A estupefação da turma – alguns alunos com idade de ainda se lembrarem do que se ensinava no «tempo do colono» – assentava, afinal, num outro equívoco... bem mais pequenino. Crónica do autor na sua coluna "Professor Ferrão", do semanário angolano Nova Gazeta, de 13/03/2014.
Os alunos quase que me enxotavam da sala, depois de ter dito a uma estudante que casebre não era ‘diminuitivo’ de casa. O que os intrigava ainda mais era que, nas classes anteriores, aprenderam que além de «casinha» e «casota», quando quisessem exprimir a pequenez de casa, podiam usar também «casa pequena» ou «casebre».
«Como é que hoje o professor nos diz que a nossa ideia não está correcta?», pergunta uma estudante indignada.
A turma era composta por quase 50 por cento de senhoras e senhores com mais de 50 anos e, às vezes, pediam-me mesmo para ter cuidado com o que aprendemos nos nossos dias, pois era assim que «muitos professores do tempo do colono ensinavam».
«Professor, desculpa, mas… o professor já tem 40 anos?», pergunta a estudante mais velha da sala. «Não é por mal, professor. O meu filho também estuda aqui nesta escola, no período da tarde, e também aprendeu isso que todos nós estamos a dizer», explica.
Para aliviar o mau clima que se vivia na sala, um outro estudante, o senhor Sebastião, um dos mais ponderados da turma, sugere que eu estivesse equivocado e pediu mesmo que lhes mostrasse uma gramática que justificasse os meus argumentos.
Eram 65 alunos contra um – eu. Mas era normal tal equívoco, basta olhar para o verbo ao qual a palavra em discussão, ‘diminuitivo’, se associa, «diminuir», e compreendemos logo.
«Ou, então, professor, as coisas mudaram e as gramáticas daquele tempo já estão ultrapassadas? É possível, não é, professor?», sugere uma estudante.
Apesar dessa relação etimológica existente entre as duas palavras, chama-se/pronuncia-se «diminutivo» à palavra formada com um sufixo e expressa a ideia de pequenez ou de valores afectivos.
A confusão, permitam-me a expressão, começa quando se pensa no ‘i’ presente em ‘diminuir’. Esse grau dos substantivos – ‘di-mi-nu-ti-vo’ – não tem ‘i’, repita-se. Não é em vão que se disse que “casebrenão é ‘diminuitivo’ de casa”, mas sim «diminutivo».
«Oooh, professor. É só mesmo por causa do ‘i’?!», exclamaram os mais velhos em coro.
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in semanário Nova Gazeta, de Luanda, publicado no dia 13 de março de 2014 na coluna do autor, Professor Ferrão. Manteve-se a grafia anterior ao Acordo Ortográfico, seguida ainda em Angola.