Antologia - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
 
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Textos de autores lusófonos sobre a língua portuguesa, de diferentes épocas.

Esta nossa língua portuguesa está a reclamar os seus panegiristas, galhardos paladinos que a defendam e enalteçam, de tal maneira deve andar envergonhada do desprezo com que tantos a maltratam, e bem saudosa do vivo amor que tantos lhe sagraram. O autor da «Côrte na Aldeia» já clamava com mágoa, quando tecia encómios à sua amada língua: «Para que diga tudo, só um mal tem, e é que, pelo pouco que lhe querem seus naturais, a trazem mais remendada que capa de pedintes.» Que faria se ele a...

É impossível fixar a data do aparecimento do idioma de que hoje nos servimos e tem sido instrumento de uma brilhante literatura; tão pouco se pode determinar a época precisa em que os sons do latim popular se transformaram nos portugueses que lhes correspondem; essa transformação não surgiu de repente, mas foi-se operando lentamente. Como qualquer ser vivo que, antes de atingir a forma que o distingue dos outros, passa por fases diversas, que lhe vão alterando as feições, as línguas, antes de...

Este trecho é tirado do "Diálogo em defensão da língua portuguesa", e reproduz uma fala da personagem Petrónio, em resposta a Falêncio, que dizia ser a língua castelhana mais suave e bem-soante que a portuguesa, e tanto, que muitos Portugueses escreviam em castelhano.

A excelência da língua portuguesa é tal, que pode com muita justiça competir com a do seu engenho...

Uma das razões por que é hoje a nossa língua portuguesa estimada por a mais excelente que as outras todas, é porque, sendo só (ela) capaz deste benefício, que não é a mais pequena excelência que nela noto, encorporou em si a graça da pronunciação e dos melhores vocábulos das outras, fazendo-se entre todas um ramalhete composto de diversas flores.

Eu tenho em muito a (língua) portuguesa, cuja gravidade, graça lacónica e autorizada pronunciação nada deve (1) à latina, que vo-la exalça mais que seu império… Por isso eu quero raivar com os seus naturais, que a taxam difamando-a de pobre, e não lhe consentindo alfaiar-se do alheio, como que (2) o principal cabedal das copiosas não seja o mais dele emprestado; e a portuguesa, com o seu, é tão rica, que lhe achareis alfaias ricas, de que as outras carecem...


Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades,
muda-se o ser, muda-se a confiança;
todo o mundo é composto de mudança,
tomando sempre novas qualidades.


Continuamente vemos novidades,
diferentes em tudo da esperança;
do mal ficam as mágoas na lembrança,
e do bem – se algum houve – as saudades.


O tempo cobre o chão de verde manto,
que já coberto foi de neve fria,
e enfim converte em choro o doce canto.


E, afora este mudar-se cada dia,
outra mudança faz de mor espanto:
que não se muda já como soía.

 

Portimão–Outubro–1901

Li com agudíssimo prazer a sua última carta e compadeci a dor das suas melancolias, atenuando-a na experiência do lírico:

—...que não há ninguém,
que possa sofrer um mal,
sem se alembrar de algum bem...

Ainda é do melhor que nos resta essa faculdade de forragear nas próprias mágoas, agora que a nossa mãe espiritual – para mim renegada – a França entendida, vai dançando rondas oficiais em volta da estátua do Paulo ...

Rasgo as árvores até perceber

como foi

antes das vogais

e regresso a casa.


Tenho um rebanho de palavras à minha espera
Conheço-as bem
como o cajado onde me encosto enquanto penso
Cubro os ombros de Sol e
fico-me de longe a olhar o rebanho.
As palavras correm livres pelo pasto
É com as mãos que eu as chamo
e elas vêm submissas
É com as mãos que as afasto
«Vão-se embora palavras»
Magoadas, adormecem depois.

O que é o verso e a rima? É uma nova língua? É uma nova sintaxe?...

Não há duas línguas num povo, nem duas sintaxes numa língua.

O verdadeiro verso rimado é o que respeita profundamente o tesouro público da língua nos seus elementos e combinações estabelecidas ; não vive à custa da ordem, da propriedade e da clareza, devida ao espírito, que está em primeiro lugar; não acrescenta nem tira nada: fala como se costuma falar, diz o que se deve dizer; e, sem a mais pequena diferença da ...

Por Ruy Belo


Conheço as palavras pelo dorso. Outro, no meu lugar, diria que sou um domador de palavras. Mas só eu - eu e os meus irmãos - sei em que medida sou eu que sou domado por elas. A iniciativa pertence-lhes. São elas que conduzem o meu trenó sem chicote, nem rédeas, nem caminho determinado antes da grande aventura.
Sim. Conheço as palavras. Tenho um vocabulário próprio. O que sofri, o que vim a saber com muito esforço fez inchar, rolar umas sobre as outras as palavras. As palavras são seixo...