De acordo com Celso Luft, o verbo pesar com o sentido de «causar mágoa ou pesar» é transitivo indireto:1
(1) «Pesam-me os dissabores que lhe causei.»
Nesta frase, a oração completiva «os dissabores que lhe causei» desempenha, em qualquer dos casos, a função de sujeito, o que justifica a concordância do verbo no plural2. O pronome me desempenha a função de complemento indireto.
No interior da oração subordinada relativa («que lhe causei»), identificamos as seguintes funções sintáticas:
– que: complemento direto
– lhe: complemento indireto
Contudo, relativamente ao verbo pesar, Luft acrescenta que «é usual anteceder essa oração [completiva] da prep. de, indicativa de ‘causa’» (Idem):
(2) Pesa-me, Senhor, de vos ter ofendido.
O autor em referência não o menciona claramente, mas este complemento preposicionado pode também integrar um grupo nominal, como regista o gramático Francisco Fernandes2:
(3) «Pesou-me muito de minha cega confiança.»
É, portanto, gramatical a frase que inicia a pergunta:
(4) «Pesa-me dos dissabores que lhe causei.»
A análise sintática de (4) pode revelar-se mais complexa do que a de (1) e, portanto, pouco consensual. Com efeito, dir-se-ia que a descrição e classificação propostas por Luft não exclui a possibilidade de o complemento preposicionado, contenha ele uma oração ou um nome, ter a função de sujeito. Por outro lado, em usos como os ilustrados em (2), (3) e (4), Fernandes aceita que pesar seja um verbo impessoal, o que acarreta considerar que, em (4), a expressão «dos dissabores que lhe causei» constitua não o sujeito, mas um complemento preposicionado (em Portugal, um complemento oblíquo). É esta, afinal, a perspetiva de Evanildo Bechara, quando comenta as frases aqui em questão.3
Disponha sempre!
1. Celso Luft, Dicionário prático de regência verbal. Ática, p. 403.
2. Francisco Fernandes, Dicionário de Verbos e Regimes, Globo, 1989, p. 461.
3. Evanildo Bechara, Moderna Gramática Portuguesa, Editora Lucerna, p. 484.