DÚVIDAS

Variantes regionais de lagoa e lagar

Se "alagoa" é forma antiga de lagoa, será que "alagares" é forma antiga de lagar?

No contexto da frase não me parece que [o escritor algarvio] José Dias Sancho (1898-1929) se referisse a «fazer um lago de água» ou «inundação».

A seguir segue passo abonatório retirado da obra de José Dias Sancho, Deus Pan e Outros Contos:

«Falava de mundos e fundos, emborcava da rija como um valente e, se adregava fazer negócio cheio, parecia o rei do reino! Era uma perfeição ouvi-lo discorrer sobre os alagares e as vindimas. Sabia do seu ofício, lá isso…» Manuel Tomé, in Deus Pan e Outros Contos, p. 49

Aguardo, sempre ansiosamente, pelos vossos comentários.

Resposta

Alagoa e alagar (no plural, alagares) não são formas antigas de lagoa e lagar, respetivamente. Na verdade, são variantes da linguagem popular.

Alagoa tem registo nos dicionários gerais como o mesmo que lagoa1.  Quanto ao nome alagar, trata-se de um homónimo do verbo alagar (geralmente, com o significado de «inundar, encharcar») e vem a ser o mesmo que lagar, conforme se atesta em estudos sobre falares regionais2.

Trata-se, na verdade, de formas identificáveis no discurso popular, portanto, mais regionalizado, que resulta da adjunção (prótese) da partícula a- a uma palavra, como se observa no Dicionário Houaiss:

«[a ocorre] como morfema protético, em palavras como baixar:abaixar, levantar:alevantar, recuar:arrecuar, ruinar:arruinar, sentar:assentar, ou em palavras que incorporam o artigo a, como amora, abantesma, ambas as ordens, de natureza popular, não raro anteriores ao s. XVI [...].»

Por outras palavras, a partícula a-, que não parece ter significado especial, encontra-se em vocábulos (abaixar, arruinar, assentar, amora) que são correntes e fazem parte da língua padrão quer em formas mais associadas à variação regional e sociolinguística – caso de arrecuar bem como de alagoa e alagar.

 

1 Ver Dicionário Houaiss.

2 Ver alagar, «lagar de azeite»,  em Vítor Fernando Barros e Lourivaldo Martins Guerreiro, Dicionário de Falares do Alentejo, Lisboa, Campo das Letras, 2013.

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