A enumeração é um recurso retórico que consiste na «adição ou inventário de coisas relacionadas entre si, cuja ligação se faz quer por polissíndeto1 quer por assíndeto2» (Dicionário de Termos Literários, de Carlos Ceia).
É frequente a presença da enumeração nas descrições e nas narrações em que o narrador se preocupa em apresentar todas as particularidades de uma determinada situação, apresentando uma série de caraterísticas dos locais e do ambiente, listando as qualidades e os defeitos das personagens, referindo o processo pormenorizado das ações. Através deste recurso, o sujeito procura representar fidedignamente o pormenor da realidade sobre a qual falam/escrevem. «Entre os vários processos, podemos lembrar: o desenvolvimento da definição, o emprego de exemplos, o uso de comparações, contrastes, etc.» (Sebastião Cherubim, Dicionário de Figuras de Linguagem, 1973).
São exemplos de enumerações:
«A vida é o dia de hoje, / A vida é um ai que mal soa,/ A vida é sombra que foge, / A vida é nuvem que voa, / A vida é sonho ao leve, /que se desfaz como neve/ E como fumo se esvai» (João de Deus, A Vida).
«Lavava roupas da Baixa, vestia, usava, lavava outra vez, levava» (Luandino Vieira, João Vêncio, 103).
«O quinhão que me coube é humilde, pior do que isto: nulo. Nem glória, nem amores, nem santidade, nem heroísmo» (Otto Lara Resende, O Braço Direito, 10).
Nota: Alguns retóricos propõem que à enumeração exaustiva se chame inventário.
1 Polissíndeto é uma figura de sintaxe que se carateriza pelo «emprego reiterado de conjunções coordenativas, especialmente das copulativas ou aditivas» (Cunha e Cintra, Nova Gramática do Português Contemporâneo, p. 623). Assim, sempre que nos deparamos com construções em que se verifique a presença sistemática da conjunção e a ligar orações ou simplesmente outras estruturas. Exemplos:
«Ocupados com quem lavra a existência, e planta, e colhe, e mata, e vive, e morre, e come» (Clarice Lispector, Felicidade Clandestina, 92).
«Fui cisne, e lírio, e águia, e catedral!» (Florbela Espanca, Sonetos, 59).
2 O assíndeto, como figura de sintaxe, é um processo de encadeamento do enunciado que consiste na sucessão de palavras ou de orações de uma frase, marcada pela vírgula e sem a ocorrência de conjunção coordenativa. Exemplos:
«A barca vinha perto, chegou, atracou, entramos» (Machado de Assis, Obra Completa, I, 1067).
«Fulgem as velhas almas namoradas.../ Almas tristes, severas, resignadas,/ De guerreiros, de santos, de poetas» (Camilo Pessanha, Clepsidra, 48).