A resposta que se segue não é talvez tão direta como se poderia desejar.
É correta a substantivação (conversão de verbo em nome1) do verbo sentir, com o significado de «maneira de sentir»:
(1) «Esta política contraria o sentir da população.»
Ou, por exemplo, em Eça de Queirós:
(2) «O meu distraído e pálido Metafísico afirma, encolhendo os ombros, que Padre Salgueiro não se destaca por nenhuma saliência de Corpo ou Alma entre os vagos padres da sua Diocese; e que resume mesmo, com uma fidelidade de índice, o pensar, e o sentir, e o viver, e o parecer da classe eclesiástica em Portugal» (Correspondência de Fradique Mendes, in Corpus do Português).
A substantivação em (1) e (2) é legítima e tem registo dicionarístico, por exemplo, no Dicionário Houaiss:
«[sentir] substantivo masculino – modo de perceber, de apreciar as coisas; opinião, parecer»
Contudo, era inusitado – pelo menos, até ao momento em que se escreve esta resposta – que a substantivação de sentir tivesse por complemento uma expressão especificadora do que é sentido. Ou seja, sentir, como substantivo, é seguido de um complemento que marca o sujeito que sente, mas não o tipo de sentimento.
Sendo assim, as expressões «um forte sentir [p. ex. de revolta, de alegria]» e «um sentir de felicidade» podem encontrar reservas quanto à sua aceitabilidade, tendo em conta usos mais consolidados, como os exemplificados em (1) e (2). Em tais casos, menos correntes, parece preferível o emprego de sentimento: «um forte sentimento» e «um sentimento de felicidade».
A verdade é que não parece haver doutrina clara sobre esta possibilidade de sentir, que aparentemente constitui uma novidade não completamente fora das virtualidades de uma substantivação como esta. Trata-se, portanto, de um uso possível, mas algo discutível, por enquanto.
1 N. E. (24/05/2023) – À mudança de categoria gramatical operada no uso de uma palavra, também se aplica o termo tradicional de «derivação imprópria» (cf. Nomenclatura Gramatical Portuguesa de 1967).