Consultório - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
 
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João Rocha Investigador Lisboa, Portugal 20K

Esta questão foi-me colocada por um estrangeiro que está a aprender português.

Na frase «tu nunca _____ fome», o verbo ter pode ser conjugado tanto no pretérito perfeito (p.p.) como no pretérito imperfeito (p.i.), tendo as frases resultantes significados diferentes:

«Tu nunca tinhas fome.»(p.i.) – entendo esta frase como: «Nesse período em particular tu não passaste fome» – vs «Tu nunca tiveste fome» (p.p.) – entendo esta frase como: "Tu nunca passaste fome na vida."

Neste caso, aparentemente, o pretérito imperfeito define um período específico, enquanto o pretérito perfeito se refere a um período indefinido de tempo. Tenho, portanto, bastante dificuldade em explicar o que se está aqui a passar gramaticalmente.

Podem esclarecer-me esta dúvida, por favor?

Raquel Martins Professora Lisboa, Portugal 2K

Gostaria de saber em que medida a expressão seguinte configura uma catáfora. O exercício, de um exame de português de 12.º ano, diz assim:

«O recurso à expressão "tudo o que Fernando Pessoa não pode ser" configura uma... Catáfora, reiteração, anáfora ou elipse. (Escolha múltipla)»

As soluções indicam «catáfora».

Contexto: «(...) a verdade é que é de Caeiro que irradia toda a heteronímia pessoana, pois ele é tudo o que Fernando Pessoa não pode ser: uno porque infinitamente múltiplo, o argonauta das sensações, o sol do universo pessoano.»

Neste caso «ele» é o correferente, e «tudo o que o Fernando Pessoa não pode ser», o referente, uma vez que na catáfora o correferente aparece antes do referente?

Gostaria que me elucidassem, pois fiquei confusa.

Obrigada.

Maria Céu Melo Professora Oeiras, Portugal 2K

Na frase «Qual o impacto da atenção na compreensão da leitura?», não é obrigatório escrever o verbo , neste caso, ser (é ou foi)?

Amanda Soares Estudante Recife, Pernambuco, Brasil 2K

Consultei vários glossários e dicionários e nenhum, dos que possuo, pôde me auxiliar no entendimento dessa contração marcada pelo apóstrofo («que a'm poder tem») nos versos que se seguem.

Trata-se de uma sinalefa? Se sim, como desenvolvê-la e como construí-la na ordem direta?

«(...) Deus nom mi a mostre, que a 'm poder tem,
se eu querria no mundo viver
por lhe nom querer bem nem a veer.'»

(Rui Pais de Ribela, ''A mia senhor, que mui de coraçom")

Desde já, agradeço a atenção dispensada.

Sofia Carvalho Estudante Lisboa, Portugal 21K

Tenho dúvida sobre o tipo de modalidade presente nos seguintes enunciados:

1. A cor da parede é bonita.

2. É inaceitável defender a escravatura.

É epistémica com valor de certeza ou apreciativa e porquê?

Muito obrigada pela vossa ajuda.

Fernando Bueno Engenheiro Belo Horizonte, Brasil 2K

«Mas, se tudo isso era espantoso, não menos o era a luz, que não vinha de parte nenhuma, porque os lustres e castiçais estavam todos apagados; era como um luar, que ali penetrasse, sem que os olhos pudessem ver a lua; comparação tanto mais exata quanto que, se fosse realmente luar, teria deixado alguns lugares escuros, como ali acontecia, e foi num desses recantos que me refugiei.»

O trecho acima foi pinçado do extraordinário conto "Entre Santos", do não menos extraordinário Machado de Assis (1839-1908).

O período todo proporcionaria uma alentada aula de sintaxe, mas me atenho somente à oração «quanto que teria deixado lugares escuros». Como analisá-la sintaticamente?

Muito obrigado.

Patrícia de Souza Professora Niterói, Brasil 39K

A frase «Que dia é hoje?» é uma interrogativa direta. A frase «Veja que dia é hoje» é uma interrogativa indireta.

E a frase «Você pode ver que dia é hoje?» se enquadra em direta ou indireta? Por quê?

José Luís Sincer e Sepúlveda Enfermeiro Valongo, Portugal 2K

No âmbito da gestão, encontro com bastante frequência a palavra "calculativo" associada ao modelo de Meyer e Allen, nas traduções para português. No entanto, fico com dúvidas se, na realidade, esta palavra existe em português, ou se é mais uma tentativa de tradução forçada de um termo estrangeiro, e se não seria mais apropriado utilizar-se o termo "calculista".

Marco Cunha Estudante Lisboa, Portugal 10K

Quando é que se deve usar o artigo indefinido e quando é que se o deve[*] omitir?

Nalgumas situações os substantivos soam melhor com artigo e noutras soam melhor sem artigo.

Por exemplo, as frases «tens namorada?» e «sou professor» soam melhor do que as frases «tens uma namorada?» e «sou um professor», mas as frases «comprei uma camisola» e «ontem falei com uns turistas espanhóis» soam melhor do que as frases «comprei camisola» e «ontem falei com turistas espanhóis».

 

[*N.E. – Mantém-se a sequência «se o», embora a sua gramaticalidade seja controversa.]

Shirley Martins Química Lisboa, Portugal 6K

É muito comum no Brasil usarmos o termo «meia dúzia» com o sentido de «seis», principalmente em comunicações telefônicas e aéreas, para que em caso de algum ruído na comunicação, não se ouça três, no lugar de seis. Logo, «meia dúzia» facilita a compreensão de que falamos de 6, e não três.

Pois bem, uma pessoa grosseira me corrigiu, quando eu fornecia meu telemóvel, e citei um dos dígitos como «meia dúzia», com o intuito de facilitar a compreensão. A pessoa respondeu que «meia era para pés». A pessoa compreendeu exatamente o que eu quis dizer, pois após longos anos de troca entre Brasil e Portugal, muitos conhecem muito bem nossas expressões.

Eu não corrijo um americano, quando ele me diz que um artigo custa, por exemplo, 10K. Isso faz parte do dinamismo da comunicação, cada língua tem expressões ou gírias, que podem ser entendidas por outros, sem que isto cause constrangimento.

A pergunta é se  posso usar «meia dúzia», no lugar de seis, sem estar incorrendo num erro gravíssimo, que me leve à "guilhotina" (ironia) ?