DÚVIDAS

Casos (mais controversos) da prevalência do critério fonético no AO90

Não concordo muito que se dê primazia à fonética em detrimento da etimologia, embora assuma naturais evoluções linguísticas e esteja disposto a compreender melhor o polémico "N.A.O." [Novo Acordo Ortográfico]... Ora, mais até do que todas as outras alterações inerentes à entrada em vigor do dito acordo, as que mais "confusão"/relutância/"receio" me causam e para as quais gostaria de obter, se possível, justificação (ou, pelo menos, reflexão conjunta) são:

— Supressão do acento circunflexo nas formas verbais crêem, dêem, lêem e vêem, etc.;

— Supressão do acento agudo na forma verbal pára, tornando-a indistinta da preposição para (!);

— Supressão do acento circunflexo em pêra e pêlo, por ex., tornando ambos os termos indiferenciados das preposições pera (ainda que arcaica) e pelo.

E qual a lógica de manter o acento circunflexo em pôde (do verbo poder) e pôr, distinguindo ambas as palavras da forma verbal pode e da preposição por e, ao mesmo tempo, avançar com a supressão do acento agudo de pára!?

E não será demasiado radical/precipitado alterar completamente a grafia (e consequente imagem mental) das palavras assumpção para assunção e peremptório para perentório!?

E porquê, por ex., a estranha grafia windsurfe, que mais parece um "cruzamento" forçado de português com inglês...? Sou apologista do anglicismo windsurf ou então tenta-se aportuguesar completamente o termo (ou, pelo menos, arranjar-lhe um equivalente), não?

Obrigado a todos e espero não ferir susceptibilidades e/ou ser mal interpretado, mas, acima de tudo, defendo a minha língua!...

Resposta

Creem, deem, leem, veem

A supressão do acento não causa qualquer problema neste caso.

Pára e para

Concordo consigo que o acento em pára deveria ter ficado opcional, como em fôrma/forma, amámos/amamos, dêmos/demos.

Pêra/pera, pêro/pero

Não há qualquer inconveniente na supressão do acento, porque as formas que poderiam fazer confusão já não se usam.

Pôde/pode

O acento em pôde é importante para distinguir bem o presente do passado, o que pode (agora e para o futuro, não no passado) ser muito relevante em documentos oficiais.

Assunção, perentório

A queda das consoantes mudas não tem grande mal nestas palavras. Já o mesmo não digo em corrector (de correcção) e corretor («intermediário»). A verdade, é que, há muito, a grafia corretor tem sido única no Brasil, pelos vistos sem grandes problemas.

Windsurfe

Esta grafia está assim registada no Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras (2009), adaptação do inglês windsurf. Note que a letra W passou, no novo AO, a figurar no alfabeto da língua portuguesa e já representa a semivogal [w] em, por exemplo watt. Windsurfe não escadaliza se for pronunciada [su], como o dicionário da Academia 2001 preconiza para surfista. Se não for assim pronunciada, contraria a índole da língua; e seria, então, preferível escrever-se "windsarfe", da mesma forma que, por exemplo, o citado dicionário recomenda nailon para o inglês nylon.

Nota final: que venha o  VOLP PE, para que todas estas dúvidas sejam esclarecidas e haja um vocabulário que faça lei em Portugal.

Ao seu dispor,

ISCTE-Instituto Universitário de Lisboa ISCTE-Instituto Universitário de LisboaISCTE-Instituto Universitário de Lisboa ISCTE-Instituto Universitário de Lisboa