Antologia - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
 
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Textos de autores lusófonos sobre a língua portuguesa, de diferentes épocas.
Poema, inserto na obra do autor, O Lima (Carta IV – a D. João de Castelo Branco), a seguir transcrita da antologia Paladinos da Linguagem, organizada por Agostinho de Campos.

A língua está a pique de perder-se, degenerando em garabulha por arte de franchinotes. Já não é sòmente o vocábulo de boa casta que é renegado pelo barbarismo, é a própria plástica, a mesma sintaxe, de construção robusta, que se vai deformando com o arrocho do justilho, efeminando-se com embelecos e postiços.

Sejam quais forem as reacções necessárias e fatais entre a grandeza de um povo e a difusibilidade da sua língua, o certo é que poucos povos teem tido uma história tão grande como o povo português,  e que também poucas línguas teem hoje uma geografia tão dilatada como a portuguesa língua.

A língua portuguesa, como língua viva, sempre se vai enriquecendo; e já é tão abundante e opulenta, que em todas as matérias tem ricos termos.

Era antigamente a língua portuguesa tão pobre, como foram todas as mais línguas nos seus princípios. Só nas folhas de alguns livros históricos ou predicativos saía singelamente à luz; mas com as obras de muitos autores teve sucessivamente tão preciosos ornatos, que não tem que envejar ás mais elegantes línguas da Europa o seu luzimento…

Um poema retirado de A matéria do Poema, A matéria do Poema, do poeta português Nuno Júdice, num tom informal e leve, sobre a responsabilidade e os complexos de ser poeta de «a maior língua do mundo»,««a língua do Camões, a língua do Pessoa…», a língua de «duzentos milhões».

 

A Língua em que navego, marinheiro,
Na proa das vogais e consoantes,
É a que me chega em indas incessantes
Na praia deste poema aventureiro.

É a Língua Portuguesa — a que primeiro
Transpôs o abismo e as dores velejantes,
No mistério das águas mais distantes,
E que agora me banha por inteiro.

Língua de sol, espuma e maresia,
Que a nau dos sonhadores-navegantes
Atravessa a caminho dos Instantes,
Cruzando o Bojador de cada dia.

Ó Língua-Mar, viajando em todos nós!
No teu sal, singra errante a minha voz.

[...] Mas a poesia é também a língua. A música secreta da língua. Na língua portuguesa essa música é um marulhar contínuo. «Há só mar no meu país» — escreveu o poeta Afonso Duarte. E um poeta angolano falou da língua portuguesa como língua de viagem e mestiçagem. E eu acrescento: rio de muitos rios. E também pátria de várias pátrias. A língua é una. Mas é diversa. Tanto mais ela quanto mais diferente. Tanto mais pura quanto mais impura.


Língua minha, se agora a minha voz levanto
Pedindo à Musa que me inspire e ajude
Somente soe em teu louvor o canto,
Inda que a lira seja fraca e rude:
E tudo quanto sinto na alma, e digo,
Já que na alma não cabe,
Contigo viva e acabe – só contigo.

Língua minha dulcissona e canora,
Em que mel com aroma se mistura,
Agora leda, lastimosa agora,
Mas não isenta nunca de brandura;
Língua do gram Camões, a que ele ensina
A sinfonia rara,
Que em tudo se ...

[…] Recordo, com profundo respeito, a evolução, a ascensão gloriosa desta língua em que palpita e resplandece a própria alma da Latinidade. Com que ternura a vejo surgir da fala galega – primeira fonte, simples veio de água cristalina –, brincar nos versos arcaicos de D. Dinis, tão primitiva como a falariam, se a sua pedra pudesse animar-se, os reis e os apóstolos do pórtico da Glória, de Santiago! Com que desvanecimento a sinto, já corrente murmurante, tomar vulto na prosa inda bárbara de Fe...

            A Aurélio Buarque de Holanda



Fui conhecer Muribeca,
a vila onde não morou,
mas foi termo dos engenhos
e livros que lá datou.
Nada sobra dos engenhos
que teve esse quarto avô
e é até difícil saber,
dos que tinha, ele habitou.
Do Moraes do Dicionário,
da cana que cultivou,
de A...