Habitualmente, o uso do determinante artigo indefinido contribui para a apresentação de um sintagma nominal indefinido, como se observa pelo contraste entre a frase (1), com um sintagma definido, e a frase (2), com um sintagma indefinido:
(1) «A rapariga chegou.»
(2) «Uma rapariga chegou.»
O determinante algum é também associado à expressão de um valor indefinido:
(3) «Alguma coisa deve ter acontecido.»
No entanto, pode também expressar uma quantificação vaga1:
(4) «Ele não teve muita paciência, teve alguma paciência.»
Ora, o determinante indefinido um não tem capacidade de expressar este valor de quantificação, pelo que não pode ser utilizado com esta intenção. Parece ser este o caso presente na frase apresentada pelo consulente. Sem outro contexto, a frase (5) parece apontar para um valor de quantificação vaga, pois o determinante algum, ao incidir sobre o nome, exprime uma quantidade imprecisa de pessoas:
(5) «Algumas pessoas não comem gatos.»
Este valor de quantificação pode também estar associado ao plural, pois a frase (6) é aceitável no singular, mas não no plural, que parece barrar a leitura de sintagma indefinido:
(6) «Uma pessoa não come gatos.»
(6a) «*Umas pessoas não comem gatos.»
Não obstante, é possível criar contexto de uso em que a intenção incida sobre o valor de indefinição, que permitirá alternar entre o determinante um e o determinante algum:
(6) «Já todos sabem. A notícia divulgou que umas pessoas comeram gatos.»
(7) «Já todos sabem. A notícia divulgou que algumas pessoas comeram gatos.»
Disponha sempre!
* assinala a inaceitabilidade da frase.
1. Cf. Raposo et al., Gramática do Português. Fundação Calouste Gulbenkian, pp. 778-779