1 – A função descritiva da linguagem atém-se à consideração exclusiva do conteúdo informativo do enunciado, a partir do qual podemos dizer que o enunciado é verdadeiro ou falso. A concepção descritivista da linguagem dita que os enunciados comunicam estados de coisas do mundo e por esse facto são passíveis de ser descritos em termos de verdade ou falsidade (semântica vericondicional).
Nesta medida, a noção de verdade pressupõe uma conformidade com os estados reais ou possíveis de uma dada área da realidade.
Uma proposição – composta por uma referência (grupo nominal) e uma predicação – é verdadeira se (e apenas se) denota um estado de coisas que existe de facto no mundo que a proposição se propõe descrever.
Preside a estas concepções teóricas o princípio de que informar é o acto linguístico fundamental: falamos para trocar conhecimentos, e todos os conteúdos são ditos explicitamente.
Austin (1962) e Searle (1969) foram os autores que primeiro se opuseram a este princípio: segundo as suas propostas, os enunciados não são susceptíveis de ser avaliados em termos de verdade ou falsidade, mas em termos de eficácia ou fracasso. Nesta nova ordem teórica, a enunciação tem por função primordial transformar as relações que existem entre os interlocutores.
Veja-se o caso de um enunciado interrogativo: a interrogação não é encarada como a expressão de um desejo de saber, mas como um tipo de enunciado que tem por função instaurar a obrigação de o alocutário (destinatário) continuar o discurso.
Atente-se ainda nos dois enunciados abaixo:
a) O Zé veio.
b) Até o Zé veio.
Os dois enunciados têm o mesmo conteúdo proposicional, mas com o enunciado b) o locutor não quer apenas informar o alocutário da vinda do Zé, mas utiliza a vinda do Zé para justificar uma certa conclusão, ou seja, para fazer com que o alocutário aceite algo.
2 – As propriedades do signo lingu[ü]ístico/lexema/palavra* são o significante, o significado e o referente.
O significado é a soma virtual de todos os empregos de uma palavra. Como pode o linguista fazer essa operação? Associa o significado a um dos empregos da forma, considerado como típico ou mais frequente. Assim, a noção de “significação” é uma abstracção do lingu[ü]ista: decidir qual a significação de uma forma fora das ocorrências concretas e particulares dessa forma (“contexto nulo”) é passar do terreno da experiência e fazer uma hipótese. Toma-se então a língua em estado virtual.
O sentido de uma palavra (ou de um enunciado) inclui o facto de essa forma ter sido objecto de enunciação num momento e espaços precisos. Mais: a partir do significado é possível prever o sentido que uma forma terá nesta ou naquela situação de emprego, ou seja, numa dada fase da interacção discursiva e numa determinada plataforma de conhecimentos compartilhados.
De acordo com o entendimento que aqui é feito da noção de “sentido”, a palavra não pode apresentar sentido em si mesma.
*Todas as palavras são signos linguísticos, mas os signos linguísticos não têm de ser palavras. Não é pertinente, para a explicação em causa, a distinção entre signo, lexema e palavra.
3 e 4 – O vocabulário de uma língua é um sistema integrado de lexemas ligados do ponto de vista do significado e este sistema encontra-se em fluxo constante. Assim, é um erro inventariar o significado de lexemas individuais. A análise deve antes incidir sobre a estrutura global do vocabulário. Tanto a linguística sincrónica como a diacrónica devem tratar de sistemas de elementos inter-relacionados.
Uma das inter-relações a considerar é a sinonímia (a par da antonímia e da hiperonímia).
Podemos considerar três tipos de sinonímia:
Sinonímia total – há identidade denotativa e conotativa entre os lexemas sinónimos, e esses lexemas são comutáveis [sinonímia que afecta os termos técnicos, por exemplo: dentista e estomatologista; esdrúxula e proparoxítona].
Sinonímia não total – os lexemas sinónimos só são comutáveis em alguns contextos (diz-se «aprendiz de ferreiro», mas não se diz «estagiário de ferreiro», por exemplo);
Sinonímia em que há comutabilidade e identidade denotativa entre os lexemas, mas em que essa identidade já não se verifica ao nível da conotação (o que envolve variações de natureza estilística e diferenças diafásicas: veja-se a relação entre desdobrável e pasquim ou entre inepto e nabo, por exemplo.
Em português, tal como noutras línguas, há domínios de referências mais cobertos por um número significativo de sinónimos do que outros (e aquilo que é um domínio importante numa época pode já o não ser noutra). Note-se a quantidade de sinónimos para dinheiro: capital, cacau, guita, papel, bago, carcanhol, cabedal, cobres...