Se tivermos em consideração a significação isolada de cada palavra, veremos que amigo tem o significado de «que ou quem sente amizade por; ou está ligado por uma afeição recíproca a»1, enquanto pessoal significa «que é próprio de cada pessoa»1. Ora, conjugando as duas significações, veremos que existe, com efeito alguma redundância uma vez que o estatuto de amigo é concedido por cada pessoa, é próprio de cada pessoa, ideia que é repetida por pessoal. Por essa razão, quem condena este uso como redundante aponta que a expressão não tem significado próprio e que, a tê-lo, teria de ser entendida como antónimo de «amigo coletivo», por exemplo.
A condenação que encontramos na gramática tradicional relativamente a estas construções está assim relacionada com o uso do pleonasmo lexical, que, tal como afirma Bechara, «resulta do esquecimento do significado de expressões portuguesas e estrangeiras: decapitar (por decepar, já que decapitar só pode referir-se à cabeça) a cabeça, exultar de alegria, panaceia universal, esquecimento involuntário, desde ab aeterno (ab aeterno é expressão latina que já indica desde a eternidade), desde ab initio, tornar a repetir, prever de antemão, antídoto contra e tantos outros.»2
Note-se, no entanto, que a gramática não condena os usos redundantes que exigem algum esforço cognitivo e que, normalmente, se consideram literários. Estes usos inesperados produzem efeitos de sentido que poderão ser muito interessantes e criativos. Assim, a condenação de certos usos pleonásticos também poderá estar ligada ao facto de as expressões visadas se terem tornado banais e, portanto, mais vazias de sentido.
Será este o caso da expressão «amigo pessoal». Não obstante, não deixa de ser verdade que poderemos associar à expressão uma intenção expressiva, pois a palavra amigo não comporta em si toda a carga semântica que resulta da associação de pessoal a amigo. Com este uso, poderemos querer passar a ideia de que é um amigo íntimo, muito próximo, diferente daqueles amigos que se encontram mais esporadicamente, se aceitarmos que pode existir uma “escala” de amizade.
Nesta perspetiva, o uso não será condenável porque traz informação acrescida e classifica um tipo particular de amigo. Todavia, o facto de se tratar de uma expressão algo "gasta" poderá impedir que a interpretação de intenções mais expressivas seja ativada, pelo que, por clareza de comunicação, será sempre preferível uma adjetivação mais expressiva, que traduza de forma mais evidente o "tipo" de amigo de que se fala.
Disponha sempre!
2. Bechara, Moderna Gramática Portuguesa. 39:ª edição, Ed. Nova Fronteira, 2019, p. 815