Ligatura é, como diz o consulente, o termo usado para designar os carateres que combinam duas letras num único sinal gráfico. É um termo técnico do socioleto das artes gráficas, daí que apareça, em regra, em dicionários, glossários e vocabulários especializados, mas possa não aparecer em obras de referência mais gerais, como algumas das que refere. António Vilela, no seu Prontuário de artes gráficas, define ligatura como o «traço que, na escrita e em certos carateres de imprensa, liga uma letra a outra, dentro da mesma palavra» (2.ª ed. Braga, 2008, p. 53). Ligadura não é sequer nele referido. É, aliás, residual a utilização deste termo em artes gráficas.
Registe-se, porém, que os vocábulos ligadura e ligatura têm a mesma etimologia latina, ligatura, significando «ação de ligar». Ligatura é, assim, um decalque perfeito do étimo latino e ligadura um termo mais afeiçoado à língua portuguesa. Por esta razão, ligatura é um vocábulo dado por muitos dicionários gerais como sinónimo de ligadura.
O termo ligadura é, aliás, também usado na linguagem musical para simbolizar uma ligação entre duas notas musicais. A ligadura é, neste contexto, a linha curva que se usa por cima ou por baixo das notas de música de modo a ligá-las entre si, e que indica ao executante que aquelas notas devem ser cantadas ou tocadas sem interrupção.
Ligatura/Ligadura musical
Ligatura/Ligadura manuscrita (ae)
Daqui resulta que ligatura é o termo técnico e mais comum, usado na gíria das artes gráficas, para significar a união de duas letras num mesmo sinal gráfico, mas é perfeitamente admissível que, pela raiz etimológica, se use também o termo ligadura com idêntico sentido.
Acresce que os termos ligatura e ligadura são usados em tipografia, mas também na paleografia e na epigrafia, uma vez que a união ou junção de duas letras, com maior ou menor grau de osmose, também acontece na escrita manuscrita e na escrita epigráfica, por razões de economia de suporte (papiro, pergaminho, papel ou pedra), de forma a abreviar ou compactar a escrita, ou de forma a acelerá-la – uma vez que o escriba, mantendo a continuidade do traço, reduzia o número de vezes que levantava a pena –, e também por razões estéticas.
Quanto ao símbolo do parágrafo (§), ele corresponde, como refere, à união de dois S, abreviatura da expressão latina signum sectionis (signo ou sinal de separação, de secção ou de corte), pelo que, por serem duas letras imbrincadas uma na outra, constituindo um novo sinal gráfico, se pode também designar com toda a propriedade de ligatura ou ligadura. Este era um sinal usado na escrita manuscrita para significar uma mudança de secção, tal como outrora fora utilizado o caldeirão ou antígrafo (¶), muito comum em documentos medievais, o qual marcava, segundo Américo Venâncio Machado Filho, «o início do parágrafo, proposição, estrofe ou parte» (A pontuação em manuscritos medievais portugueses. Salvador: EDUFBA. 2004). Como refere João de Moraes Madureira Feijó, na sua Ortografia ou Arte de escrever, e pronunciar com acerto a língua portuguesa… (Lisboa: Impressão Régia, 1824), «escreve-se com dois ss carregado um sobre o outro, deste modo §». Com a mudança de linha, o aumento da entrelinha, e/ou a indentação da primeira linha, este símbolo caiu em desuso, sendo hoje de utilização quase residual, circunscrita a alguns documentos legislativos, sobretudo em citações (ex.: alterou o § 3.º do art.º 25 da Lei…; ou alterou os §§ 3.º e 4.º do art.º 25 da Lei…).