1. Se o significado das palavras fosse espelho das coisas e das situações, como seria simples falar da vida. Só que o léxico não é mero repertório de etiquetas: na verdade, cada vocábulo marca também crenças e atitudes características de uma cultura e definidoras de perspetivas que ditam decisões e rumos de ação com inevitável impacto social e político. O consultório ilustra isso mesmo, com uma resposta sobre o uso de refugiado, palavra frequentemente rasurada nas notícias, que a confundem com o termo migrante (ou imigrante), em referência mais anódina aos sírios e iraquianos que fogem à guerra.* Na rubrica Nosso Idioma, o jurista português Miguel Faria de Bastos tece algumas considerações à volta da noção jurídica de refugiado. E, já que se fala de impropriedades do discurso mediático, em contexto político, convém mencionar igualmente outros equívocos detetáveis no que se diz e escreve à volta da campanha para as eleições legislativas que se realizam em Portugal, no dia 4 de outubro p. f. Recordemo-los: o abuso de "plafonamento," em lugar de «teto ou limite (de despesas, de crédito)»; o frente a frente, que ocorre indevidamente hifenizado; a "precaridade", uma deturpação já clássica de precariedade; a má utilização da sigla da coligação Portugal à Frente (PàF, e não "PAF", tal como Banco de Portugal é BdeP, e não "BDP")**.
* Observe-se que a página de Facebook que promove o apoio a estes refugiados mostra um erro: lê-se aí "bemvindos", quando a forma correta é bem-vindos.
** Como observa o Instituto Português da Qualidade, «[e]m regra, não se representam artigos, preposições, conjunções nem advérbios na sigla. As siglas não deverão, em princípio, incluir as iniciais». No entanto, têm ocorrido algumas mutações (ler esta resposta), muitas vezes em consequência da proliferação de siglas e da necessidade de as diferenciar, as quais permitem inserir as iniciais de palavras das referidas classes gramaticais, mas representadas com inicial minúscula.
2. No consultório, espaço ainda para um regionalismo – «ao dependuro» –, que Camilo Castelo Branco não se esqueceu de exibir na vertigem da sua prosa torrencial. Na Montra de Livros, apresentam-se três obras destinadas a quem aprende português ou pretende conhecê-lo bem para o falar e escrever com correção. Temos, portanto:
– no âmbito da aprendizagem do português como língua estrangeira, uma nova versão adaptada para alunos de nível intermédio, da autoria de Ana Sousa Martins, da extraordinária saga que é a Peregrinação de Fernão Mendes Pinto (c. 1510-1583) ;
– no intuito de abrir a gramática a todos, agora com novos casos sujeitos ao crivo do juízo normativo, Sandra Duarte Tavares regressa com 500 Erros mais Comuns da Língua Portuguesa;
– de Sandra Duarte Tavares também, em coautoria com Sara de Almeida Leite, Pares Difíceis da Língua Portuguesa, um dicionário de parónimos que retoma uma tradição da gramática prescritiva que andava esquecida em Portugal.
3. A atividade do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa não se confina a estas páginas e busca constantemente formas de colaboração que se traduzam em iniciativas em prol do esclarecimento e da divulgação de temas da nossa língua comum, onde quer que ela se fale. É o caso de Mambos da Língua – O tu-cá-tu-lá da língua portuguesa, programa produzido pelo Ciberdúvidas para a Rádio Nacional de Angola, que tem novos episódios: o que significa «ter minhocas na cabeça» (83.º episódio)? E qual é o plural de gravidez (84.º episódio)?
Os 500 Erros mais Comuns da Língua Portuguesa é o título do livro agora editado por Sandra Duarte Tavares, colaboradora do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa. Escreve a autora: «Já deu por si a dizer "quaisqueres que sejam os filmes, de certeza que vou gostar" ou "hades me explicar porque te fostes embora"? Que hoje está "um dia solarengo" ou que sentiu "um mau-estar repentino"?» O programa Língua de Todos de sexta-feira, 18 de setembro (às 13h15*, na RDP África; com repetição no sábado, 19 de setembro, depois do noticiário das 9h00*) conversou com Sandra Duarte Tavares acerca deste seu novo livro.
Como interpretar os detalhes da Questão Coimbrã? Como fazer a sua história? Que ligação estabelecer entre a poesia e o discurso crítico a partir da releitura das Odes Modernas, de Antero de Quental, figura de referência da Geração de 70 do século XIX? São estas as questões levantadas pelo Páginas de Português de domingo, 20 de setembro (às 17h00, na Antena 2) em conversa com Andrea Ragusa e Gustavo Rubim, organizadores do colóquio Antero e a Cultura Crítica do século XIX, que, assinalando o 150.º aniversário da Questão Coimbrã, se realiza na Biblioteca Nacional de Portugal, em Lisboa, de 28 a 30 de Setembro de 2015 (mais informação sobre esta iniciativa aqui).
* Hora oficial de Portugal continental, ficando disponível também via Internet, nos endereços de ambos os programas.