Seguindo à letra as regras de transposição de um enunciado para discurso indirecto, teríamos:
«Ele disse que só lhes era concedida aquela vida que tinham.»
No entanto, a ocorrência deste enunciado, ou de um enunciado equivalente, é muito improvável. Isto explica-se através da análise semântica do enunciado original:
«Só nos é concedida esta vida que temos.»
Trata-se de um enunciado genérico, em que os estados de coisas representados não estão limitados temporalmente, isto é, têm um carácter intemporal. Elementos indutores desta genericidade são o presente gnómico (é concedida) e o pronome nos, que cobre, não um grupo específico de indivíduos, mas toda a humanidade. O lexema central que desencadeia esta leitura é, sem dúvida, o lexema vida.
Deste modo, o segmento do enunciado realizado pela oração subordinada na versão em discurso indirecto mantém-se inalterado, independentemente do tempo do verbo introdutor de relato de discurso:
«Ele disse só nos é concedida esta vida que temos.»
«Ele diz que só nos é concedida esta vida que temos.»
«Ele vai dizer que só nos é concedida esta vida que temos.»
Para esclarecer melhor este assunto vale a pena, ainda, construir um exemplo em que a estrutura formal é a mesma da frase apresentada, mas com uma interpretação semântica diferente.
«Só nos é concedida a licença a que temos direito pela lei do trabalhador-estudante.»
«Ele disse que só lhes era concedida a licença a que tinham...»
Nesta transposição para discurso indirecto é imperioso proceder às alterações devidas no tempo verbal e no pronome, porque o fa(c)to referenciado está circunstanciado no tempo e no espaço. Esse facto é dado como circunscrito a um quadro enunciativo ausente/passado e, portanto, interpretado como já não estando em vigor.