Não tenho conhecimento de as palavras em causa terem chegado a ser adaptadas à fonética, à morfologia e à ortografia do português. Como se trata de palavras de uso raro, podemos sempre manter os termos usados internacionalmente, desde que os assinalemos em itálico ou entre aspas: shantranj e chantrang. No entanto, arrisco-me a propor que a forma árabe corresponda a xatranje, e a persa, a chatrangue, considerando os seguintes critérios:
– Em relação a xatranje – shantranj na transliteração para inglês, que se tornou também a forma internacional em alfabeto latino, e, em árabe شطرنج –, começa esta palavra por uma consoante fricativa pré-palatal surda, segmento que o árabe representa pela letra ش (shim ou xime). Geralmente, nos arabismos do português, tal letra corresponde a x1, e não a ch, já desde a Idade Média. É, portanto, mais coerente com a tradição portuguesa escrever xatranje, com x, do que adotar uma forma com ch, ou seja, "chatranj". Na restante sequência de letras em português, é ainda de assinalar o uso de j, e não de g, antes de e: apesar de, em muitos arabismos, a consoante fricativa pré-palatal sonora que se representa pela letra árabe ج (jime) aparecer depois grafada com g antes de e ou i (algeroz, algibeira), não se afigura ilegítima a transliteração portuguesa com j, de modo a assinalar que tal segmento não tem relação com a pré-palatal que evoluiu do G latino (por exemplo, gente ou agir).
– Quanto a chatrangue, a palavra persa apresenta a letra ﭺ, que é própria da adaptação da escrita árabe à pronúncia do persa. Esta letra soa como "tch", uma consoante africada palatal surda. A transliteração em inglês é fiel a essa pronúncia ao escrever chatrang com ch, geralmente o grafema que marca este tipo de segmento (cf. chair, «cadeira», e teach, «ensinar»). No português, o grafema tradicionalmente associado a esse segmento é o dígrafo ch (sobre a história de ch, ver esta resposta), e, portanto, chatrangue, com ch, afigura-se como forma mais adequada do que um eventual "xatrangue".
1 Há exceções: chafariz é uma delas, mas não é de excluir que esta palavra tenha chegado ao português por via do castelhano, que tem vários arabismos grafados com ch. Este grafema marca sempre uma consoante africada, dado que, ao contrário do português e do galego, o espanhol não tem a fricativa que ocorre, por exemplo, em baixo (cf. Federico Corriente, Diccionario de Arabismos y Voces Afines en Iberromance, Madrid, Editorial Gredos, 2003).