Não são muitas as alterações de designação que ocorrem na nova nomenclatura. Saliento, aliás, que alguns dos aspectos que surgem apresentados de forma original na nova nomenclatura estavam longe de ser consensuais nas gramáticas existentes. De uma forma genérica, a nova terminologia está dividida em quatro partes, identificadas cada uma com uma letra: A – Comunidade linguística B – Linguística descritiva C – Lexicografia (este título foi omitido, certamente por lapso na portaria que publica a terminologia) D – Representação gráfica da linguagem oral Os aspectos que associamos ao estudo da língua portuguesa estão prioritariamente contemplados em B, que, como as outras partes, tem subdivisões: B1 – Fonética e fonologia B2 – Morfologia B3 – Classes de palavras B4 – Sintaxe B5 – Semântica lexical B6 – Semântica frásica B7 – Pragmática e linguística textual Nestes sete pontos em que se organiza aquilo a que poderemos, de forma simplista, chamar a gramática da língua portuguesa, regista-se um ponto realmente novo: a existência do grupo B3, que separa as classes de palavras da morfologia, sem as introduzir na sintaxe. Esta opção terá certamente que ver com a necessidade de registar a grande importância que as características das palavras têm para a sintaxe, sem todavia romper com a tradição de associar este estudo à morfologia. Por exemplo, o verbo ir vê a sua flexão estudada na morfologia, mas, do ponto de vista sintáctico, tem características que condicionam os contextos em que pode ocorrer. São elas que permitem identificar (1) como frase bem formada, contrariamente a (2): (1) O João vai ao Porto. (2) *O João vai um bolo. A preocupação do consulente é, porém, de carácter sintáctico. Em primeiro lugar, falarei de alguns aspectos genéricos, comparando os termos da nova terminologia com os que nos são, potencialmente, mais familiares. Assim, de uma forma genérica, o conceito sintagma é substituído por outro: grupo. Temos, pois, grupo nominal (B4.2.1) grupo adjectival (B4.2.2) grupo verbal (B4.2.3) grupo preposicional (B4.2.4) grupo adverbial (B4.2.5) A entidade subsequente, mais complexa do que o grupo, é a frase, que pode, ainda, ser simples ou complexa (B4.2.6). No âmbito da frase complexa consagra-se a designação única de coordenada para ambas as frases de uma relação de coordenação – o que, aliás, não tem muito de novo – e mantém-se a designação subordinante e subordinada. Relativamente à coordenação, a nova terminologia é omissa – certamente por lapso a corrigir na revisão prevista na Portaria n.º 1488/2004, de 24 de Dezembro. Relativamente à subordinação, mantém a tripartição: 1 – Subordinada substantiva – incluem-se aqui as completivas (não se fala, pois, de integrantes) e, aspecto não completamente novo, as relativas sem antecedente. Recordo que subordinadas substantivas são as frases que têm função de complemento directo de outras, como acontece em (3) (3) Vejo que estás muito ocupado. 2 – Subordinada adjectiva, introduzida por um relativo com antecedente e podendo ser restritiva (4) ou explicativa (5). (4) A camisa que trazes hoje é muito bonita. (5) O João, que já estava irritado com tudo aquilo, saiu intempestivamente. 3 – Subordinada adverbial. Aqui se incluem: causais finais temporais concessivas condicionais comparativas consecutivas Como se pode verificar, nada de novo no âmbito da relação entre frases. Descendo à frase simples e à classificação dos seus elementos constitutivos, ou seja, às funções sintácticas dos vários elementos que compõem a frase, a grande novidade é o facto de se fazer uma separação entre complemento (parte integrante de predicado, ou determinados complementos associados a um nome, quando necessários no âmbito da sua regência, geral ou contextual) e modificador [complementos circunstanciais e algumas frases subordinadas – adjectivas, finais, causais] . Exemplificando, a frase pode conter (B4.3.1 a B4.3.7): A – Elementos essenciais [dependendo das características genéricas da frase a analisar]: Sujeito – O João saiu. Predicado – O João saiu. Predicativo do sujeito – O João está contente. Predicativo do complemento directo – Nomearam o João presidente do clube. Complemento directo – O João visitou os amigos. Complemento indirecto – O João deu uma flor à Maria. Complemento agente da passiva – Os amigos foram visitados pelo João. Complemento preposicionado – O João gosta de cinema. O elemento mais inovador é o complemento preposicionado, que merece noutras gramáticas a designação, pouco feliz, de complemento indirecto, ou de complemento oblíquo. É, ainda, tradicionalmente, considerado circunstancial, mas se tivermos em conta que um complemento circunstancial não é essencial, então «de cinema» nunca pode ser circunstancial, dado que a frase sem ele fica incompleta: «*O João gosta» B – Elementos não essenciais O conceito mais inovador é, como já foi referido, o de modificador. O modificador é um constituinte que modifica um outro, transmitindo informação sobre esse constituinte sem que, todavia, a sua presença seja obrigatória. Corresponde, afinal, grosso modo, ao complemento circunstancial O modificador pode ser (B4.3.4): Preposicional, se for introduzido por uma preposição (constituindo um grupo preposicional) – Vou para casa de carro. Adverbial – Ontem fui ao cinema. Frásico – A pessoa que saiu é muito simpática. Para além das funções sintácticas apresentadas, registam-se ainda o vocativo e alguns complementos e modificadores que ocorrem com grupos nominais (B4.3.7): Antes de continuar, devo dizer que estou a seguir de perto o que se diz na portaria já referida, bem como a base de dados distribuída pelo Ministério da Educação em CD-ROM e disponível na página da Direcção-Geral de Inovação e de Desenvolvimento Curricular (DGIDC). Impõe-se ainda dizer que os aspectos que seguem não são, do meu ponto de vista, os mais bem explicados, podendo haver erro na minha interpretação. Voltando à terminologia, fala-se de: Complementos do nome: Complemento preposicional do nome – (Composto por uma preposição e por um nome) há nomes que regem preposição (alguns sempre, outros em determinados contextos). Sempre que o contexto o exige, a sua presença é obrigatória, sendo, a meu ver, esta obrigatoriedade que justifica a designação de complemento. Ex.: A necessidade de reflexão impõe uma pausa nos trabalhos. Complemento frásico do nome – Composto por uma preposição seguida de um verbo. Ex.: A necessidade de reflectir impõe uma pausa nos trabalhos. Modificadores do nome: Restritivos – podem ser adjectivos ou nomes, ou ainda grupos preposicionais. (6) O rapaz, decidido, avançou sem hesitar. (7) A viagem de Lisboa ao Porto é cansativa (creio que se assemelha ao complemento determinativo) Adjectivais – (Creio que aqui se insere o atributo) – As flores vermelhas ficam bem nesse vaso. Apositivos (como no aposto) – O João, rapaz corajoso, avançou sem hesitar. Espero ter contribuído, prezada consulente, para esclarecer as suas dúvidas. Para além da portaria e da base de dados referida, poderá ainda consultar a Gramática da Língua Portuguesa de Maria Helena Mira Mateus e outras, 5.ª edição. Com cariz menos completo saiu ainda, neste ano, a obra Saber Português hoje: Gramática Pedagógica da Língua Portuguesa, de Luísa Oliveira e Leonor Sardinha, Didáctica Editora. Bom trabalho!