Digamos que a pressão de um idioma em situação de hegemonia nacional ou internacional se mede pelas palavras dele importadas pelas línguas coexistentes. Até há setenta ou sessenta anos eram os galicismos (mas não só...) a dominar o discurso das elites ou dos candidatos a elas no Brasil e em Portugal, para escândalo de puristas, lexicógrafos ou gramáticos. Hoje, o inglês impera em todas as áreas de atividade e neutraliza a variedade linguística mundial, quando se torna também o veículo por excelência de uma cultura globalizada.
Vêm estas considerações ao encontro de dois artigos incluídos na presente atualização, que, em comum, têm o tema do uso e abuso de anglicismos em Portugal. Assim, no Pelourinho, Paulo J. S. Barata lamenta as opções de uma estratégia publicitária cuja fixação pelo anglicismo tem um efeito mais duvidoso do que eventualmente perverso. Em O Nosso Idioma, Sandra Duarte Tavares confirma a omnipresença das palavras inglesas no quotidiano português. Mas, na mesma rubrica, uma crónica de Edno Pimentel reconduz-nos à língua de sempre, a propósito da regra de concordância verbal com o pronome relativo quem (texto original publicado no semanário angolano Nova Gazeta em 9/01/14). Finalmente, no consultório, esclarecem-se dúvidas sobre semântica lexical, flexão verbal e sintaxe.
Como já noticiámos aqui, a Vodafone Portugal começou a transição para o Acordo Ortográfico de 1990 (AO) em 1/01/2014, à semelhança das duas outras operadoras de telecomunicações em Portugal, a TMN e a Optimus1. Noutras áreas em Portugal, este processo de adoção é extensível a outros casos, como acontece com o Millennium/BCP e o Banco Espírio Santo (BES), conforme informação no fundo das páginas principais dos respetivos sítios eletrónicos. Para um balanço das adesões à nova grafia em Portugal, até 2013, pode consultar-se uma lista disponível no blogue Muro das Lamentações, de José Cunha Oliveira (no fim do artigo "Uma discussão absurda e extemporânea").
Entretanto, assinale-se o conjunto de cinco artigos escritos pelo deputado português (PS) Carlos Enes e publicados entre 2 e 9 de janeiro no jornal Açoriano Oriental, nos quais, numa perspetiva favorável ao AO, se descreve e discute o que tem sido o processo da sua aplicação. Paralelamente, aguarda-se a discussão na Assembleia da República da petição pública que reclama a desvinculação de Portugal do AO, bem como a apreciação de um projeto de resolução subscrito pelos deputados Ribeiro e Castro, Michael Seufert (ambos do CDS) e Mota Amaral (PSD), que propõem a criação de um novo grupo de trabalho sobre a aplicação do referido acordo (recorde-se que um grupo anterior, já extinto, esteve ativo entre janeiro e julho de 2013).2
1 Em comentário na comunicação social e nas redes sociais, há quem sustente que o nome próprio Optimus há de perder o p, tal como acontece com a palavra ótimo, que se inclui no léxico comum. Não é isso que prevê o Acordo Ortográfico de 1990 (Base XXI), conservando um critério da norma que o antecedeu, a do Acordo Ortográfico de 1945 (Base L) segundo o qual «pode manter-se a grafia original de quaisquer firmas comerciais, nomes de sociedades, marcas e títulos que estejam inscritos em registo público». Assim se compreende que, apesar de se escrever açoriano, o nome de uma empresa de seguros apresente a grafia açoreana: Açoreana Seguros.
2 Sobre notícias acerca da possibilidade da suspensão do AO no Brasil, convém esclarecer que neste país decorre, como em Portugal, o período de transição, de acordo com o Decreto n.º 6583, de 29 de Setembro de 2008. (cf. artigo de Mário Vilalva, o embaixador do Brasil em Portugal). Também em relação a afirmações segundo as quais, no Brasil, o Senado teria recusado o AO após aceitação da proposta de dois professores brasileiros, Ernani Pimentel e Pasquale Citro Neto, para a revisão radical da ortografia do português, importa sublinhar que nem o Senado brasileiro se pronunciou, como um todo, contra ou a favor do AO, nem este órgão poderia vincular ou desvincular o Brasil de um tratado internacional, ratificado e em vigor, como o AO.
No programa Língua de Todos de sexta-feira, 10 de janeiro (às 13h15* na RDP África; com reptição aos sábados, depois do noticiário das 9h00*), entrevista-se a linguista moçambicana Inês Machungo, coordenadora do Observatório dos Neologismos de Moçambique. O Páginas de Português, na emissão de domingo, 12 de janeiro (às 17h00* na Antena 2), põe em foco os temas da identidade linguística e da promoção da língua portuguesa; para isso, são convidados Vitor Fernandes Barros, autor, com Lourivaldo Martins Guerreiro, do Dicionário de Falares do Alentejo, recentemente reeditado em Portugal, e Ataliba Teixeira de Castilho, professor da Universidade de São Paulo e consultor do Museu da Língua Portuguesa.
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