«Sem se importar com a tradução mais óbvia – o vulgaríssimo «tecto» – o "plafond" montou casa para toda a família: o “plafonamento”, o “plafonado” e o “plafonar” já estão instalados; aguarda-se para breve a chegada dos demais parentes». Texto publicado no diário “i” de 27/04/2012, à volta de um modismo que medrou nos media e na boca dos políticos portugueses. Manteve-se a grafia de 1945, seguida ainda pelo jornal. Titulo da responsabilidade do Ciberdúvidas, adaptado a esta rubrica.
Ar redondo e afrancesado, insinuou-se entre nós, utilizando como aliado e agente o mesmo economês que em geral nos traz palavras de origem inglesa, mas que, para provar que o dinheiro não tem pátria, de vez em quando importa um galicismo. Foi assim que “plafond” medrou e ganhou sucessivamente os diários e semanários económicos, os jornais de grande expansão, a rádio, a televisão e a boca dos políticos [portugueses].
Sem se importar com a tradução mais óbvia — o vulgaríssimo «tecto» — o “plafond” montou casa para toda a família: o “plafonamento”, o “plafonado” e o “plafonar” já estão instalados; aguarda-se para breve a chegada dos demais parentes, entre eles a “plafonabilidade”, a “plafonidade”, a “plafonice”, o “plafonável”, a “implafonabilidade” e a “plafonarização”.
Em meio a tudo isto, o «tecto», coitado, jaz esquecido, sem abrigo e sem tecto, apesar de registado pelo Dicionário da Academia [das Ciências de Lisboa] como sinónimo perfeito de “plafond”: limite de despesas permitidas, limite de crédito autorizado. Sempre considerado um galicismo, “plafond” tem (no Dicionário) uma forma aportuguesada: «plafom». Assim mesmo, com “m”. Vamos ver quem a utiliza em primeiro lugar. Uma sugestão: «Ó sr. Coelho, o plafom da casa está a ruir sobre as nossas cabeças!»
N. E. (10/09/2015) – Sobre o galicismo plafonamento, atente-se no seguinte comentário da autoria do jornalista Pedro Santos Guerreiro, no Expresso Diário de 10 de setembro de 2015, a propósito do uso de dois derivados desta palavra no contexto da campanha para as eleições legislativas de 4 de outubro de 2015 em Portugal:
«[No debate televisivo entre António Costa e Pedro Passos Coelho] (...) quando se quis aprofundar o relevantíssimo tema das pensões, «plafonamento horizontal» para cá, «plafonamento vertical» para lá e ninguém percebeu nada.
(Em três parágrafos. Plafonamento significa criar um limite tanto nos descontos dos trabalhadores para a Segurança Social, como nas pensões que esses trabalhadores irão receber quando se reformarem. Plafond quer dizer, aliás, «teto» em francês.
«Plafonamento horizontal», como defende o PSD para novos trabalhadores, aplica-se apenas a ordenados mais altos, sendo definido um valor de salário a partir do qual os trabalhadores deixam de estar obrigados a descontar para a Segurança Social. Se, por exemplo, o Estado definir o plafond nos 2600 euros e o senhor Joaquim ganhar 3000 euros por mês, pode descontar para a Segurança Social apenas sobre os 2600 euros e optar por poupar a parte relativa aos 400 euros remanescentes em fundos privados. Toda a gente que ganhe até esses 2600 euros desconta integralmente para a Segurança Social. É isto que o PS acusa de ser a privatização da Segurança Social.
«Plafonamento vertical» aplica-se a todos os rendimentos, passando uma parcela dos descontos a ser feito não para o sistema público de pensões mas para fundos privados. Ganhem 3000 ou 600 euros, o trabalhador desconta uma parte para fundos privados. É isso que o PSD acusa o PS de estar a promover encapotadamente, quando propõe uma baixa da taxa contributiva para todos os trabalhadores, encorajando-os a poupar em fundos privados para complementar a pensão futura.)»
[Pedro Santos Guerreiro, "Expresso Diário" de 10 de setembro de 2015, sobre o emprego dos termos «plafonamento horizontal» e «plafonamento vertical», por parte do presidente do PSD e primeiro-ministro português, Pedro Passos Coelho, no frente a frente televisivo com o líder do principal partido da oposição, António Costa, realizado no dia 9/08/2015]
In jornal "i", de 27 de abril de 2012, na coluna semanal do autor, "Ponto no i" .