O pronome relativo que desempenha a função sintática de sujeito.
O verso em questão integra um poema de Fernando Pessoa, cuja primeira estrofe corresponde a uma frase:
«Gato que brincas na rua
Como se fosse na cama,
Invejo a sorte que é tua
Porque nem sorte se chama.»
Analisando a frase, percebemos que os versos «Gato que brincas na rua / Como se fosse na cama» desempenham a função sintática de vocativo. Trata-se de um vocativo mais complexo do que é habitual. Para compreendermos o seu funcionamento, é importante recordar que
(i) o vocativo se relaciona com a segunda pessoa, pois cumpre uma função apelativa que visa chamar alguém ou colocá-lo em evidência:
(1) «Manuel, (tu) vens comigo?»
(ii) o vocativo pode admitir expansões que podem corresponder a orações relativas. Bechara apresenta como exemplo desta possibilidade a frase:
(2) «Desce do espaço imenso, ó águia do oceano!
“Senhor Deus, que após a noite
Mandas a luz do arrebol,
Que vestes a esfarrapada
Com o manto rico do sol”. [CAv.1, 88]» (Moderna gramática portuguesa. Nova Fronteira, p. 380).
Nesta frase, identificamos o vocativo, «Senhor Deus», e a presença da flexão de segunda pessoa (tu) na forma «mandas».
No vocativo do poema de Fernando Pessoa, verificamos igualmente a presença do nome «gato» que é objeto de expansão por meio da oração subordinada adjetiva relativa «que brincas na rua (como se fosse na cama)», no interior da qual o pronome relativo que retoma a segunda pessoa com que se relaciona o vocativo. Assim, no interior da sua oração, o pronome relativo que desempenha a função sintática de sujeito do verbo brincar.
Disponha sempre!