O uso referido será possível em algumas situações, embora não pareça ser generalizado, parecendo mais aceitável, do ponto de vista dos falantes, a sua substituição pela construção «mesmo + gerúndio».
Na qualidade de advérbio, ainda pode combinar-se com verbos flexionados em diferentes tempos e modos. De uma forma geral, o advérbio ainda incide sobre o verbo denotando uma informação de valor temporal, relacionada com o facto de a situação ter, por exemplo, um valor durativo, como em (1), ou denotando uma situação que, no limite final do intervalo temporal, acabou por ter lugar, como em (2):
(1) «A Joana ainda foi ao cinema.»
(2) «Ele ainda viu o jogo.»
O advérbio ainda pode incidir igualmente sobre verbos no gerúndio, integrando orações adverbiais gerundivas. Neste caso, o valor da oração é construindo pela própria oração gerundiva e não pelo valor do advérbio isoladamente. Deste modo uma oração gerundiva pode veicular um valor condicional-concessivo, como em (3):
(3) «Mesmo prestando atenção às aulas, não percebeu a matéria.»
Com este uso, é possível assinalar, a partir do Corpus do Português, de Mike Davies, construções com um valor idêntico que integram o advérbio ainda:
(4) «Mas nunca deixamos de atender corretamente alguns representantes da Xunta de Galicia, ainda tendo políticas diametralmente opostas a respeito da língua (e não só).» (in A Viagem dos ArgonautasGalegos de Londres. Notas. – por Carlos Durão)
(5) «Duas blasfêmias, menina; a primeira é que não se deve amar a ninguém como a Deus,-a segunda é que um marido, ainda sendo mau, sempre é melhor que o melhor dos sonhos.» (Machado de Assis, Quincas Borba, in https://www.corpusdoportugues.org/hist-gen/)
Não obstante, as descrições gramaticais consultadas1 assinalam, em casos similares, construções com «mesmo + forma verbal», que parecem mais aceitáveis e, portanto preferíveis.
Assim, a frase apresentada pelo consulente é possível, embora pareça preferível a construção que se apresenta em (6):
(6) «Mesmo tendo muito dinheiro, é avarento.»
Disponha sempre!
1. Por exemplo, Raposo et al., Gramática do Português. Fundação Calouste Gulbenkian, pp. 2015 e ss.