Sandra Duarte Tavares - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Sandra Duarte Tavares
Sandra Duarte Tavares
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É mestre em Linguística Portuguesa pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. É professora no Instituto Superior de Comunicação Empresarial. É formadora do Centro de Formação da RTP e  participante em três rubricas de língua oortuguesa: Agora, o Português (RTP 1), Jogo da Língua  e Na Ponta da Língua (Antena 1). Assegura ainda uma coluna  mensal  na edição digital da revista Visão. Autora ou coa-autora dos livros Falar bem, Escrever melhor e 500 Erros mais Comuns da Língua Portuguesa e coautora dos livros Gramática Descomplicada, Pares Difíceis da Língua Portuguesa, Pontapés na Gramática, Assim é que é Falar!SOS da Língua PortuguesaQuem Tem Medo da Língua Portuguesa? Mais Pares Difíceis da Língua Portuguesa e de um manual escolar de Português: Ás das Letras 5. Mais informação aqui.

 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

Poderia empregar exuviabilidade com um sujeito humano?

Esta dúvida surgiu após ter visto assemântica no Dicionário Houaiss, que dizia: «assemântica: ling: que por violar as regras semânticas de uma língua, não é semanticamente interpretável, ou seja, não faz sentido, pelo menos no mundo real e no nível denotativo (diz-se da frase): por ex. “o livro abocanhou a tempestade” fere as regras de combinação entre palavras que dizem que abocanhar exige um sujeito animado e um objecto directo sólido .»

Obrigado.

Resposta:

As palavras da língua são portadoras de determinadas propriedades linguísticas, nomeadamente propriedades sintácticas e semânticas.

São estas propriedades que determinam como se devem combinar as palavras de modo a produzir frases bem formadas.

Por exemplo: o verbo pensar só pode ser associado a sujeitos humanos (*«o gato pensou»), e o verbo avariar, a sujeitos inanimados (*«o gato avariou»).

É claro que estas regras linguísticas podem ser violadas se as palavras forem utilizadas num plano conotativo. A este nível, tudo é possível: os rouxinóis contam-nos histórias, o mar ruge, os livros escondem-nos segredos...

Ao termo exuviabilidade está, de facto, associado o traço menos humano, pois o mesmo designa a capacidade que certos animais têm de mudar de pele.

Porém, como foi referido, usado num plano conotativo, é possível usá-lo até com um sujeito [+ humano]!

Disponha sempre!

Pergunta:

Quantas orações tem a frase «Sem ouvir o polícia, que gritava, o homem desapareceu» e como se classificam?

Resposta:

Esta frase contém três orações:

1. «o homem desapareceu» Oração subordinante

2. «que gritava»  Oração subordinada adjectiva relativa explicativa

3. «sem ouvir o polícia» Esta oração não encontra designação nem na Nomenclatura Gramatical Portuguesa (1967) nem na Terminologia Linguística para o Ensino Básico e Secundário.

No entanto, do ponto de vista sintáctico, parece estarmos perante uma estrutura de coordenação, equivalente a: «o homem desapareceu e nem ouviu o polícia».

Nota: Evanildo Bechara, na sua Moderna Gramática Portuguesa (Rio de Janeiro, Editora Lucerna, 2002), classifica a locução sem que como locução conjuntiva subordinativa modal, e chama orações modais às introduzidas por sem que, muito embora a Nomenclatura Gramatical Brasileira não considere estas classificações.

Pergunta:

Gostaria de tirar uma dúvida final, tendo em vista que já consultei outras perguntas a respeito, mas ainda não me esclareceram: qual a pronúncia correta de oblongo: "ob-lon-go", ou "o-blon-go"? Ouço muitas pessoas falando como se o b fosse mudo ou até mesmo como se formasse uma sílaba, como está na primeira forma, mas sempre pronunciei da segunda forma apresentada. Então gostaria de sanar essa dúvida, se eu estou ou os outros estão "remando contra a maré".

E parabéns pelo site.

Resposta:

A palavra oblongo é constituída por três sílabas: o-blon-go.

A consoante oclusiva b é articulada e introduz a segunda sílaba: -blon-.

Pergunta:

Qual a diferença no uso dos verbos começar e iniciar?

Resposta:

A principal diferença no comportamento sintáctico destes dois verbos é a seguinte:

O verbo começar é usado como auxiliar aspectual, regendo as preposições a ou por:

(1) «O menino começou a gritar.»

(2) «A cozinheira começou por fazer a sobremesa.»

Ou, no português Brasil, usando o gerúndio:

(3) «O menino começou gritando.»

(4) «A cozinheira começou fazendo a sobremesa.»

O verbo iniciar é usado como bitransitivo e pronominal:

(5) «Os pais iniciaram o filho no desporto aos 5 anos.»

(6) «O João iniciou-se na política com 18 anos.»

Pergunta:

Eu sou uma leitora assídua do vosso site e antes de mais queria-vos dizer que já me ajudaram muito nestes tempos de vida académica sempre que preciso de uma ajuda no domínio da nossa língua. Neste momento queria-vos pedir ajuda para uma questão: eu gostava de saber que informações têm acerca da linguagem jovem, a linguagem que hoje em dia os jovens adoptam, não contando no entanto com a linguagem de Internet e SMS; eu falo de linguagem na oralidade. Ficava bastante agradecida se me ajudassem nesse assunto.

Desde já um muito obrigado!

Resposta:

Não é fácil responder com precisão à sua pergunta, porque a linguagem dos jovens não é uniforme e depende de muitos factores, como a classe social, o nível de formação académica, o sexo e a faixa etária. Para além disso, tem um carácter esporádico e pontual, uma vez que os aspectos linguísticos que a caracterizam são específicos de um dado momento.

Não obstante, enunciam-se, em seguida, alguns aspectos da linguagem dos jovens característicos da faixa etária 14–20, nos dias de hoje. Encontram-se agrupados em quatro domínios linguísticos:

Morfologia e Sintaxe

— uso de but (forma verbal vamos)

— uso de bué (advérbio muito)

— aférese: , tás (estou, estás)

— nome > advérbio: gostar horrores (gostar muito)

Léxico e Semântica

— uso de muitos estrangeirismos, sobretudo anglicismos:

Estar crowd (estar muita gente)

Fazer uma trip (fazer uma viagem)

Dar um jump (dar um salto)

Dar um eject (terminar uma relação amorosa)

Ser um show (ser um espanto!)

Convém salientar que este tipo de linguagem é apreendido pelos jovens de uma forma consciente e é usado intencionalmente como um meio de socialização.