Sandra Duarte Tavares - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Sandra Duarte Tavares
Sandra Duarte Tavares
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É mestre em Linguística Portuguesa pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. É professora no Instituto Superior de Comunicação Empresarial. É formadora do Centro de Formação da RTP e  participante em três rubricas de língua oortuguesa: Agora, o Português (RTP 1), Jogo da Língua  e Na Ponta da Língua (Antena 1). Assegura ainda uma coluna  mensal  na edição digital da revista Visão. Autora ou coa-autora dos livros Falar bem, Escrever melhor e 500 Erros mais Comuns da Língua Portuguesa e coautora dos livros Gramática Descomplicada, Pares Difíceis da Língua Portuguesa, Pontapés na Gramática, Assim é que é Falar!SOS da Língua PortuguesaQuem Tem Medo da Língua Portuguesa? Mais Pares Difíceis da Língua Portuguesa e de um manual escolar de Português: Ás das Letras 5. Mais informação aqui.

 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

Eu sou uma leitora assídua do vosso site e antes de mais queria-vos dizer que já me ajudaram muito nestes tempos de vida académica sempre que preciso de uma ajuda no domínio da nossa língua. Neste momento queria-vos pedir ajuda para uma questão: eu gostava de saber que informações têm acerca da linguagem jovem, a linguagem que hoje em dia os jovens adoptam, não contando no entanto com a linguagem de Internet e SMS; eu falo de linguagem na oralidade. Ficava bastante agradecida se me ajudassem nesse assunto.

Desde já um muito obrigado!

Resposta:

Não é fácil responder com precisão à sua pergunta, porque a linguagem dos jovens não é uniforme e depende de muitos factores, como a classe social, o nível de formação académica, o sexo e a faixa etária. Para além disso, tem um carácter esporádico e pontual, uma vez que os aspectos linguísticos que a caracterizam são específicos de um dado momento.

Não obstante, enunciam-se, em seguida, alguns aspectos da linguagem dos jovens característicos da faixa etária 14–20, nos dias de hoje. Encontram-se agrupados em quatro domínios linguísticos:

Morfologia e Sintaxe

— uso de but (forma verbal vamos)

— uso de bué (advérbio muito)

— aférese: , tás (estou, estás)

— nome > advérbio: gostar horrores (gostar muito)

Léxico e Semântica

— uso de muitos estrangeirismos, sobretudo anglicismos:

Estar crowd (estar muita gente)

Fazer uma trip (fazer uma viagem)

Dar um jump (dar um salto)

Dar um eject (terminar uma relação amorosa)

Ser um show (ser um espanto!)

Convém salientar que este tipo de linguagem é apreendido pelos jovens de uma forma consciente e é usado intencionalmente como um meio de socialização.

Salganhada <i>vs.</i> salgalhada

Na esteira dos parlapiês e das coisas escanifobéticas (ou escaganifobéticas!), há, entre tantas outras, mais uma palavra de uso bastante frequente, mas que, para grande surpresa de todos nós, não se encontra consagrada nos nossos dicionários: salganhada!

Pergunta:

Qual a pronúncia correcta da palavra racista? Com a aberto, ou com a fechado?

Obrigada.

Resposta:

Apesar de muitas palavras derivadas manifestarem um fechamento da vogal do radical (exemplos: casa > casinha; porta > portão; belo > beleza), a palavra racista pronuncia-se com a aberto, sendo uma excepção a essa regra: raça > racista.

Pergunta:

A título de uma dúvida, consultei a vossa base de dados e obtive a resposta n.º 7248 – Compartilhar/partilhar, respondida por M.R.L. a 12/12/2000: «Os verbos partilhar e compartilhar podem ser sinónimos quando significam tomar parte em, compartir, o que se verifica na frase que apresenta como exemplo: "Vem compartilhar/partilhar os teus conhecimentos connosco."»

A minha questão é a seguinte: existe outra possibilidade de estes verbos não serem sinónimos? E quais os seus significados?

Resposta:

Os verbos partilhar e compartilhar são, de facto, sinónimos, quando significam «fazer a partilha de, compartir»:

(1) «A Leonor e a amiga partilharam o lanche.»

(2) «A Leonor e a amiga compartilharam o lanche.»

Porém, o verbo partilhar apresenta significados que não são partilhados (este é um deles!) pelo verbo compartilhar:

1. Enquanto verbo transitivo directo, tem também o significado de «dividir, distribuir»:

(3) «Ela partilhou as suas roupas velhas (entre os pobres).»

2. Enquanto verbo transitivo indirecto, significa «tomar parte (em); participar (de); experimentar o mesmo ponto de vista, sentimento, etc.»:

(4) «Homens e mulheres, apesar de diferentes, partilham da mesma essência.»

Pergunta:

É correcto usar o superlativo absoluto analítico do adjectivo absoluto («muito absoluto»), ou deveremos apenas usar absolutíssimo?

Obrigada.

Resposta:

Existem duas grandes subclasses de adjectivos: os adjectivos predicativos e os adjectivos não predicativos (ou relacionais).

Os primeiros predicam, ou seja, atribuem uma qualidade a um nome, por exemplo: bonito, quente, generoso, humilde.

Os segundos não têm uma função predicativa, mas, sim, classificatória: «jornal mensal», «flores campestres», «câmara municipal», «equipamento informático».

A principal diferença entre estes dois grupos de adjectivos é o facto de os predicativos serem graduáveis e, por isso, admitirem variação em grau:

(1) «Esse quadro é muito bonito!»

(2) «A sopa está muito quente.»

Os adjectivos relacionais estabelecem uma relação com o nome que modificam e não são quantificáveis — não admitem variação em grau:

(3) *«Essa câmara é muito municipal.»

(4) *«Este equipamento é muito informático.»

Ora, o adjectivo absoluto pertence, a meu ver, a esta subclasse de adjectivos — os relacionais —, pelo que não admite qualquer variação em grau — nem superlativo absoluto analítico, nem sintético:

(5) *«O poder do rei é muito absoluto.»

(6) *«O poder do rei é absolutíssimo.»

Nota: o asterisco indica ...