As palavras circuito, intuito e fortuito, a que se junta gratuito, têm todas ditongo decrescente ui, ou seja, têm o mesmo ditongo que se produz e ouve no nome próprio Rui ou no nome comum cuidado.
A pronúncia criticada e criticável consiste em articular o referido par vocálico como ditongo crescente1, como se ouve nos casos de ruído, aluimento ou possuir.
Por que razão ocorre esta alteração? Talvez haja alguma interferência (por analogia) da terminação -ito, forma que ocorre como sufixo de diferentes origens e a marcar diferentes valores, em que o i é núcleo de silaba tónica: conflito, meteorito, arenito. Mencione-se também um caso semelhante, o do nome comum e adjetivo fluido (com ditongo decrescente, como em fui), frequentemente confundido com o particípio passado fluído, do verbo fluir (com ditongo crescente, como em suíno): também dando prioridade a "uí", não raro se ouve «os "fluídos"» em lugar de «os fluidos».
Em todo o caso, não se julgue que a pronúncia em causa constitui novidade no mundo de língua portuguesa. Há dela registo no Brasil, desde há algumas décadas, como atesta um comentário que Napoleão Mendes de Almeida (1911-1998) dedicou a circuito no Dicionário de Questões Vernáculas (São Paulo, Livraria Ciência e Tecnologia, 1994, 2.ª edição revista e aumentada):
«Circuito – Com acento tónico no u. O Formulário Ortográfico [FO] não nos impõe nenhuma enfeite na palavra precisamente por cair nessa vogal o icto prosódico da palavra; fosse ele no i do grupo vocálico, o sinal diacrítico seria obrigatório (FO, 43, 4.º); sua ausência no i denota por si não ser acentuado.
Circuito rima com intuito, palavra esta que ficou livre de erro prosódico não obstante ter a mesma terminação. Já o mesmo não acontece com gratuito, outra vítima da má pronúncia, ao lado de fluido, que inúmeras vezes ouvimos com a acentuaçao tónica errada no i. Apenas para objetivar mais a tonicidade, aqui apensamos o sinal diacrítico nestas palavras: intúito, gratúito, circúito, flúido, fortúito.
Os dinâmicos locutores de futebol devem ter cuidado na prolação desses vocábulos.»
Ironicamente, existe um argumento filológico que poderia justificar esta pronúncia, pelo menos, no tocante a circuito, gratuito e fortuito; mas não é essa a tradição ortoépica, conforme se observa no Dicionário Houaiss:
«[É] da tradição culta fazer incidir a tônica sobre o -u-, uso fundado nos registros latinos gratuǐtus e fortuǐtus; a retificação para gratuītus e fortuītus (Ernout e Meillet) é relativamente recente, não havendo, por isso, podido alterar o padrão já consagrado [...]; a pronúncia popular gratuíto, comum em alguns lugares do Brasil (especialmente São Paulo), não pode ser imputada ao étimo latino, devendo-se provavelmente à ultracorreção, fenômeno que também ocorre no vocábulo fluido/fluído.»
1 É discutível que haja verdadeiros ditongos crescentes em português. Mesmo assim, considera-se que eles ocorrem como realização fonética (ler aqui).