Os usos exemplificados de 1 a 5 são casos do uso de todo no sentido de «cada» (ou eventualmente «qualquer», como acontece com 3 e 4). A particularidade deste uso está em o quantificador universal todo assumir a forma de singular, não porque refira uma unidade ou um indivíduo, mas, sim, porque tem valor genérico, isto é, como referência a toda uma classe de seres, sem a ancorar numa situação temporalmente específica:
1. “procurei-o por todo o lado” = «... todos os lados»
2. “procurei-o por toda a parte” = «... todas as partes»
3. “todo o bebé chora” = «todos os bebés choram»
4. “todo o médico tem a sua maneira de lidar com os doentes” = «todos os médicos...»
No caso de 5 – «toda a gente chora» – não é possível evidenciar o mesmo tipo de correspondência, uma vez que gente tem sentido coletivo e semanticamente é uma pluralidade, equivalente a «pessoas».
Os usos antes comentados não são invulgares no português de Portugal. Pelo contrário, até são frequentes, e, para todo ser interpretado como sinónimo de cada, tem de se encontrar em posição pré-nominal e em enunciados genéricos, com o verbo no presente do indicativo; com outros tempos verbais e se aparecer em posição pós-nominal, passa a significar «inteiro»:
(a) «todo o dia é uma aventura» (= «em geral, cada/qualquer dia é uma aventura»);
(b) «todo o dia choveu» (= «o dia inteiro», porque a frase não é genérica, como indicia o uso do pretérito perfeito do indicativo);
(c) «o dia todo é uma aventura» (= «o dia inteiro»).
Note-se que (c) não é um enunciado genérico e, com o verbo no presente do indicativo, só será possível no contexto adequado, por exemplo, no seguinte diálogo, em que (a) aparece como uma apreciação:
– E essa caminhada dura todo o dia?
– Dura.
– O dia todo é uma aventura!