As opções didáticas a seguir na gestão do ensino dos conteúdos gramaticais podem envolver complexidade. A questão que coloca prende-se com o facto de, de acordo com os documentos programáticos, os alunos não estudarem a subclasse dos adjetivos relacionais. Esta opção curricular implica que os alunos não estarão em posse de conhecimentos que lhes permitam classificar adjetivos relacionais como maternal, nacional, fluvial, entre outros.
Em termos gerais, sou inclinada a afirmar que integrar uma palavra numa classe distinta daquela a que pertence não será muito estruturante para os alunos, que, mais à frente no seu percurso, se confrontarão com a necessidade de reestruturarem o seu saber. Por esta razão, considero preferível simplesmente não trazer para os exercícios de sala de aula adjetivos que integrem estas classes, promovendo, antes, atividades que envolvam adjetivos qualificativos ou numerais.
Não obstante, é também importante que se diga que, em alguns casos, os adjetivos relacionais podem transcategorizar, passando a integrar a classe dos adjetivos qualificativos. Veloso e Raposo apresentam um exemplo deste processo com o adjetivo teatral, a partir dos seguintes exemplos:
(1) «arte teatral»
(2) «um indivíduo teatral»
Com explicam os autores, em (1)
«o adjetivo teatral tem a sua leitura primitiva, de adjetivo relacional: o adjetivo atribui à entidade designada pelo nome arte o conjunto complexo de propriedades que caracterizam a entidade ‘teatro’; tal como a maioria dos adjetivos relacionais, o adjetivo tem aqui uma função classificadora, criando um subtipo “natural” de arte, no contexto da nossa cultural; trata-se da arte que tem que ver com o teatro, não com o cinema, com a pintura, com a arquitetura, etc.
Em contrapartida, em [(2)], o mesmo adjetivo não liga o nome indivíduo ao teatro em geral, nem cria um subtipo natural – as pessoas, diferentemente da arte, não se classificam como “teatrais”, por oposição a “cinematográficas”, “arquiteturais” ou “pictóricas”. Neste caso, o adjetivo teatral introduz no sentido do nome modificado uma propriedade selecionada de entre as várias que caracterizam o teatro – em particular, uma propriedade que se associa à representação por atores ao vivo -, reinterpretando-a metaforicamente como uma propriedade comportamental significando ‘exibicionismo’, ‘afetação’ ou ‘exagero’. Em síntese, o adjetivo é aqui recategorizado em qualificativo, a partir da sua classe primitiva relacional.»1
Não obstante o que ficou dito, acrescente-se que esta é uma abordagem que deve ser desenvolvida em contextos de ensino superior, pois envolve a mobilização de conhecimentos gramaticais de que os alunos não são detentores. Refira-se também que, no caso apresentado pela consulente, o adjetivo real integra a classe dos adjetivos relacionais, não tendo sofrido qualquer processo de transcategorização.
Disponha sempre!
1. Raposo et al., Gramática do Português. Fundação Calouste Gulbenkian, p. 1370.