O verbo sobrevoar pode ser usado em construções passivas. No entanto, a frase apresentada terá um uso duvidoso no quotidiano.
De uma forma geral, os verbos transitivos admitem forma passiva. Estes caracterizam-se por selecionar um argumento interno com o papel temático de paciente, que desempenha a função sintática de complemento direto, e um argumento externo, que tem o papel temático de agente e que desempenha a função sintática de sujeito. Na forma passiva, as frases com estes verbos descrevem tipicamente situações em que uma das entidades envolvidas sofreu algum tipo de mudança.
Ora, o verbo sobrevoar é transitivo direto, pelo que admite ser usado na passiva, o que aliás se pode comprovar por usos identificados no Corpus do Português, de Mark Davies, similares ao que aqui se apresenta:
(1) «Ao princípio de o dia, aviões da Nato tinham sobrevoado a capital bósnia, depois de uma coluna de camiões governamentais ter sido atacada por forças sérvias bósnias em a região ocidental de Sarajevo.» (Público, 1995)
O verbo sobrevoar constrói-se normalmente com um argumento interno com a função de complemento direto que tenha um valor locativo, ou seja, «sobrevoar algum local». É mais rara a construção «sobrevoar alguém»:
(2) «O avião sobrevoou os jovens.»
Neste caso, «os jovens» será entendido como o local onde os jovens se encontram. Esta construção com complementos de natureza humana pode também ser usada num sentido metafórico, que explora a literariedade da estrutura.
No caso da frase apresentada pela consulente, a sua forma ativa seria a seguinte:
(3) «Um avião sobrevoou-me.»
Esta frase, que não será muito comum nos usos quotidianos, terá uma interpretação similar à que se propôs para (2), ou seja, «me» é entendido como o local onde se encontra o “eu”.
Nesta perspetiva e em teoria, será possível a construção apresentada em (4), mas estamos em crer que o seu uso se restringirá a um contexto literário, podendo mesmo constituir uma construção duvidosa para alguns falantes:
(4) «?Eu fui sobrevoado por um avião.»
Serão estas as razões que justificam a estranheza provocada pela frase.
Disponha sempre!
?assinala o facto de se tratar de uma construção que poderá não ser aceitável para alguns falantes.