A língua é um sistema que desencadeia perceções linguísticas nos seus falantes, ou seja, julgamentos que associam traços sociais a traços linguísticos. Estes julgamentos motivam reações positivas ou negativas relativamente à forma como se fala ou como se ouve falar. Cite-se como exemplo os julgamentos associados à variação [b, v], comummente referida como «trocar o b pelo v». As perceções linguísticas centram-se, entre outros domínios, na correção linguística, levando o falante a considerar determinadas realizações como corretas e, logo, prestigiadas. Existe, assim, um processo de prestígio linguístico que conduz os falantes a estimar e a respeitar determinadas realizações linguísticas em detrimento de outras. Será este o fenómeno que a questão colocada convoca1.
O significado do verbo achar enquanto verbo de opinião está consagrado pelos dicionários (cf., por exemplo, Dicionário Houaiss ou Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea), sendo inclusive apresentado como sinónimo de pensar ou considerar.
Considerar a expressão «achar que» como menos correta do que «pensar que» encontra a sua justificação, como ficou dito acima, nas perceções linguísticas que julgam esta opção como menos prestigiada.
O uso da expressão parece estar, na forma escrita, associado sobretudo à oralidade. Uma breve pesquisa em textos da comunicação social mostra que a construção é usada sobretudo em citações de discurso direto, como acontece no exemplo seguinte:
(1) «Depois veio uma reportagem no "Público"a denunciar um SOS na zona pobre do Porto. “Muita gente acha que para fazer trabalho na área social é preciso ir para muito longe”, aponta.» (Público, artigo de 26/10/2018, disponível aqui)
Também em textos literários, este uso surge preferencialmente associado ao discurso direto, numa opção que se identifica já entre escritores do século XIX, como por exemplo:
(2) «− Oh Topsius, que chelpa isto me vai render! E diga lá amiguinho, diga lá! Então acha que eu posso afirmar à Titi que esta coroa de espinhos foi a mesma que..» (Eça de Queirós, A Relíquia)
Assim sendo, podemos concluir que a construção «achar que» não é resultante de uma influência de programas televisivos, nomeadamente telenovelas. Muito menos seria consequência do Acordo Ortográfico de 1990, dado que, como o nome indica, este apenas visa a ortografia das palavras e não o léxico ou a sintaxe.
Estas considerações não obstam a que se deva estimular a diversificação de uso das construções associadas à expressão da opinião, que são, de facto, inúmeras: «julgo que», «creio que», «penso que», «acredito que», «considero que», «imagino que», «presumo que», «suponho que», entre outras.
Disponha sempre!
1. Para um maior aprofundamento sobre as questões relacionadas com o prestígio linguístico e com as perceções linguísticas, cf., por exemplo, Humberto López Morales, Sociolingüística. Madrid: Editorial Gredos,1989.