais de 150 trabalhadores; «trabalhadores de serviços domésticos», a propósito da crise que afeta esta atividade; a designação «plataformas digitais de trabalho», em sinal de novos modos de vida e de a ganhar que a pandemia vai instalando; as frases «[O] dia em que a esperança se converte[u] em confiança» e [Os] milhões da bazuca... ainda a tempo?, alusivas aos 16,6 milhões de euros que, até agosto de 2026, Portugal receberá sob certas condições; e, por último, «sem máscara na rua», dando conta da situação contrária à vivida em Portugal, a que se verifica na França e na Espanha, onde o uso de máscara no exterior deixou de ser obrigatório.
Na imagem, Milho ao Sol (Museu Grão Vasco), de José Malhoa (1855-1933).
2. No Consultório, são sete as respostas subordinadas aos seguintes tópicos: o funcionamento do marcador pois no discurso; o uso de aonde numa oração relativa; a justificação do acento gráfico em vocábulos como mágoa ou polícia; a associação do pronome se à construção formada por pretender e infinitivo («pretendeu-se determinar»); o anglicismo crumble; a grafia dos topónimos começados por A de, como A dos Bispos (Vila Franca de Xira); e a concordância de adjetivos compostos (azul-escuro) com a palavra cor.
3. Na rubrica O Nosso Idioma, um apontamento da professora Carla Marques apresenta uma breve análise dos valores do uso na imprensa de diferentes verbos e substantivos mobilizados pela situação mediática que envolve a Câmara Municipal de Lisboa na divulgação de dados pessoais enviados à Embaixada da Federação da Rússia, respeitantes aos três imigrantes russos em Portugal promotores de uma manifestação contra a prisão, em Moscovo, do oposicionista Alexei Navalny .
4. Mediático foi igualmente o desaparecimento do pequeno Noah na manhã de 16/06/2021, na região de Proença-a-Velha (Castelo Branco). Felizmente, tudo não passou de um prolongado susto que chegou ao fim 36 horas depois, quando a criança, de dois anos e meio, foi encontrada com vida. A projeção mediática do desfecho ocasionou a ativação do vocabulário relevante para o caso: Noah foi «encontrado», obviamente porque andava perdido, e, «salvo», porque deixou de ter a vida em perigo; também se disse que foi «resgatado», já que a uma operação de salvamento também se chama resgate (cf. Infopédia), com o seu quê de superlativa metáfora, nome a que corresponde o verbo resgatar, «salvar da morte ou ruína», conforme definição do dicionário da Academia das Ciências de Lisboa (que dá como abonação deste uso a frase «o banheiro já resgatara muitas vidas ao mar»). Nas reportagens televisivas ouvia-se ainda uma jornalista falar de «fazer buscas», que é expressão correta e corrente, enquanto um soldado da Guarda Nacional Republicana falava em «batida», palavra que, no contexto, pôde afigurar-se estranho. Com efeito, batida é termo da arte venatória, ou seja, da caça, empregado no sentido de «ação de avançarem (os caçadores) metodicamente pelo terreno, em linha e contra o vento, para abater a caça miúda que se levantar» (Dicionário Houaiss); além disso, pode significar um tipo de ação policial,cujo alvo está longe de ser um bebé inocente: «diligência policial realizada em lugares considerados suspeitos com o fim de busca, apreensão ou prisão» (ibidem). Mas não se pode dizer que se trate de impropriedade vocabular: é que batida também tem registo como «ato ou efeito de percorrer (povoação, mato, caminho, área) em exploração, reconhecimento, observação etc.» (ibidem).
5. Registo ainda de atividades e novidades na linguística ou filologia, com interesse para a investigação e ensino do português:
– O II Congresso Internacional em Variação Linguística nas Línguas Românicas, organizado pelo Centro de Línguas, Literaturas e Culturas da Universidade de Aveiro, que decorre em 22, 23 e 24 de junho de 2021.
– A edição de 2021 do simpósio internacional da associação Tropo UK (Associação de Professores e Invstigadores da Língua Portuguesa), com o título Diversidade linguística do português: oportunidades e desafios pedagógicos e organização da Universidade de Glasgow (programa aqui e inscrições aqui).
– O anúncio do acesso livre à digitalização de dois dos códices mais importantes do período galego-português, o Códice Rico e o Códice de los Músicos, que estão guardados na Real Biblioteca de São Lourenço do Escorial, em Madrid, e contêm as Cantigas de Santa Maria do rei Afonso X de Castela e Leão (1221-1284), avô do rei português D. Dinis (1261-1325).
– E o movimento que em Olivença (hoje na província espanhola de Badajoz) está a organizar-se para declarar o português como bem de interesse cultural para a cidade.
6. Nos domínios da investigação e reflexão jornalísticas, referência a iniciativas que exploram aspetos culturais associados a ambientes de língua portuguesa:
– A série documental da RTP Gente da Minha Rua, sobre o quotidiano de imigrantes de ascendência africana com vida já estabilizada em Portugal.
– Os registos áudio de Línguas, sotaques e dialetos de Lisboa, da autoria da jornalista Catarina Reis, no diário digital A Mensagem.
7. A pandemia tem contribuído para a deterioração da saúde mental das populações. Justifica-se, portanto, aqui assinalar a 1.ª Tertúlia do ciclo "O que nos dizem os livros sobre saúde mental", em 21 de junho de 2021, das 17h00 às 18h30*, a propósito do livro Maria Adelaide Coelho da Cunha: Doida Não e Não!, de Manuela Gonzaga e com organização da DDS/Divisão para a Participação e Cidadania e Divisão da Rede de Bibliotecas (formulário de inscrição aqui).
* Hora oficial de Portugal continental.
8. Nos três programas dedicados pela rádio pública portuguesa.à língua portuguesa, são temas salientes:
– A implantação do português em Timor-Leste, resistindo à concorrência do indonésio (bahasa Indonesia) e do inglês da Austrália, no programa Língua de Todos (RDP África, sexta-feira, 18/06, pelas 13h20**), e a natureza pluricêntrica do português, a par de um apontamento sobre a expressão «direitos fundamentais», em Páginas de Português (Antena 2, no domingo, 20/06, 12h30*) – ambos programas produzidos pela Associação Ciberdúvidas da Língua Portuguesa.
– A linguagem do racismo, de 21 a 25 de junho, no programa Palavras Cruzadas, também na Antena 2 e conduzido pela jornalista Dalila Carvalho (segunda a sexta-feira, às 9h50 e 18h20 **).
**Hora oficial de Portugal continental.
9. Dois últimos registos de atualidade para a atribuição ao escritor Valter Hugo Mãe do Grande Prémio de Romance e Novela da Associação Portuguesa de Escritores, com o romance Contra Mim, publicado no final de 2020 pela Porto Editora; e para a professora de Filosofia na Escola Secundária de Amarante, Maria Elsa Cerqueira, vencedora deste ano do Global Teacher Prize Portugal, para muitos «Nobel da Educação».