DÚVIDAS

O uso do infinitivo simples e do infinitivo composto

A minha dúvida que gostaria de ser esclarecida se refere ao uso do infinitivo simples e composto. Na imprensa em geral, observo que, para um mesmo contexto, são utilizadas as duas formas, por exemplo, nos seguintes casos: 

1a) «Acusado de matar o Zé, fugitivo da justiça foi preso ontem.»
1b) «Acusado de ter matado o Zé, fugitivo da justiça foi preso ontem.»
2a) «Depois de ter matado o próprio filho, homem quase foi linchado pelos vizinhos.»
2b) «Depois de matar o próprio filho, homem quase foi linchado pelos vizinhos.»
3) «Um turista morreu hoje ao cair/ter caído do varandim do elevador.»
 

Em contextos como esses, nos quais minha parca sensibilidade linguística quase sempre me induz a usar o infinitivo composto, observo que, apesar de usarem as duas formas, na imprensa em geral há uma preferência pelo infinitivo simples.

Analisem o seguinte texto do sítio uol.com.br:

«Apontado como um dos culpados pela derrota por NÃO ESTAR em campo na partida que culminou com a eliminação do Corinthians pelo Tolima na Libertadores — ALEGOU ESTAR com dores na coxa —, Roberto Carlos se queixou de estar sofrendo ameaças de torcedores e prometeu deixar o clube.»

No contexto acima, as formas «não estar» e alegou estar» estão bem postas, ou poderiam ser substituídas pelas compostas «não ter estado» e «alegou ter estado»?

Mudando de assunto, por favor, analisem os seguintes exemplos: 

4) «O policial militar CONFESSOU QUE MATOU a jornalista, porque ela teria reagido depois de TER SIDO sequestrada.»

a) Há anterioridade de ação que talvez justificasse escrever «confessou que tinha (havia) matado»?
b) Está correta a forma composta «ter sido»?

Parabéns pelo excelente serviço, e desculpem por ter me alongado.

Resposta

Obrigada pelas suas palavras simpáticas.

Quanto ao uso dos tempos compostos, é, efectivamente, muito mais frequente a utilização dos tempos simples na comunicação social, havendo, muitas vezes, orientações explícitas nos livros de estilo para esta opção. No caso dos exemplos 1a), 1b), 2a) e 2b) acima, não há grande alteração de sentido, uma vez que a locução temporal «depois de» nos permite situar as acções uma em relação à outra. Em 3), creio que a mensagem é um pouco distinta. Desdobro os exemplos e numero-os como 3a) e 3b): 

3a) «Um turista morreu hoje ao cair do varandim do elevador.»
3b) «Um turista morreu hoje depois de ter caído do varandim do elevador.»

Em 3a), a morte terá ocorrido durante a queda. Em 3b), que me parece ficar mais formal se substituirmos «ao» por «depois de», a morte, ocorrendo embora por causa da queda, aconteceu posteriormente.

O exemplo retirado da comunicação social ilustra o que referi acima, sobre a preferência dos tempos simples. 

4) «O policial militar confessou que matou a jornalista, porque ela teria reagido depois de ter sido sequestrada.»

Uma vez mais, a opção por um tempo simples em «matou» deve-se ao facto de haver a opção já apontada pelos tempos simples. Porém, do ponto de vista formal, a frase ficaria mais rica se fosse usado o tempo composto «tinha matado». Em Portugal, o uso do verbo haver como auxiliar dos tempos compostos está em desuso.

Quanto à forma «ter sido», ela está correcta, pois estamos perante uma forma passiva do verbo, sendo o auxiliar da passiva, verbo ser, a suportar as alterações ou características da conjugação do verbo. Assim, a forma simples seria «ser sequestrada». Ao colocar o verbo no tempo composto, esse tempo composto condiciona o auxiliar «ter sido».

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