Antologia - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
 
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Textos de autores lusófonos sobre a língua portuguesa, de diferentes épocas.


Um caminho de areia solta conduzindo a parte
nenhuma. As árvores chamavam-se casuarina,
eucalipto, chanfuta. Plácidos os rios também
tinham nomes por que era costume designá-los.
Tal como as aves que sobrevoavam rente o matagal

e a floresta rumo ao azul ou ao verde mais denso
e misterioso, habitado por deuses e duendes
de uma mitologia que não vem nos tomos e tratados
que a tais coisas é costume consagrar-se. Depois,
com valados, elevações e planuras, e ...

Copacabana, em Rio de Janeiro, Brazil, é um endless week-end. Aí, o sol, o único a trabalhar full-time, se fez o melhor public-relations da cidade, desnudando os habitantes, facilitando o convívio.

Depois do breakfast, as girls, ouvindo um long-playing no pick-up, trocam rapidamente o baby-doll pelo maillot e se mandam para a praia com seus charmosos sun-shades. Vende-se de tudo na praia: ice-creams, coca-cola, geneal, sandwiches, crush, everything. As mais famosas stars, as mais glamur...

Júlio Francisco Adeodato Barreto (1905-1937) nasceu em Margão e fez estudos secundários em parte no antigo Liceu de Margão, e em parte no Liceu de Nova Goa. Aos 18 anos veio para Coimbra, onde se matriculou na Faculdade de Direito, e decorrido um ano, na de Letras.

Mal iniciara seu discurso, o deputado embatucou:

— Senhor Presidente: não sou daqueles que...

O verbo ia para o singular ou para o plural? Tudo indicava o plural.

No entanto, podia perfeitamente ser o singular:

— Não sou daqueles que...

Não sou daqueles que recusam... No plural soava melhor. Mas era preciso precaver-se contra essas armadilhas da linguagem - que recusa ? -, ele facilmente caía nelas, e era logo massacrado com um aparte. Não sou daqueles que ... Resolveu ganhar tempo:

A língua como definidora de identidade portuguesa  neste poema  de Jorge de Sena, transcrito na  antologia Poesia-III, Moraes Editores, Lisboa. 


Estão podres as palavras — de passarem
por sórdidas mentiras de canalhas
que as usam ao revés como o carácter deles.
E podres de sonâmbulos os povos
ante a maldade à solta de que vivem
a paz quotidiana da injustiça.
Usá-las puras — como serão puras,
se caem no silêncio em que os mais puros
não sabem já onde a limpeza acaba
e a corrupção começa? Como serão puras
se logo a infâmia as cobre de seu cuspo?
Estão podres: e com elas apodrece o mundo
e se ...

Vícios da Língua

No Sermões e Lugares Selectos, o Padre António Vieira refere que quando o diabo caiu do céu, coube a Portugal a língua dele que ao menos assim nos entendem as nações estrangeiras, que de mais perto nos tratam. 

A escola de Catete não tinha mestre. A professora, que diziam ser de Lisboa, teria alegadamente fugido para Luanda para não mais voltar à vilinha do interior em que a administração colonial a depusera. Teria ficado, de início, assustada e, depois, farta da vida pelas terras do vasto mato angolano.

Quero começar com uma declaração de amor: escritor brasileiro, adoro a língua portuguesa, esta "última flor do Lácio, inculta e bela", de que falava Bilac, o idioma em que foram escritas tantas e tão grandiosas obras de escritores como Saramago, Cardoso Pires, Lobo Antunes, Lídia Jorge, Pepetela (para não citar os brasileiros). Para celebrar o português, a riqueza do português, a musicalidade do português, nenhum elogio é bastante.

Mas...

1. Claro que o Português é uma língua maravilhosa. A prova é que se um ladrão me roubar eu encontro as palavras necessárias para lhe gritar atrás. Posso é não apanhar o ladrão nem recuperar a mala. Mas mesmo aí, fico com todas as palavras para me queixar, toda a sintaxe para expor, toda a morfologia para descrever a pessoa em causa e o facto ocorrido. E se ninguém me ligar, encontro todas as palavras para me revoltar e para dizer as frases que substituem a batida com a porta. Também para a ir...