«(...) Temamos também por elas, pelas vírgula, porque, se no caso do pobre ponto de exclamação o motivo é o seu mau uso ou o seu abuso, basta ver os maus tratos que as vírgulas sofrem hoje em jornais e blogues para não lhes augurar luzido futuro. (...)»
Anda por aí uma excitada campanha (principalmente na blogosfera, mas também já a vi num jornal) contra o ponto de exclamação, do qual se diz o que Mafoma não disse do toucinho. Depois do quase total desaparecimento da prosa por assim dizer jornalística (e “jornalística” é o pior que se pode dizer de uma prosa) do ponto e vírgula, das perifrásticas, dos tempos composto e, de um modo geral, de tudo o que vá além do pretérito perfeito e do modo indicativo (sobrevivem ainda, penosamente, uma ou outra incursão no condicional ou no futuro), parece que a “smsização” da língua chegou aos sinais de pontuação, não tarda substituídos todos por animações e emotions.
O que vinga é o modelo “jornalístico” dos períodos (para não dizer igualmente das ideias) telegráficos e facilmente digestíveis, para o que bastam os pontos finais e uma ou outra desamparada vírgula. E temamos também por elas, pelas vírgula, porque, se no caso do pobre ponto de exclamação o motivo é o seu mau uso ou o seu abuso, basta ver os maus tratos que as vírgulas sofrem hoje em jornais e blogues para não lhes augurar luzido futuro.
Crónica do jornalista, poeta e escritor Manuel António Pina (1943 – 2012), publicada originalmente no "Jornal de Notícias" de 3 de agosto de 2006, transcrita do livro do autor Por Outras Palavra & Mais Crónicas de Jornal (Modo de Ler – Editores e Livreiros, Porto, 2010). Escrita segundo a norma ortográfica de 1945