Recomenda-se que a preposição de se conserve antes da conjunção («tratar de alguma coisa»/«tratar de que....»), mas não é erro omitir tal preposição («tratar que...»).
O uso de tratar com orações finitas («tratarei que/de que te deem uma lição») tem certo tom arcaico, o que talvez explique que não esteja esta possibilidade incluída na descrição do verbo nos dicionários de regências consultados*. Contudo, a consulta de conjuntos de textos (ou corpora, como o Corpus do Português) revela que «tratar de» (no sentido de «ocupar-se», «procurar», «fazer com que») há séculos que se emprega quer com preposição quer sem ela antes de oração com o verbo finito:
1. «Conforme-se Vossa Senhoria com o seu original, que é o mesmo Deus, pois sabe que é seu retrato; e trate de que nessa cera vil de suas inclinações terrenas faça aquele selo eterno do amor de Deus uma impressão divina» (António das Chagas, Cartas Espirituais, 1665, in Corpus do Português).
2. «Para evitar de algum modo este descrédito, tratei que os dois primeiros tomos se recolhessem [...]» (Padre António Vieira, Cartas, in Corpus do Português).
Acrescente-se que a consulta do Corpus do Português indica que se tem usado mais «tratar que», sem preposição, do que «tratar de que», mesmo entre escritores cujas obras são tradicionalmente consideradas modelares para a norma-padrão, como é o caso de António Vieira, autor da frase em 2. O verbo tratar junta-se portanto a vários outros que são compatíveis com a omissão da preposição de antes da conjunção que.
Em suma, «tratar de que...» é uma construção correta, mas «tratar que...» também o é.
* Consultaram-se o Dicionário Gramatical de Verbos Portugueses (dir. João Malaca Casteleiro, Lisboa, Texto Editora, 2007) e Dicionário Sintático de Verbos (coord. Winfried Busse, Coimbra, Coimbra Editora, 1995).