A realização da 26.ª Cimeira do Clima (COP26), entre 31 de outubro e 12 de novembro de 2021, em Glasgow, na Escócia, fez emergir todo um léxico relativo à questões ambientais, parte dele pouco conhecido pelo comum dos falantes de língua portuguesa. Seguem-se algumas recomendações para a escrita de palavras e expressões a ele referentes, numa adaptação (e revisão nem sempre coincidente) das orientações publicadas pela Fundéu RAE em 29 de outubro de 2021. Para esta lista, teve-se também em conta o trabalho "Do Antropocénico à curva de Keeling: o glossário do clima para entender a COP26", que a jornalista Claudia Carvalho Silva elaborou para a edição de 30 de outubro de 2021 do jornal Público.
2. Nome completo deste encontro
O nome completo da reunião é Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima. Os media referem-na como Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima, Cúpula sobre Mudanças Climáticas ou Cúpula do Clima, expressões que não são nomes oficiais e, portanto, deveriam escrever-se com minúsculas iniciais.
3. COP e IPCC
A sigla ( e acrónimo) COP, usada muito frequentemente para referir este encontro, provém do inglês Conference of the Parties, literalmente «Conferência entre as Partes ». Acrescenta-se o número da edição correspondente, de modo que a atual se denomina COP26. Também é utilizada, embora menos, a sigla CP e a grafia com espaço COP 26.
Quanto à sigla IPCC, de English Intergovernmental Panel on Climate Change, é corrente em português, mas emprega-se também a expressão traduzida: Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (Diário de Notícias, 09/08/2021) ou Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas (Público, 30/10/2021). Não há, portanto, uma formulação única em português; mas um documento do Instituto do Mar e da Atmosfera apresenta a forma Painel Intergovernamental sobre Alterações Climáticas, que constitui outra opção, com vantagem de já ter uso institucional.
Quanto à denominação United Nations Framework on Climate Change, cuja sigla é UNFCCC, o nome português que a traduz é Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas, forma que ocorre num documento da Agência Portuguesa para o Ambiente. A sigla inglesa UNFCCC ocorre nos textos mediáticos em português, mas, tendo em conta a referida denominação portuguesa, nada impede o emprego da sigla CQNUAC.
4. Acordo de Paris, em letras maiúsculas
Numa COP anterior (a COP21), foi aprovado o chamado Acordo de Paris, que substitui o antigo Protocolo de Quioto. Em ambos os casos, as palavras acordo e protocolo têm inicial maiúscula, como a generalidade dos nomes próprios.
5. (High level) climate champion
No contexto da COP, é um anglicismo referente à figura que nessas cúpulas atua em nome do presidente da conferência e facilita o sucesso desta para através de vários procedimentos. A sua tradução «campeão de alto nível do clima» é forma possível em português (ver aqui).
6. Descarbonização, termo correto
Descarbonizar e descarbonização são os termos empregados legitimamente em referência ao processo de redução das emissões de carbono, especialmente na forma de dióxido de carbono. Trata-se de vocábulos que já são correntes na comunicação social e são derivados bem formados com o radical do nome comum carbono.
7. Ecocídio, neologismo válido
O termo ecocídio, formado a partir dos elementos composicionais eco- e -cídio, pode ser usado para se referir a danos ecológicos muito sérios.
8. Efeito estufa
O efeito estufa é o resultado da ação de gases que mantêm o calor do sol na atmosfera do planeta. Vide aqui.
9. Flygskam (= «Ter vergonha de voar»/»andar de avião»)
A expressão «vergonha de voar (andar de avião)» é um equivalente válido e adequado do termo sueco flygskam, usado em relação a um movimento ambientalista que, difundido principalmente pela ativista sueca Greta Thunberg, apela a repensar a necessidade das viagens de avião, dada a grande quantidade de dióxido de carbono que esse tipo de transporte emite em cada viagem.
10. Graus (como escrevê-los)
Uma das principais preocupações dos especialistas em mudanças climáticas é quanto aumentará em graus a temperatura média do planeta. O símbolo internacionalmente estabelecido para graus Celsius (ou centígrados) é °C, que consiste em um pequeno círculo (sem ponto nem sublinhado) seguido sem um espaço pela letra C. Um espaço é deixado entre a figura e o símbolo. Não precisa ser destacado com itálico ou aspas. Cf. Guilherme de Almeida, "O grau centígrado: um fóssil terminológico" (08/02/2016).
11. Greenwashing (traduções possíveis)
O termo inglês ocorre sem tradução (cf. aqui), mas podem aceitar-se expressões como ecoimpostura ou «lavagem de imagem verde», entre outras soluções vernáculas, para referir uma estratégia de mercado usada por certas empresas para parecerem mais respeitadoras do meio ambiente do que realmente são.
12. Littering
O anglicismo ocorre esporadicamente, mas é substituível pela palavra lixo, como designação de uma realidade combatida por movimentos e campanhas que buscam consciencializar a sociedade para a necessidade de não deixar lixo em locais públicos, pelas graves consequências ambientais que isso acarreta.
13. «Mudanças climáticas», «crise climática», «emergência climática»
São três expressões em uso na comunicação social portuguesa. Escritas inteiramente em letras minúsculas, uma vez que não constituem nomes próprios, mas apenas nomes descritivos. Para o espanhol, seguindo uma distinção antes operada em inglês (entre climate crisis e climate change, conforme propõe o livro de estilo de The Guardian), a Fundéu considera que «crise climática» é mais apropriado do que «mudança climática» para se referir à magnitude e às consequências do aquecimento global causado pela atividade humana. É também possível transpor esta perspetiva conceptual para o português.
14. New Green Deal (ou Green New Deal)
A denominação new green deal poderá substituir-se pela expressão «novo pacto verde», inteiramente em letras minúsculas por se tratar de uma sequência meramente descritiva. No entanto, há quem prefira manter a forma inglesa como referência à política do New Deal (1933), um conjunto de medidas económicas promovidas pelo presidente norte-americano T. D. Roosevelt, para debelar o impacto social da Grande Depressão de 1929. Essa intenção justifica igualmente escrever Novo Pacto Verde com maiúsculas iniciais (cf. "Green New Deal: a resposta ecológica de uma esquerda eficaz e socialmente justa", Público, 18/07/2019), como expressão que se refere a um conjunto de propostas políticas para enfrentar a crise climática por meio de medidas económicas sustentáveis.
N. B.: Para o espanhol, a Fundéu RAE considera que se trata de uma expressão descritiva e, como tal, deve escrever-se com minúsculas iniciais a forma castelhana equivalente: nuevo pacto verde. Parece esta uma posição discutível, atendendo a que, em inglês, como foi dito, a expressão tem maiúsculas iniciais, de modo a destacar o estatuto especial desse pacto como objetivo político. É, portanto, legítimo que, em português, se mantenham as maiúsculas iniciais na tradução: Novo Pacto Verde.
15. «Resíduos zero»
A expressão «resíduo zero» é uma tradução do inglês zero residue e já circula há algum tempo nos usos do português. Permite referir ao movimento que visa evitar ao máximo a geração de resíduos não recicláveis – não só o lixo, mas também o lixo que não se presta a compostagem ou não pode ser reciclado e, portanto, nocivo para o meio ambiente.
16. Savanização, neologismo válido
O termo savanização é um neologismo válido para se referir ao processo de degradação de áreas florestais, especialmente selvas ou florestas tropicais, consistindo no desaparecimento de árvores e na abertura de grandes clareiras, que são ocupadas por gramíneas e arbustos, configuração que é mais típica da savana. Não equivale exatamente a desmatamento, que designa a eliminação total ou maioritária da cobertura florestal, nem a desertificação ou desertificação, sinónimos que se referem à conversão de uma área em deserto, pois a savanização pode ser reversível.
17. Sustentável
Ocorre corretamente o adjetivo sustentável em referência ao modelo de desenvolvimento que busca não comprometer as gerações futuras com o consumo excessivo de recursos.
Cf. O que é e como funciona a COP, a principal conferência do clima + «Passo importante, mas não o suficiente», afirma Guterres sobre acordo da COP26