Uma publicação do jornal Expresso na sua página de Instagram, referente a uma notícia publicada no site do mesmo jornal, destaca um fenómeno relativamente recente: cosmeticorexia. Diz a legenda que acompanha a imagem: «Crianças a partir dos 10 anos, especialmente raparigas, estão a utilizar produtos cosméticos com substâncias antienvelhecimento e algumas mostram preocupação com as rugas. Dermatologistas recebem em consultório casos de reações alérgicas e estão preocupados. A “tendência” já tem um nome: cosmeticorexia.»
Cosmeticorexia constitui, portanto, um termo cunhado para descrever um fenómeno psicológico em que as pessoas desenvolvem uma obsessão extrema pela aparência física e pela busca da perfeição estética.
Este termo é uma amálgama, i.e, uma unidade lexical formada a partir da fusão de duas ou mais unidades lexicais truncadas. Margarita Correia e Lucia San Payo de Lemos (Inovação Lexical em Português, 2005, Colibri, pág. 44) explicam que este tipo de unidade lexical é constituído «com partes de palavras, que se juntam, formando uma palavra gráfica». Neste caso, trata-se da junção de cosmética com o elemento de formação pospositivo -orexia, derivado do grego óreksis, eōs, que significa «tendência para, desejo de, apetite» (Dicionário Houaiss). Portanto, e apesar de se relacionar com distúrbios alimentares, como acontece em anorexia, neste caso -orexia é usado para denotar uma preocupação extremada pela perfeição estética. Assim, cosmeticorexia descreve comportamentos similares aos observados em transtornos alimentares, mas com ênfase na procura pela aparência estética ideal. Foneticamente, e tomando por referência cosmética e anorexia, cujos o e o e são abertos, cosmeticorexia pronuncia-se o e o e abertos tanto em cosmetic- como em -orexia.
Quanto à criação do termo, é difícil precisar, mas talvez tenha origem no espanhol, onde também é utilizado o termo cosmeticorexia, dado o número significativo de referências encontradas em linha, muitas delas datadas de 2023. Em inglês, uma rápida consulta de páginas na Internet permite identificar raríssimas ocorrências das formas cosmeticorexy e cosmeticorexia, o que leva a supor que o termo tem muito pouco uso. A data exata do surgimento da expressão é também ela difícil de determinar, no entanto, é um neologismo recente, que aparece associado ao contexto cultural e social em que se vive, influenciado pelas redes sociais onde há crescente idealização de padrões de beleza irreais, comparações prejudiciais, influência de comportamentos e atitudes em relação à aparência, e uma cultura de validação baseada na imagem corporal.
Em suma, cosmeticorexia, que não apenas descreve um fenómeno cultural, mas a sua formação, é exemplo de como a língua, ao expressar conceitos emergentes, também reflete as transformações sociais em curso.