Os dados apresentados sobre o inglês e o espanhol estão longe de constituírem uma regra das línguas vizinhas. Os idiomas são também produtos histórico-sociais, e, portanto, raramente é útil avaliar a capacidade expressiva de um a partir dos outros sem ter em conta um mínimo de contextualização cultural. Por outro lado, é preciso considerar que as línguas também refletem muito o que são necessidades de expressão coletivas.
O português poderia ter "armadilheiro", que potencialmente existe, mas não se usa. Em seu lugar tem trapaceiro, de trapaça, «armadilha moral, desonestidade», e, para quem faz armadilhas para caçar animais, armador (cf. Dicionário Houaiss1). Por outras palavras, em português, o termo que geralmente denota a pessoa que cria armadilhas psicológicas morais não deriva do nome armadilha, mas, sim, de outras, como trapaça.
A distribuição desta área de significação por unidades lexicais com diferente etimologia e derivação não constitui uma anomalia. Para mais, verifica-se que, mesmo em espanhol, a noção de «aquele faz armadilhas (físicas ou morais)» também se encontra marcada separadamente, pelo menos, por duas palavras que têm a mesma base de derivação mas são diferentemente sufixadas: por um lado, regista-se trampero («o que faz armadilhas») e, por outro, como adjetivo, tramposo («embusteiro, aldrabão, batoteiro») – cf. dicionário da Real Academia Espanhola.
Assinale-se, em todo o caso, que o inglês trapper não é o mesmo que tramposo, cujo significado anda próximo de trapaceiro, batoteiro ou aldrabão. Mais perto do sentido do termo inglês, tem o espanhol o vocábulo trampero, já mencionado (cf. Lexico.com).
1 Esta fonte também regista armador numa aceção de caráter moral: «aquele que prepara armadilhas ou arquiteta situações para levar alguma vantagem sobre os outros». Não parece, no entanto, que se trate de um uso corrente.