A equivalência entre o infinitivo simples e o infinitivo composto verifica-se, nalgumas situações (cf. esta resposta). Todavia, esta equivalência não se aplica a todas as situações de uso, pelo que é necessário reconhecer algumas características distintivas das duas formas.
O infinitivo simples, por si só, não «contribui para a determinação do valor temporal das orações em que ocorre. Com o infinitivo simples, este valor depende do tipo semântico do verbo da oração principal» (Raposo et al., Gramática do Português. Fundação Calouste Gulbenkian, p. 547)
Assim, o infinitivo precisa de um tempo de referência para determinar o seu valor temporal. Entre estas referências, poderemos destacar as seguintes:
(i) o valor temporal do infinitivo simples coincide com o tempo da enunciação:
(1) «Apesar de terem muito dinheiro, são discretos.»
Nesta frase, o uso do infinitivo simples contribui também para se estabelecer um valor aspetual de habitualidade, ou seja, de situação que se repete. Este valor também pode estar presente em frases como (2), embora, neste caso, só o contexto poderá esclarecer se se trata de um evento habitual ou pontual. O infinitivo simples pode também associar-se a uma leitura de valor habitual, como em
(2) É bom termos essa reunião1.
(ii) o tempo do evento da oração subordinante serve como tempo de referência para definir o valor temporal da oração infinitiva que refere
(ii.a) um intervalo temporal coincidente com o do tempo do verbo principal:
(3) «Apesar de o tempo estar péssimo, foram passear.»
(ii.b) ou um intervalo de tempo anterior ao do verbo principal:
(4) Foi bom termos essa reunião.
(5) Não vás para a rua sem pores o casaco.
(6) Depois de acabares os trabalhos de casa, podemos ver televisão.
(7) Até ele ficar bem, não me irei embora.
Repare-se ainda que as frases (6) e (7) têm, na sua globalidade, um valor de futuridade. É dentro desse eixo que o infinitivo adquire valor de evento anterior ao da oração subordinante.
Note-se também que a definição do valor temporal a partir do valor temporal do verbo principal fica dependente da semântica do evento/situação referida por este verbo. Por essa razão, há situações em que a interpretação pode gerar ambiguidade, como acontece em (8), onde a situação descrita como «não vir à festa» tanto pode ter tido lugar antes do «lamento» do locutor como depois:
(8) Lamentei não vires à festa.
Em casos como estes, caso se pretenda associar ao infinitivo um valor de anterioridade relativamente ao verbo principal, a opção pelo infinitivo composto contribui para a clarificação da interpretação.
(iii) o infinitivo pode assumir um valor de futuridade relativamente ao verbo principal:
(9) Espero desligar o gás.
(10) Lamento não assistirem à reunião.
(11) No caso de não poderes vir, telefona-me.
Por sua vez, o infinitivo composto «tem uma interpretação de passado relativamente a um tempo de referência, que pode ser o da oração principal […] ou o de um adjunto adverbial com valor temporal, permitindo, neste caso, uma interpretação futura relativamente à enunciação» (Id., Ibid., p. 549)
Assim, o infinitivo composto assume um valor temporal passado em frases como:
(12) Foi bom termos tido essa reunião.
(13) É bom termos tido essa reunião.
(14) Espero ter desligado o gás.
(15) Em vez de terem ido ao mercado, podiam ter ido à praia.
(16) Apesar de o tempo ter estado péssimo, foram passear.
(17) Apesar de terem tido muito dinheiro, são discretos.
(18) Lamento não terem assistido à reunião.
(19) Lamentei não teres vindo à festa.
(20) É provável já se terem conhecido na última reunião.2
Ainda que incluído numa frase que expresse um valor de futuridade, o infinitivo composto define o seu valor temporal de anterioridade relativamente ao evento descrito na oração principal:
(21) No caso de não teres podido vir, telefona-me.
(22) Até ele ter ficado bem, não me irei embora.
(23) Depois de teres acabado os trabalhos de casa, podemos ver televisão.
(24) Não vás para a rua sem teres posto o casaco.
Disponha sempre!
1. Esta frase pode, não obstante, associar ao uso do infinitivo um valor de futuridade relativamente à oração subordinante, ou seja, avalia-se uma situação que ainda vai ter lugar.
2. Se se optasse pelo infinitivo simples, a leitura poderia ser de futuridade, pois poder-se-ia estar a referir um conjunto de reuniões nas quais as pessoas referidas estariam presentes, sendo que na última reunião já se conheceriam. Nesta possibilidade, «conhecerem» pode ter um valor de futuridade relativamente a «É provável»:
(a) É provável já se conhecerem na última reunião.