Antologia - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
 
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Textos de autores lusófonos sobre a língua portuguesa, de diferentes épocas.

Nunca o Silvestre tinha tido uma pega com ninguém. Se às vezes guerreava, com palavras azedas para cá e para lá, era apenas com os fundos da própria consciência. Viúvo, sem filhos, dono de umas leiras herdadas, o que mais parecia inquietá-lo era a maneira de alijar bem depressa o dinheiro das rendas. Semeava tão facilmente as economias, que ninguém via naquilo um sintoma de pena ou de justiça — mesmo da velha —, mas apenas um desejo urgente de comodidade. Dar aliviava. (...)

Língua cuja suave melodia,
Cuja enchente fecunda de expressões,
Clara te faz entre as viventes línguas,
    Mais que tôdas ilustre:

Se aquele que imitando o Cisne Argivo
Tanto as latinas musas ilustrou ,
Que as fez voar eternas pelo mundo,
    Vencidas quási as gregas;

Que as armas e o varão pio cantando,
Que o caro pai, que os caros seus Penates
Salvou por entre as c...
Poema, inserto na obra do autor, O Lima (Carta IV – a D. João de Castelo Branco), a seguir transcrita da antologia Paladinos da Linguagem, organizada por Agostinho de Campos.

A língua portuguesa, como língua viva, sempre se vai enriquecendo; e já é tão abundante e opulenta, que em todas as matérias tem ricos termos.

Era antigamente a língua portuguesa tão pobre, como foram todas as mais línguas nos seus princípios. Só nas folhas de alguns livros históricos ou predicativos saía singelamente à luz; mas com as obras de muitos autores teve sucessivamente tão preciosos ornatos, que não tem que envejar ás mais elegantes línguas da Europa o seu luzimento…

Um poema retirado de A matéria do Poema, A matéria do Poema, do poeta português Nuno Júdice, num tom informal e leve, sobre a responsabilidade e os complexos de ser poeta de «a maior língua do mundo»,««a língua do Camões, a língua do Pessoa…», a língua de «duzentos milhões».

 

[…] Recordo, com profundo respeito, a evolução, a ascensão gloriosa desta língua em que palpita e resplandece a própria alma da Latinidade. Com que ternura a vejo surgir da fala galega – primeira fonte, simples veio de água cristalina –, brincar nos versos arcaicos de D. Dinis, tão primitiva como a falariam, se a sua pedra pudesse animar-se, os reis e os apóstolos do pórtico da Glória, de Santiago! Com que desvanecimento a sinto, já corrente murmurante, tomar vulto na prosa inda bárbara de Fe...

E cá mesmo no extremo Ocidental
Duma Europa em farrapos, eu
Quero ser europeu. Quero ser europeu
Num canto qualquer de Portugal.

Como as ondas do mar sabem ao sal,
A ave amacia o ninho que teceu;
Mas não será do mar, e nem do céu,
Porque me quero assim tão natural.

E se a esperança ainda me consente
No sonho do futuro, ao mal presente
Se digo adeus, — é adeus até um dia…

Um presídio será, mas é meu berço!
Nem noutra língua escreveria um verso
Que me soubesse ao sal desta harmonia.


Teu nome, Andrade1, de qu'é bem qu'esperem
O de que se já sempres espantaram
Quantos te vem, quantos depois vierem:
Teu raro esprito, de que se honraram
As Musas, que de si tanto te deram 2,
E que tarde outro como a ti darão:
Os bons escritos teus, que mereceram
Ou ouro, ou cedro, pois já nessa idade
Nos mostras neles , quanto em ti quiseram
As Musas renovar a antiguidade,
Em teu amor aceso me levaram (...)
Em detrimento do latim

 Extrato do livro O diálogo em louvor da nossa linguagem de João de Barros (2.ª edição, feita em 1785 pelos monges da Cartucha de Évora), no qual , no diálgo entre pai e filho, subjaz a defesa do português como língua materna, e não o até então dominante latim nas elites políticas e religiosas.

Coimbra, 23 de Julho de 1983

Ensinam português em França. E recebi-os e honrei-os como se fossem missionários da pátria a pregar civilizadoramente a um povo civilizado a boa nova de uma língua e de uma cultura que ele desconhece. Língua e cultura que deram a volta ao mundo, e continuam clamorosamente à espera da sua hora europeia.

Coimbra, 9 de Outubro de 1983